O Coritiba chegou a acordo com a Treecorp, gestora de investimentos em empresas, e está próximo de anunciar a sua Sociedade Anônima do Futebol (SAF). A partir do momento em que for assinada a oferta vinculante, faltará a aprovação de conselheiros e sócios do clube.

O negócio envolve a cessão de 90% sobre o capital do clube-empresa e o investimento de até R$ 1,1 bilhão em um período de dez anos, valor que inclui a reconstrução do estádio Couto Pereira.

O ge teve acesso a detalhes da operação, como o detalhamento da proposta financeira, a composição da governança e as regras que a associação impôs para ter um futebol competitivo neste novo cenário, em que as decisões passariam a ser tomadas pelos investidores.

Coritiba encaminha venda da SAF; oferta inclui reforma do estádio e R$ 550 milhões para futebol e CT

Investimentos

Para se tornar acionista majoritária da SAF do Coritiba, a Treecorp se compromete a investir até R$ 1,1 bilhão nos próximos dez anos. O dinheiro se divide da seguinte maneira entre as finalidades: R$ 450 milhões para reforços e capital de giro; R$ 100 milhões para o centro de treinamento; R$ 500 milhões para a reforma do estádio.

Investimentos em contratações e no centro de treinamento são obrigatórios por contrato. A companhia terá dez anos para aplicar a quantia carimbada para atletas. No caso do CT, cuja propriedade será transferida para a SAF, o aporte deverá ser feito imediatamente.

O estádio continuará a ser posse da associação civil do Coritiba, que por sua vez assinará um contrato de cessão por 50 anos, renováveis por mais 50, para a SAF. O montante reservado para sua reforma representa compromisso formal da Treecorp, condicionado a determinados fatores.

A investidora terá sete anos para começar as obras e no máximo dez para encerrá-las. Caso o projeto não seja viabilizado, existem punições contratuais, como o impedimento de retirar dividendos (participação sobre os lucros da empresa) por parte dos investidores.

Endividamento

Diferente de outros clubes que passaram por vendas, o Coritiba tratou a dívida da associação civil antes de negociar a entrada de um investidor. O clube já concluiu sua recuperação judicial, na qual obteve descontos de credores e alongou o pagamento da dívida em 12 anos.

Ao constituir uma SAF e transferir para ela vários de seus ativos – contratos de jogadores, patrocínios e direitos de transmissão, por exemplo –, o Coritiba perderá a maior parte de suas receitas.

Em compensação, a associação civil receberá da empresa repasses financeiros. Esses valores variam a cada ano e têm como finalidade o cumprimento do acordo feito na recuperação judicial. Portanto, a SAF não receberá as dívidas, porém terá obrigação de efetuar esses pagamentos.

Governança

Para viabilizar a compra do futebol alviverde, a Treecorp abrirá uma empresa chamada Coxa S/A. Esta, por sua vez, vai adquirir 90% do Coritiba SAF, enquanto os 10% restantes pertencerão à associação civil.

Essa estrutura dará aos investidores o controle sobre o futebol. Caberão a eles todas as decisões na condução do clube-empresa, desde a contratação de profissionais e a montagem do planejamento estratégico, até questões do cotidiano, como contratações de técnicos e atletas.

Como acionista minoritária, a associação manterá a responsabilidade de fiscalizar a administração dos novos proprietários, por meio da governança, além de ter poder de veto sobre questões de tradição.

Haverá um Conselho de Administração, com até dez integrantes, dos quais a associação poderá indicar um nome. O Conselho Fiscal terá cinco membros, sendo um deles nomeado pela associação. Essas são as pessoas que ficarão incumbidas de participar da administração.

Incentivos à competitividade

O Coritiba colocou em contrato mínimos garantidos a serem cumpridos pela Treecorp, a partir do momento em que a SAF for constituída.

A empresa deverá gastar por ano um mínimo de R$ 120 milhões ou 50% da receita, o que for maior, no item que chamou de “investimento em futebol”. Ele é composto pela folha salarial e por contratações.

Hipoteticamente, significa que, se a soma de salários e direitos de imagem for de R$ 80 milhões no ano, pelo menos R$ 40 milhões deverão ser usados para comprar direitos federativos e econômicos de atletas.

Embora a pretensão seja a estabilidade no Campeonato Brasileiro e a conquista de títulos, não existe punição contratual para o não cumprimento de metas esportivas. O mecanismo é financeiro.

Além disso, o orçamento mínimo poderá ser reduzido em caso de rebaixamento para divisões nacionais inferiores, pois os R$ 120 milhões seriam desproporcionais às necessidades da Série B.

O que é Treecorp

Treecorp é uma gestora de investimentos sediada em São Paulo, na Avenida Faria Lima, famosa por concentrar sedes de bancos e instituições financeiras. Esta é a primeira vez que uma companhia dessa natureza se envolve com a compra de um clube de futebol no Brasil.

A empresa é comandada por três sócios-diretores: Filipe Lomonaco, Bruno D’Ancona e Danilo Soares. Participa de seu conselho consultivo, também como sócio minoritário, o empresário Roberto Justus.

A Treecorp atua com o que o mercado financeiro chama de private equity, ou seja, investimentos em empresas já consolidadas. Neste caso, o foco costuma estar em negócios que ainda possuem grande potencial para crescimento. Estão no portfólio dela as empresas dos ramos de varejo, saúde, tecnologia e serviços financeiros.

A negociação com a associação civil do Coritiba, representada por seu presidente, Glenn Stenger e Silva, durou cerca de oito meses. Se considerado todo o período em que a gestora estudou o futebol, para mapear oportunidades de investimento, chega-se a cerca de um ano.

A escolha pelo clube paranaense levou em conta uma série de fatores, como o tamanho da torcida, o potencial de expansão do negócio, com a consolidação na primeira divisão e a fundação da liga de clubes, e o estado atual do Coritiba. Embora tivesse problemas financeiros, a associação os equacionou com a recuperação judicial e tem bens desembaraçados.

A reestruturação do clube foi feita com consultoria da Alvarez & Marsal. Já na fase da negociação, a XP Investimentos assessorou a associação na busca por investidores, com apoio jurídico do escritório BMA, enquanto a Treecorp teve respaldo das consultorias KPMG e Engage Sports Ventures, e dos escritórios de advocacia Machado Meyer e Bichara & Motta.

Um fator relevante na opção da Treecorp por investir no futebol brasileiro foi a chegada de investidores estrangeiros. Assim que Botafogo e Vasco anunciaram os acordos com John Textor e 777 Partners, respectivamente, profissionais da gestora notaram que o mercado passaria por transformação e passaria a ter liquidez – ou seja, investidores interessados em comprar e vender clubes… leia mais em GE 08/05/2023