Na Porto, está tudo pronto para o IPO do negócio de seguro saúde – só falta o mercado deixar
O grupo espera um ambiente favorável na bolsa para fazer as ofertas iniciais de ações da Porto Saúde e da Porto Serviços.
Se houvesse um multiverso financeiro, com uma realidade alternativa onde todas as expectativas econômicas do início do ano passado tivessem se concretizado, a Porto teria comemorado um IPO em 2024. De bônus, talvez pudesse ter planejado até uma segunda operação neste ano.
O grupo não esconde o desejo de fazer as ofertas públicas iniciais de ações da Porto Saúde e da Porto Serviço, se houver um ambiente favorável. Mas, na atual realidade, a bolsa brasileira amarga uma seca de IPOs, que já dura mais de três anos e deve se manter em 2025.
No ano passado, a Porto fez dois movimentos importantes: trocou o CEO – em janeiro, Paulo Kakinoff, ex-Gol, assumiu o cargo no lugar de Roberto Santos – e, sem alarde, obteve, em agosto, os registros como companhias de capital aberto das duas verticais.
A reestruturação societária das empresas e a chegada de um executivo com conexões em vários setores – Kakinoff é conselheiro da Suzano, MRV, Simpar, Vamos e Cocal – deixou evidente que o grupo tinha como plano de voo fazer o IPO das duas empresas.
“Abrimos o capital da Porto Serviços e da Porto Saúde, justamente, para eventuais oportunidades de associações ou IPOs, dependendo das oportunidades no mercado de capitais”, disse o vice-presidente de Finanças (CFO) da holding, Celso Damadi, ao InvestNews.
O problema é que o cenário não ajudou. Como no nosso mundo do multiverso os juros estão no maior patamar em 10 anos e ainda em elevação, a janela para os IPOs não dá mostras de que pode reabrir tão cedo.
Por isso mesmo, a holding tem mantido conversas com potenciais sócios privados para a empresa de saúde, como reconheceu o CEO Paulo Kakinoff. Mas as conversações ainda vão evoluir e não alcançaram um estágio “exclusivo ou vinculante.” Um status de não vinculante significa, na prática, que o grupo e o aspirante a sócio estão na fase de namoro e ainda não assumiram o noivado.
A principal candidata é a americana Summit Partners. A gestora já investe em uma startup brasileira, a Celcoin, de serviços bancários digitais. A Porto enxerga com bons olhos a experiência da casa gringa, especializada em negócios ligados a tecnologia, cuidados de saúde e bem-estar.
Kakinoff enfatizou, porém, que as verticais têm capacidade de atingir as metas de expansão sozinhas. Uma oferta de ações ou a entrada de um sócio minoritário seriam um reforço, mas não são essenciais. “Só consideraria uma transação se houvesse uma adição estratégica de valor.”
No cenário atual, a ideia de uma adição estratégica de valor poderia ser encarada como uma injeção de recursos para aproveitar um mercado muito mais pulsante ou a chegada de um sócio que trouxesse complementariedade e abrisse portas de parcerias estratégicas.
Sucessão bem-sucedida
Os IPOs, se tivessem ocorrido, teriam sido a coroação de um processo sucessório que se consolidou há seis anos, com a passagem de bastão no comando entre as gerações da família controladora. E teriam acontecido justamente em um momento no qual a seguradora completou 20 anos da própria listagem na bolsa, ocorrida em 22 de novembro de 2004.
Há seis anos, mais especificamente em 31 de maio de 2019, o conselho de administração da então Porto Seguro ratificou o nome de Bruno Garfinkel como presidente do colegiado. Na ocasião, Jayme Garfinkel deixou o posto em favor do filho. Também decidiu se aposentar da própria seguradora, na qual trabalhou por 47 anos e que consolidou como a quarta maior do país.
Jayme reconheceu haver ventos intensos de mudança na indústria naquele momento. E que, apesar de toda sua bagagem, seria melhor alguém mais jovem passar a conduzir a nave dali em diante. “Acho muito importante uma nova geração dirigir a empresa, porque tem um monte de informações que eu já não alcanço mais”, afirmou em entrevista na época.
A transformação digital e as mudanças de comportamentos, com a onipresença das redes sociais, e em um mundo onde o smartphone assume uma posição central na vida das pessoas já começavam a causar insônia em muitos CEOs. O timing no qual Bruno assumiu como timoneiro, porém, não poderia ter sido mais desafiador: além das mudanças tecnológicas no pano de fundo, vieram logo em sequência a pandemia, o aumento da frequência das catástrofes climáticas e a chegada da inteligência artificial generativa.
O início do início
Durante os anos mais conturbados, a Porto Seguro navegou sem grandes sustos por essas águas não mapeadas. Para clientes, funcionários, fornecedores e investidores, a companhia fez jus ao nome. Manteve-se como maior seguradora independente do país, com um crescimento anual de dois dígitos.
Um fator que ajudou o grupo a manter a estabilidade mesmo em meio às incertezas veio do entrosamento da dobradinha Roberto Santos, que havia assumido a cadeira de CEO em 2018, e Bruno, à frente do conselho e com a responsabilidade de definir os rumos estratégicos da corporação.
Quando o herdeiro dos Garfinkel entrou na Porto Seguro, como a seguradora era conhecida na época, encontrou em Santos uma espécie de mentor. O executivo, com décadas de experiência no setor, ajudou a elaborar o plano de carreira do futuro chairman desde os tempos de trainee. Antes de chegar ao comando do colegiado, Bruno passou 15 anos adquirindo experiência em várias áreas do grupo.
Começou no básico: atendendo chamadas telefônicas de aberturas de sinistro. Quando recebeu o leme da Porto após uma década e meia, Bruno acumulava passagens pela Azul, uma das controladas da holding, além da diretoria comercial e da área de automóveis da própria Porto Seguro.
Sem depender só do automóvel
Um dos principais dilemas da antiga Porto Seguro era a excessiva dependência do negócio de proteção de veículos. Ainda que fosse e continue sendo a líder do segmento, a concentração de lucro e receita em apenas um carro-chefe representava uma vulnerabilidade.
Há seis anos, a área de seguros equivalia a 86,3% da receita da holding. A venda de apólices auto, por sua vez, representava 63,6% do faturamento de seguros e 54% de todas as receitas.
O seguro auto chegou a responder por 85% do lucro do grupo. Hoje essa participação caiu para 37%. “A dependência de um produto só da Porto não existe mais”, afirmou Damadi. “Outros negócios como banco, saúde e serviços começam a tomar um corpo mais material mais importante.”
Esse impulso citado pelo CFO veio de uma decisão tomada em 2021 e implementada no ano seguinte. Foi a aposta de dividir a Porto em três “verticais”: Porto Seguro, que passou a concentrar os negócios de apólices e previdência privada, a Porto Bank, responsável pelos produtos financeiros, como cartão, crédito e conta digital, e a Porto Saúde, de seguro saúde. Cada uma delas passou a funcionar como uma empresa, com CEO próprio e maior autonomia decisória.
Em abril do mesmo ano, diante da reestruturação, a holding mudou de nome. Tornou-se apenas Porto. Em 2023, o grupo criou uma quarta vertical, a Porto Serviço. A nova empresa trouxe para debaixo do seu guarda-chuva toda a rede de prestação de assistências a clientes e não clientes, além da operação da Renova, que recicla peças de veículos recuperados pela seguradora.
Vamos às compras
Enquanto o IPO não vem, a Porto Serviço faz planos de ir às compras. Uma das prioridades neste ano está a ampliação de linhas de receitas. Isso porque as dezenas de serviços oferecidos pela área ainda se voltam mais para carros e casas. A companhia está capitalizada e “a questão de novas aquisições está no nosso radar”, disse o CEO da vertical, Lene Araújo... leia mais em InvestNews 25/02/2025