Em carta assinada por Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central, a autoridade monetária explicou ao Ministério da Economia os motivos pelo qual a inflação ficou acima do teto da meta em 2021 e sinalizou com a continuidade do ciclo de aperto monetário em 2022.

“O Copom [Comitê de Política Monetária] considera que, diante do aumento de suas projeções e do risco de desancoragem das expectativas para prazos mais longos, é apropriado que o ciclo de aperto monetário avance significativamente em território contracionista”, diz o texto da carta, endereçada ao ministro Paulo Guedes.

Em 2021, a inflação medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) alcançou 10,06%. Isso significa que a taxa não só ficou acima da meta do Conselho Monetário Nacional (CMN) para o ano (de 3,75%) como extrapolou o limite de tolerância – o teto da meta, que seria de 5,25%.

Quando isso acontece, o presidente do Banco Central do Brasil precisa divulgar publicamente as razões do descumprimento das metas, por meio de carta aberta ao ministro da Economia.

Dentre os fatores que fizeram a inflação estourar o teto da meta, o Banco Central cita pelo menos três motivos: a elevação de preços de bens em moeda local, com destaque para commodities; a bandeira de energia elétrica de escassez hídrica, que entrou em vigor no ano passado em um período de poucas chuvas; e o desequilíbrio de oferta e demanda de insumos, com gargalos nas cadeias produtivas globais.

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Em carta ao Ministério da Economia BC aponta para continuidade de alta de juros

“As pressões sobre os preços de commodities e nas cadeias produtivas globais refletem as mudanças no padrão de consumo causadas pela pandemia, com parcela proporcionalmente maior da demanda direcionada para bens e impulsionada por políticas expansionistas”, diz o texto da carta, se referindo a medidas de estímulo adotadas por diferentes países.

Na visão do BC, o excesso de demanda em relação à oferta de curto prazo de diversos bens foi “exacerbado por falta de mão de obra, problemas logísticos e gargalos de produção”.

A autoridade monetária disse ainda que a aceleração significativa da inflação em 2021 para níveis superiores às metas foi um fenômeno global, atingindo a maioria dos países avançados e emergentes.

O BC também destacou o impacto da inflação importada no estouro do teto da meta de preços, com forte participação da escalado do petróleo, commodities em geral e da taxa de câmbio.

“Embora a contribuição da taxa de câmbio para a inflação tenha sido menor que em 2020, cabe destacar a quebra no padrão histórico de apreciação da moeda nacional durante ciclos de elevação nos preços das commodities, como o ocorrido nos
últimos dezoito meses”, diz a carta.

Do ponto de vista setorial, houve uma forte contribuição dos choques sobre preços industriais, refletindo problemas logísticos e desequilíbrios entre oferta e demanda globais.

“Apontar a inflação importada como um dos principais vilões é preocupante para 2022. Isso foge do trabalho do Banco Central do Brasil – como eles podem resolver essa inflação que vem de fora?”, indaga Gustavo Cruz, economista e estrategista da RB Investimentos. Ele acredita que, por conta disso, a inflação deve ficar acima do teto da meta também este ano.

Inflação acima da meta também em 2022

Em relação às providências para assegurar o retorno da inflação aos limites estabelecidos, o BC afirmou que “tem calibrado a taxa básica de juros, e continuará a fazê-lo, com vistas ao cumprimento das metas para a inflação estabelecidas pelo CMN [Conselho Monetário Nacional]”.

A autoridade monetária admitiu que o crescimento da trajetória da Selic nominal foi mais acentuado do que o aumento das expectativas de inflação. “Esse movimento significou a passagem da política monetária do campo expansionista para o território contracionista (supondo uma taxa de juros real neutra de 3,5% a.a.)”, diz o texto.

A carta também fala sobre o risco de desancoragem das expectativas de inflação, com questionamentos sobre o futuro do arcabouço fiscal do país, o que resulta em aumento dos prêmios de risco.

“O Copom reitera que o processo de reformas e ajustes necessários na economia brasileira segue sendo essencial para o crescimento sustentável da economia. Eventual esmorecimento no esforço de reformas estruturais e alterações de caráter permanente no processo de ajuste das contas públicas podem elevar a taxa de juros estrutural da economia”, complementa o texto.

O BC acredita que a inflação entre em trajetória de queda já no início de 2022, terminando o ano em patamar significativamente inferior ao de 2021. Porém, explica que as projeções ainda apontam para inflação acima da meta este ano, em 4,7%. A autoridade monetária trabalha com expectativa de inflação em 3,2% para 2023 e 2,6% em 2024.

“Portanto, o cenário é de convergência da inflação para as metas ao longo do horizonte relevante. Nesse cenário, em 2022, a inflação ainda se mantêm superior à meta, embora dentro do intervalo de tolerância, em virtude dos efeitos inerciais da inflação de 2021”, explica a carta… Leia mais em InfoMoney 12/01/2022