O Grupo Tapajós é um daqueles casos clássicos de grandes empresas que ajudam a mostrar o tamanho do Brasil fora do eixo Rio-São Paulo. Fundado há 28 anos, é líder no mercado farmacêutico do Norte do país e fatura R$ 1,2 bilhão por lá. Começou com atacado, mas, hoje, 60% desse montante vem do varejo.

Entre expansão orgânica e compras de concorrentes, a companhia conseguiu se estabelecer em uma região de logística complicada e tem uma ampla rede de distribuição, tanto à população quanto às farmácias independentes. Mas está longe de ficar parada. De olho em uma concorrência que avança cada vez mais rápido — e vem mais bem preparada — o grupo captou R$ 160 milhões via FIDC. O dinheiro será usado para ajudar a desalavancar a companhia, além de dar fôlego à expansão: 50 novos pontos de venda, além de inaugurar dark stores e acelerar projetos de franquias e de transformação digital. Haja fôlego.

A busca por crescimento e por trazer acesso a medicamentos para a população na região faz parte da história do grupo desde o seu nascimento. Em 1994, a companhia surgiu por iniciativa de empresários do Pará, mais especificamente de Santarém — cidade banhada pelo Rio Tapajós, daí o nome da empresa — que começaram um pequeno negócio no setor farmacêutico. No início, era principalmente uma distribuidora, que saía da cidade para Manaus.

Maior grupo farmacêutico do Norte quer crescer ainda mais

Em 2006, a companhia entrou no varejo com uma aquisição de uma rede de farmácias local, criando a rede Santo Remédio e, em 2018, ganhou musculatura suficiente nessa vertical por meio de uma expansão inorgânica, a compra da rede Farmabem. A aquisição trouxe um marco importante para o grupo: foi com ela que conseguiu, pela primeira vez, ter uma receita maior vinda do varejo do que do atacado: hoje, do R$ 1,2 bilhão de faturamento anual, 60% vem da venda de produtos diretamente ao consumidor. Em uma perspectiva geral, o grupo tem o 14º maior faturamento do Brasil, de acordo com informações da Abrafarma. Ainda distante da liderança nacional, é claro, mas extremamente relevante na região, que representa 2% do mercado consumidor do setor no país.

Na mesma medida em que trouxe uma oportunidade, a captação trouxe um desafio. A aquisição da Farmabem custou R$ 230 milhões por 70 lojas, em um prazo bastante curto de pagamento. Logo, nos últimos dois anos, o grupo não cresce da forma como deveria, na última linha do balanço, porque está em um momento de pagar o investimento que fez lá atrás. “A entrada do FIDC vai permitir que a gente alongue isso e sobrem aí R$ 50 milhões para fazer investimentos em outros estados”, diz Fernando Ferreira, diretor comercial do Grupo Tapajós, ao EXAME IN. E que outros mercados são esses? Boa Vista, Porto Velho, sem esquecer, é claro, da cidade manauara.

Hoje, o Grupo Tapajós tem 130 lojas, das marcas Santo Remédio, Farmabem e Flexifarma (direcionadas a consumidores com diferentes poderes aquisitivos). Isso sem falar no atacado, que segue firme e forte na empresa, atendendo 4.500 farmácias independentes nas mesmas regiões. A vontade de investir e de crescer tem um motivo claro: tornar a companhia cada vez maior em meio à chegada da concorrência. Se, há treze anos, quando se tornou verdadeiramente grande em Manaus, a principal concorrência era local, no Brasil de 2022 o cenário é totalmente diferente. Gigantes como a RD (dona da Droga Raia e Drogasil), grupo 25 vezes maior do que o Tapajós em faturamento, tentam estabelecer presença por lá, bem como grandes distribuidores, como a Santa Cruz, líder no país.

As vantagens do Grupo Tapajós

Não que a tarefa seja necessariamente fácil para eles, mesmo com maior ‘poder de fogo’ financeiro. “Logística e mão-de-obra são pontos complicados para a região. Você tem de formar quase do zero o time que vai construir o negócio, o que é um grande desafio. Nesse sentido, a gente brinca que é o ‘McDonald’s’ do setor farmacêutico do Norte. Todo mundo que está nesse mercado, em Manaus, meio que começou com a gente”, diz Ferreira.

Para dar uma dimensão do tamanho da importância do grupo por lá, a cada duas caixas de medicamento vendidas em farmácias de Manaus, uma sai do Centro de Distribuição do Grupo Tapajós. Se o CD fecha, não há tempo hábil para ninguém chegar na região com um medicamento. Mas para entender isso, é necessário entender que o ritmo de prazos de entrega funciona numa lógica muito diferente da que se está acostumado a ver no Sudeste.

Um medicamento leva, em média, 30 dias para chegar em Manaus (saindo do Sul ou do Sudeste). É uma rota rodoviária até Belém, um tanto de balsa até a cidade e, quando se chga nela, há ainda um desembaraço alfandegário (por conta da Zona Franca) que leva mais tempo. A rota mais rápida é aérea, que leva um terço do tempo para sair do fornecedor e chegar ao centro de distribuição local. Isso é só o começo. Além do prazo maior para entrega, há que se ter um controle cuidadoso de fluxo de caixa, uma vez que os fornecedores do Grupo Tapajós dão entre 30 e 60 dias de prazo para pagamento. Traduzindo: os medicamentos chegam ao centro de distribuição já sem prazo para vender. A companhia, pela experiência no setor e na região, consegue driblar essa dificuldade para conceder outros 30 a 60 dias de prazo às farmácias independentes que abastece na região.

Some a esse desafio o custo de energia. “Em Manaus, o custo de energia elétrica é equivalente ao de ter bandeira vermelha o ano todo. Imagine ter que lidar com centros de distribuição refrigerados em uma cidade com o custo de vida tão alto? Isso também tem de ser considerado e é um desafio”, diz Ferreira.

O executivo ressalta esses pontos como diferenciais competitivos em relação a quem quer chegar por lá agora. O conhecimento logístico para entregar em regiões que fazem fronteira com a Colômbia, por exemplo – e o fato de ser a única rede que entrega por lá, mesmo com a chegada da distribuidora líder nacional — somado ao conhecimento de pontos de entrega de medicamentos de ribeirinhos (num modelo onde não há seguro para as rotas que os medicamentos percorrem) são, é claro, um trunfo e tanto diante da concorrência que chega agora. Dentro de casa, a empresa ainda conta com o fato de ser bastante enxuta e de ter passado de seis para apenas dois diretores abaixo do CEO. “A gente tem de ser ágil. Não dá para ter burocracia demais dentro da empresa. Não é o grande que engole o pequeno, mas o rápido que engole o lento”, diz o executivo.

Como avançar?

Para avançar rumo ao futuro e realmente conseguir manter a posição de liderança que tem, a companhia escolheu um modelo de crescimento mais ‘asset light’, ou seja, com franquias. A ideia é que se crie um ciclo virtuoso a partir da relação da distribuidora do grupo com as farmácias independentes, o que, no fim das contas, vai alimentar o varejo do grupo e assim sucessivamente.

A estratégia para a primeira ponta da cadeia, a distribuição, vem de uma inspiração norte-americana, a McKesson. Ferreira traça um paralelo da situação pela qual o grupo regional passa atualmente com o cenário enfrentado pelos Estados Unidos nos anos 1990, época do ‘boom’ de redes como as bastante conhecidas CVS e Walgreens — que não extinguiram completamente farmácias menores, redes locais e independentes.

“O que as salvou? A McKesson. A distribuidora fornece também para as grandes redes, ao mesmo tempo que, para as menores, deu gestão, softwares que permitiam precificar melhor, programa de fidelidade e pede, em troca, que os estabelecimentos comprem dela. É um modelo que funciona até hoje nos Estados Unidos com sucesso”, afirma o executivo. No Brasil, nenhuma distribuidora quis dar esse grande passo. E isso, para Ferreira, abre caminho para a empresa tentar a vez dentro dele.

As farmácias com quem a companhia quer fortalecer esse relacionamento são, é claro, as independentes com a maior venda na região. Ao mirá-las para uma distribuição mais eficaz, a empresa também negocia com elas para que sejam envelopadas com a marca Flexifarma. Depois de firmado o contrato, o Tapajós segue a mesma receita gringa: dá suporte, produtos em uma condição de menor preço praticado pelo grupo, inteligência de marketing, etc, e em troca, fideliza esse público para que compre dele. Hoje, 20 lojas funcionam .. leia mais em Índices Bovespa 13/12/2022