Investimento em 2016 será o menor em 14 anos
Olhar para a trajetória dos investimentos na economia permite entender por que, após a parada do motor do consumo, o mergulho da atividade pode ser tão profundo neste e no
próximo ano. Entre 2014 e 2016, a formação bruta de capital fixo a medida de tudo o que é investido em máquinas e equipamentos, construção civil e inovação cairá mais de 30%, segundo especialistas ouvidos pelo Valor. Com isso, a taxa de investimento pode cair abaixo de 17% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2016. Se isso se confirmar, será a menor taxa de investimento registrada desde 2003.
Há, no entanto, quem avalie que o quadro pode ser um pouco pior. O Credit Suisse, por exemplo, espera quatro anos de quedas consecutivas dos investimentos. Após contração de 4,4% em 2014 e expectativa de baixa de 14,6% e de 12,6% em 2015 e 2016, respectivamente, a equipe liderada por Nilson Teixeira espera contração adicional de 2,7% em 2017. A trajetória, diz o banco, deve fazer com que a taxa de investimento saia dos 20,9% do PIB em 2014 e volte para 15,2% em 2017, a menor em muitos anos.
Entre os mais pessimistas do mercado, o economista-chefe do Banco Fator, José Francisco de Lima Gonçalves, espera queda dos investimentos de 17% neste ano, seguida por outro tombo, de 14,7%, no ano que vem. “Não acho exagero”, diz Gonçalves. Para ele, a persistência de um quadro que une atividade fraca, efeitos da Operação Lava-Jato e a mudança de postura do BNDES e da Caixa na concessão de crédito justificam a projeção.
Na MCM Consultores, o cenário é de queda dos investimentos de 15% neste ano e de 13,1% no ano que vem, ancorada nos níveis de confiança dos empresários, que devem continuar sem reação significativa. “Além da confiança em patamar ainda baixo, temos condições de crédito mais apertadas e o processo de ajuste de estoque, que não foi feito em 2015, vai ter que acontecer em 2016”, diz Leandro Padulla, economista da MCM. Confirmadas as projeções, diz Padulla, o investimento deve se aproximar do nível registrado no fim de 2007.
David Beker, do BofA: “Com dificuldade de traçar cenários, as empresas preferem parar e esperar os desdobramentos
A Tendências Consultoria prevê queda para os investimentos de 14,7% neste ano e de 9% no ano que vem. Caso os números se confirmem, diz a sócia da Tendências, Alessandra Ribeiro, a taxa de investimento chegaria a 16,8% em 2016 um retorno para 2003, justamente o início do ciclo mais robusto de crescimento. Segundo Alessandra, o quadro será marcado por uma queda de 25% do consumo aparente em 2015 (medida que soma a produção nacional e as importações desses itens,
descontadas as exportações), seguida de uma baixa de 13,7% no ano que vem.
Já o setor de construção civil deve registrar contração de 12,4% neste ano e outra queda de quase 6% em 2016. Segundo Alessandra, as projeções para lançamentos residenciais dão uma boa ideia da “dramaticidade” pela qual passa o setor. O monitor de construção civil da Tendências prevê queda de 34,3% em lançamentos de imóveis residenciais neste ano. Para 2016, a previsão é de queda de 9%. “Por trás disso estão os velhos fundamentos: desemprego com tendência de alta batendo em renda”, diz Alessandra.
No segmento de máquinas e equipamentos, além da Operação Lava-Jato, que tirou cerca de 2,5 pontos do PIB só neste ano, há um aumento de ociosidade nos mais diferentes setores, diz a economista. O nível de utilização da capacidade instalada do setor automotivo, lembra, está ao redor de 53%. “Até eliminar essa ociosidade e voltar de fato a investir leva um tempo”, diz.
David Beker, chefe de economia e estratégia do Bank of America Merrill Lynch (BofA) no Brasil, estima quedas de 9,4% e 7,6% do investimento em 2015 e 2016, respectivamente. Beker lembra que a Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP) voltou a subir para 7,5% ao ano. “É uma alta de 2,5 pontos percentuais em relação ao nível mais baixo, de 5% ao ano. Além das condições de crédito mais escassas, o BNDES reduziu desembolsos e o investimento público também encolheu. É uma tempestade perfeita”, afirma ele.
O principal motivo para que as empresas mantenham os projetos na gaveta, porém, é o cenário de grande incerteza econômica e política, acredita Beker. Com dificuldade de traçar cenários, as empresas preferem parar e esperar os desdobramentos, afirma.
Ele lembra que, nos anos anteriores à desaceleração da economia, as empresas fizeram investimentos para se adequar a projeções de crescimento de longo prazo de 3% a 4% ao ano. “Hoje, há certo consenso de que o PIB potencial está em torno de 2%”. Por isso, diz ele, é possível que, mesmo com avanços no cenário político, a retomada do investimento possa ser mais moderada do que em outras crises, como em 2009.
Para o UBS, o aumento da capacidade instalada, taxas de juros mais altos, lucros corporativos em baixa e incerteza sobre a política fiscal vão manter o investimento deprimido. Guilherme Loureiro, economista-chefe do banco, projeta que a formação de capital fixo deve cair 13,8% neste ano e voltar a ter desempenho muito negativo em 2016, com retração de 12,2%. Para ele, a falta de uma âncora fiscal deve manter os prêmios de risco do país elevados, com efeitos negativos tanto sobre o consumo quanto sobre os investimentos.
Para Padulla, da MCM, o fundo do poço fica para o ano que vem, quando a taxa de investimento encostará nos 16,6%. O economista, no entanto, volta a projetar alta dos investimentos de 7,3% em 2017, o que deve fazer com que a taxa volte aos 17,7%. Menos otimista, Alessandra, da Tendências, ainda não vê gatilho para mudanças na situação dos investimentos. “Não acreditamos em reforma ou
alavancagem das concessões. O único gatilho seria algo meio exógeno, como um melhor arranjo político que melhoraria a confiança e gerar uma queda menor.”
“Obviamente, se tiver melhora do cenário político, teremos retomada do investimento”, concorda Beker, do BofA, embora ele acredite que essa retomada pode ser mais gradual do que em outros momentos de recuperação da economia. O economista, contudo, acredita que a formação bruta de capital fixo pode ter alguma recuperação a partir da segunda metade de 2016, com números um pouco melhores em 2017.
Para Beker, alguns setores industriais tenderiam a se destacar, principalmente aqueles que ficaram mais competitivos com a desvalorização do câmbio, como o calçadista e o têxtil. “Não são setores com capacidades para mudar a tendência do investimento, mas são segmentos que tendem a se recuperar antes”.
Já no segmento de bens duráveis, por exemplo, essa retomada deve ser mais lenta, já que foi grande o investimento em capacidade instalada nos últimos anos. Uma boa notícia, porém, é o aumento do interesse do investidor estrangeiro por ativos brasileiros, avalia Beker. “O investidor local está muito pessimista, mas o estrangeiro está olhando algumas oportunidades com apetite”, afirma Beker. Fonte: Valor Econômico 29/12/2015 – Por Flavia Lima e Tainara Machado | De São Paulo Leia mais em sinicon 29/12/2015