Holdings ganham espaço em fusões
Empresas de investimento ligadas a empresários ou grupos familiares começaram a ganhar espaço nas operações de fusões e aquisições no país.
Nos últimos anos, holdings e gestoras como Cambuhy, J&F Investimentos, Península e Sforza se tornaram donas de negócios tão distintos quanto a geradora de energia Eneva e a rede de varejo de produtos naturais Mundo Verde.
Embora o conceito de holdings de investimento não seja novo, o modelo de atuação semelhante aos dos fundos que compram participações em empresas (private equity) fez com que esses grupos se tornassem concorrentes potenciais pelos negócios. Com a vantagem de trabalharem com dinheiro próprio e não terem um prazo definido para fazer os investimentos nem para devolver os recursos aos cotistas, com os gestores de fundos de terceiros.
Uma amostra do apetite dos grupos ocorreu no ano passado, com a aquisição da Alpargatas. A J&F, até então vista apenas como a holding que reúne os investimentos da dona do frigorífico JBS, surpreendeu ao comprar a fabricante de calçados e artigos esportivos, por R$ 2,7 bilhões. A J&F tomou a dianteira ao fechar o negócio, que contou com financiamento da Caixa Econômica Federal, sem fazer o habitual processo de auditoria (“due diligence”).
O “sonho grande” do trio Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Beto Sicupira, da 3G Capital, é apontado como a principal referência para as empresas de investimento com capital proprietário. No Brasil, os grupos têm uma dinâmica mais ligada ao negócio principal de atuação de seus sócios. É o caso da Península, que reúne os investimentos do empresário Abilio Diniz.
Quem mais se aproxima do modelo da 3G é a Cambuhy, que tem entre os sócios Pedro Moreira Salles, presidente do conselho de administração do Itaú Unibanco, mas não possui ligação com a empresa que administra os recursos da família. Com um aporte inicial de US$ 1 bilhão, a gestora ainda tem recursos para mais uma aquisição antes de uma nova rodada de capitalização, segundo fontes de mercado.
A vontade de empreender e de influenciar a gestão é apontada como principal motivação dos empresários ao atuarem como compradores de empresas. “A família gosta de atuar diretamente nos negócios em que investe”, afirma Carolina Almeida Marcondes, diretora da Sforza, holding que reúne os investimentos do empresário Carlos Wizard Martins.
A Sforza foi criada por Wizard em 2013, pouco antes da venda do Grupo Multi, rede de ensino profissionalizante e de idiomas, para a britânica Pearson, em um negócio de R$ 1,95 bilhão. O plano declarado do empresário após a operação era passar um ano sabático. Menos de um ano depois, porém, já estava de volta aos negócios.
Além da visão financeira e de retorno típicas de um private equity, os negócios realizados por holdings familiares costumam passar por uma questão de afinidade com as empresas e setores de atuação. “Dificilmente a Sforza investirá em negócios ligados a bebida e fumo”, afirma a diretora do grupo de Wizard. O caminho natural tomado pelos empreendedores-gestores é buscar negócios ligados a suas áreas de atuação. Ex-sócio do banco Pactual, Luís Cláudio Garcia de Souza criou sua holding com atuação ligada à área de serviços financeiros. Por meio da Finvest, detém participações na RB Capital, de securitização de recebíveis, e estrutura operações de crédito por meio de fundos com recursos próprios. A empresa também tem investimento na Bufalo, de silos e logística, em sociedade com o Goldman Sachs. O objetivo é atuar de forma semelhante a um fundo de private equity, segundo Souza. “Eu não montei as operações para vender, mas as empresas precisam ter valor e ser ‘vendáveis'”.
A escolha por investir diretamente também vai da avaliação de muitos empreendedores de que ter uma estrutura própria de private equity pode trazer resultados melhores e com menos custo que o investimento por meio de fundos sob gestão de terceiros, segundo André Castellini, sócio da consultoria Bain & Company. O principal desafio para os grupos que decidem por esse caminho é atrair bons profissionais. “As gestoras de fundos de private equity têm estruturas de remuneração consideradas mais atrativas”, diz.
A própria rede de contatos dos executivos costuma ser a fonte da maioria dos negócios fechados pelas companhias de investimento ligadas a grupos empresariais. O sócio de uma empresa de investimentos tende a relativizar essa vantagem. “Hoje em dia, praticamente todo vendedor bem informado fala com mais de um potencial comprador”, diz o executivo.
A maior flexibilidade ao atuar com capital proprietário é apontada como o principal diferencial em relação a um fundo com capital de terceiros. “Como não temos prazo definido para fazer os investimentos nem para vender as participações, temos condições de avaliar negócios mais complexos”, afirma.
O momento de retração da economia e acesso restrito a fontes de financiamento tende a favorecer a atuação de quem investe em participações em empresas, fundos ou grupos que atuam com dinheiro próprio. O que não significa que os ativos brasileiros estejam baratos, segundo o gestor. “Os preços caíram, mas a perspectiva de retorno no atual cenário também”. – Valor Econômico – Leia mais em portal.newsnet 31/05/2016