O tubarão acordou: a Advent vai para cima das empresas de tech e startups
Uma das mais tradicionais gestoras de private equity do mercado, a Advent vai focar boa parte dos US$ 2 bilhões captados para o seu sétimo fundo na América Latina em empresas de tecnologia e startups de alto crescimento. Entenda a estratégia
Desde que iniciou suas operações na América Latina, em 1996, a gestora americana de private equity Advent aportou US$ 8 bilhões na região. Mas um pente fino nos investimentos mostra que a grande maioria de suas operações se concentrou em setores tradicionais e empresas maduras que atuam em varejo, educação, alimentação, saúde e financeiro.
De pouco mais de um ano para cá, entretanto, algo mudou. A gigante, que em setembro anunciou ter captado US$ 2 bilhões (R$ 11 bilhões) para o seu sétimo fundo na região, o Latin American Private Equity Fund VII (Lapef 7), acordou para o mercado de tecnologia e startups – um setor geralmente dominado pelos fundos de venture capital.
Dos últimos quatro deals feitos pela gestora na América Latina, três foram em tech: a CI&T, o Nubank e a Sophos, uma empresa colombiana de software que recebeu investimento na semana passada. O único negócio que não passou pelo mercado de tech foi a compra de uma fatia majoritária no grupo CRM, dono das marcas de chocolate Kopenhagen e Brasil Cacau.
Esses foram os investimentos que fecharam do Lapef 6, um fundo também de US$ 2 bilhões. “As empresas de tech e as relacionadas à tecnologia representaram 30% dos investimentos desse fundo”, diz Brenno Raiko, sócio-diretor da Advent e responsável pelos investimentos em tech na América Latina, ao NeoFeed.
“Tecnologia ganhou uma relevância muito maior no fundo seis do que no fundo cinco. E isso vai crescer. Esse é o objetivo do nosso próximo fundo, o Lapef 7”, diz Raiko. O executivo explica que o interesse na área surgiu naturalmente. Afinal, é uma tendência global. As empresas mais valiosas do mundo são de tecnologia.
Apple, Amazon, Microsoft, Alphabet, Facebook estão aí para provar a tese. Na América Latina, o Mercado Livre chegou a figurar como a empresa de maior valor de mercado da região durante os meses mais agudos da pandemia e na sexta-feira, 4 de novembro, era cotado a US$ 77,4 bilhões. Portanto, ficar de fora desse segmento, é como ir a um baile e não tirar ninguém para dançar.
Mas entrar em um mercado como esse não é tão simples. “Nenhum fundo tradicional de private equity que atua no Brasil entende de tecnologia”, diz um grande empreendedor do mundo das startups. “O pessoal aqui sempre olhou a tese do 3G, do Jorge Paulo Lemann, de consolidação e eficiência operacional. Acontece que o próprio Lemann já está questionando esse modelo.”
De acordo com esse empreendedor, na próxima década, as grandes empresas da bolsa serão de tecnologia. Não à toa, a Advent resolveu se mexer. No fim do ano passado, pela primeira vez em sua história, a gestora criou um fundo setorial. Trata-se do Advent Tech, que também captou US$ 2 bilhões e é liderado por Bryan Taylor, que foi co-head do americano TPG Capital, com investimentos em empresas como Airbnb, Spotify, entre outras.
O Advent Tech, com escritório em Palo Alto, no Vale do Silício, e mandato para investir globalmente, pode fazer cheques de US$ 50 milhões até US$ 2 bilhões – neste último caso, coinvestindo com outro fundo da gestora, o Global Private Equity (GPE), que é focado nos Estados Unidos, Europa e Ásia, está na nona versão e conta com muito poder de fogo: US$ 17,5 bilhões captados no ano passado.
Essa mesma tese poderá ser adotada por aqui. Se necessário, a Advent coinvestirá com seus outros fundos. Isso, aliás, já aconteceu no passado. Em 2018, quando a empresa comprou a operação do Walmart (hoje transformado em Big) na região, ela fez em conjunto com o fundo GPE.
No caso das empresas de tecnologia e startups, a empresa adotará uma postura diferente. “Antigamente a gente só participava de companhia madura, tradicional”, diz Raiko. “O que estamos fazendo em tech é entrar no meio, em séries C e D.” Não há um tamanho definido para os aportes, o sócio da Advent explica que há flexibilidade.
Se, em setores tradicionais, os cheques da gestora giram ao redor de US$ 100 milhões, em tecnologia a Advent pode investir entre US$ 30 milhões e US$ 40 milhões em empresas de alto crescimento. “São companhias que, provavelmente, terão outras rodadas de investimento”, diz Raiko.
A Advent pode investir entre US$ 30 milhões e US$ 40 milhões em empresas de alto crescimento
A estratégia está longe de ser comparada a de um fundo de venture capital, que investe em muitas empresas e faz vários cheques. A Advent pretende investir o dinheiro do Lapef 7 em, no máximo, 15 companhias. Raiko diz que a gestora está classificando os investimentos em startups e empresas de tecnologia como “growth equity”.
O Nubank se encaixa nesse perfil. Apesar de já ser um gigante, avaliado em US$ 10 bilhões, o banco ainda tem muito potencial de crescimento. E a Advent se tornou acionista da fintech ao trocar as suas ações na Easynvest e ainda aportar mais uma quantia de valor não revelado. “A Advent fez um grande trabalho na Easynvest, dando uma virada tecnológica na corretora”, diz David Vélez, fundador e CEO do Nubank, ao NeoFeed.
Para encontrar as empresas certas, com alto potencial de crescimento, a gestora tem conversado com alguns dos principais fundos de venture capital do mercado. “Sei que eles estão olhando algumas empresas investidas por outros VCs”, diz o gestor de um grande fundo de venture capital brasileiro.
Esse movimento, diz Raiko, é fundamental para a maturidade do mercado brasileiro. “É um ecossistema que se autoalimenta. É bom para o venture capital, para o empreendedor, para a Advent e para o mercado de IPO”, diz Raiko.
A Advent vai focar suas atenções em cinco áreas: cybersecurity, fintech, healthtech, consumer tech e software as a service. “São setores tradicionais que a gente conhece muito bem, pode encontrar as fragilidades e identificar oportunidades”, diz Raiko.
Mas, ao contrário do que acontece em empresas mais maduras, o tempo de saída em companhias que estão crescendo é um pouco mais demorado. “Olhamos saídas de quatro a seis anos, mas não temos uma limitação”, diz Raiko. Neste ano, por exemplo, a Advent saiu da rede Quero-Quero, depois de ter investido R$ 300 milhões há 12 anos. A varejista de materiais de construção abriu o capital na B3, em agosto, movimentando R$ 1,94 bilhão. Deste total, a gestora embolsou R$ 1,66 bilhão… Leia mais em NeoFeed 07/12/2020