Ernesto Leme, da Claritas: “Não tem estrutura de banco, não tem reciprocidade, empréstimo etc, mas compensa”

Com estruturas menores e mais enxutas, os gestores de recursos vão ganhando adeptos na medida em que o mercado se sofistica. O grande atrativo das gestoras, também conhecidas como family offices, é justamente não ter um banco por trás, que carrega sempre o compromisso com produtos de sua prateleira – ainda que trabalhem com a chamada arquitetura aberta, ou seja, ofereçam também aos seus clientes produtos de outras instituições.

É um mercado que cresce ano após ano e que tende a crescer mais em momentos de turbulência dos mercados, como o atual, com a volta da crise financeira na Europa. Funciona mais ou menos como na medicina, diz George Wachsmann, sócio-fundador do family office Bawn Investments.
Uma parcela dos investidores, assim como os pacientes, costuma automedicar-se. Só recorre ao especialista quando a dor é mais intensa e preocupante. Quando o mercado está nervoso, cresce a procura por consultoria especializada. Com 22 profissionais na equipe, a Bawn atende entre 60 e 80 famílias “com um patrimônio interessante”, diz Wachsmann.

“O cliente só procura um gestor quando está mal atendido ou quando quer um retorno melhor”, comenta Rogério Bastos, presidente da Finplan. “Com a crise, muita gente quer esse retorno melhor.”

Bastos também revela que lançou em maio, quando já estava clara a recidiva da crise, um fundo de renda fixa para atender os clientes desconfortáveis com o aumento do risco na bolsa. Eis uma das diferenças que os gestores independentes gostam de mencionar em relação aos bancos: agilidade. Com um número menor de investidores para assistir, fica mais fácil criar soluções individuais em intervalos relativamente curtos.

O crescimento das gestoras independentes é parte do processo mundial de consolidação bancária, defende o sócio da Bawn. Os bancos, com estruturas cada vez maiores e complexas, não conseguem, segundo ele, dar o tratamento individualizado que o cliente abastado requer. Contudo, as gestoras acabam trabalhando em parceria com os bancos, já que elas próprias não têm produtos a oferecer. Em compensação, podem oferecer mais diversificação e ousadia. Ou então mais prudência, quando o caso exige.

O cliente pequeno normalmente está mais disposto a correr riscos a fim de se tornar uma pessoa cujos rendimentos lhe permitam viver com certa tranquilidade, na visão de Wachsmann. Às vezes é preciso até “segurá-lo”, para que não se exponha a riscos excessivos, principalmente se ele não puder dispor do dinheiro por períodos mais longos. Já o aplicador de maior porte, cujo dinheiro rende muito mesmo quando está mal investido, precisa ser instado a ser mais arrojado quando quer ampliar o patrimônio e deixar um legado mais seguro aos herdeiros. Para o sócio da Bawn, este é um trabalho que a gestora independente tem condição de fazer. O contato mais estreito cria uma relação de confiança que permite entender profundamente a necessidade do cliente, diz.

“O profissional do banco trabalha para o banco”, diz Bastos. As gestoras independentes empenham-se na busca por transparência, controle de conteúdo e têm a vantagem de gozar da ausência de conflito, ou seja, não ter de recomendar os próprios produtos -, afirma Ernesto Leme, sócio da Claritas e responsável pelo wealth management da gestora. A Claritas tem apenas cinco profissionais de atendimento para gerir os recursos de 34 famílias.

“Não tem estrutura de banco, não tem reciprocidade, empréstimo, cartão etc., mas a conta compensa”, afirma Leme. “Ninguém aqui tem de bater meta de venda de produto.” A Claritas, como a maior parte das gestoras, trabalha com uma taxa de administração que oscila entre 0,5% e 1% (algumas gestoras têm um piso menor, de 0,3%) e uma taxa de sucesso – ou de performance -, que no caso da Claritas é de 10% do que superar o benchmark do mercado. O custo total é de aproximadamente 1% do patrimônio sob gestão. Com R$ 3 bilhões sob sua responsabilidade, a empresa oferece consultorias de sucessão familiar, empresarial, imobiliária e financeira. Para tanto, mantém parcerias com grandes escritórios de advocacia e de contabilidade, que entram no circuito quando necessário.

Outra vantagem apontada pelas gestoras é a discrição. As equipes são menores que as dos bancos e a rotatividade, mínima. As informações sobre os clientes transitam entre menos gente e, portanto, ficam mais protegidas. Como o pessoal de atendimento normalmente são os sócios da gestora, é difícil estar um dia em uma empresa e na semana seguinte na concorrência, pondera o sócio da Bawn.

Ter uma grade ampla de investimentos, que atende a diferentes características, é o trunfo da BNY Mellon ARX Investimentos, diz seu diretor, José Tovar. Butique de investimentos com mais de dez anos de experiência no país e lastro internacional, a BNY Mellon ARX atende a uma base diversificada de clientes, dos quais 10% são pessoas físicas.

Tovar destaca a importância dos serviços oferecidos pelo wealth management em um país como o Brasil, que está migrando gradualmente da renda fixa para a variável, na medida em que os juros reais – ainda elevados e os mais altos do mundo – vão se acomodando lentamente para níveis mais próximos dos praticados nos países desenvolvidos. Enquanto no Brasil 10% dos recursos estão na renda variável, nos países mais ricos ou com mercado de capitais mais maduro a proporção é de 40% a 50%.
O que faz mesmo a diferença é o atendimento. “A gente tem acesso aos mesmos produtos que outras gestoras”, comenta Wachsmann. Então, o que conta é a máxima personalização do serviço – coisa que os bancos do varejo também vendem em seu serviço private, mas nunca entregam, segundo as gestoras. “Trabalho como um restaurante”, diz o sócio da Bawn. “Não pela qualidade dos ingredientes, que os demais têm igual. É pela combinação exata desses ingredientes e o tamanho da porção adequada para aquele cliente.”

Segundo ele, o cliente testa o prato customizado e comenta. São feitos ajustes até que se chegue ao melhor prato possível para o paladar daquele cliente.

A expectativa do mercado é que o setor terá muito o que cozinhar nos próximos anos. Para além do mercado mundial, o Brasil vive um ciclo de investimentos externos apressados, em que as novas empresas que aqui chegam, para aproveitar o momento, preferem comprar ativos a começar do zero. Por conseguinte, está cada dia maior o contingente de clientes potenciais das gestoras formado por empresários que venderam seus negócios e se tornaram investidores.

Além disso, o país está repleto dos chamados “eventos de liquidez”: processos de fusão e aquisição e aberturas de capital das empresas. Junto com o crescimento do PIB, dizem os gestores, está dado o fermento para o setor crescer e aumentar o número de empreendedores milionários ou famílias milionárias.

Espaço para crescer não falta. Segundo Bastos, a gestão de fortunas no exterior está nas mãos de gestores independentes em mais de 60% dos casos. No Brasil não chega a 20%. O mercado cresce em função do ciclo que está vivendo o país, afirma José Monforte, sócio da Pragma, family office com 12 grupos de investidores e 35 profissionais. “As grandes corporações surgidas a partir da década de 1960 estão agora na transição da primeira para a segunda geração”. Segundo ele, 70% dos IPOs dos últimos cinco anos foram de empresas fundadas entre 30 e 50 anos atrás. A capitalização via bolsa tem sido um dos maiores impulsos ao crescimento da gestão de riquezas. (E.B.)
Fonte:valoreconomico06/09/2011