A correção de valuations em empresas de tecnologia deve provocar um aumento de fusões e aquisições entre startups, principalmente daquelas já classificadas como growth, mais maduras em seu modelo de negócio. Quem não entrou nessa fase capitalizado começou a cogitar se unir a um concorrente ou vender a operação, , para tentar evitar uma constrição no crescimento ou um down round – a expressão que só apareceu por aqui nos últimos dois meses e que significa uma captação a um valuation menor que na rodada anterior. Já quem está com dinheiro em caixa pode partir para consolidação.

“Começamos a identificar uma demanda menor de investidores olhando Brasil e com isso muita empresa que era resistente a ter conversas com outras companhias hoje está repensando isso, começando a se abrir para essa possibilidade”, diz Rodrigo Catunda, o goiano que é co-head da gestora General Atlantic no Brasil. “Devemos ver mais transações desse tipo daqui a dois, três meses, quando os empreendedores amadurecerem essa ideia e esse cenário de menor liquidez for se confirmando.”

A GA estima que o mercado de growth na América Latina tenha sido de US$ 15 bilhões no ano passado, mais do que os últimos 19 anos somados. O volume de capital fez empresas anteciparem rodadas, aumentarem os múltiplos e colocarem mais fundos no cap table.

A correção de preços começou em setembro, com valuations de empresas listadas de tecnologia entre 30% e 50% e suspensão do fluxo de IPOs – o que afeta o parâmetro usado nas rodadas privadas. “As companhias de early stage vão continuar captando porque elas têm valores nominais baixos, os múltiplos são altos mas crescimento também. Em growth, as empresas começam a ser avaliados com múltiplos mais definidos e é nessa fase, em que já estão numa série C, que deve acontecer mais M&As”, diz Catunda.

Vem aí os M&As da reprecificação de tecnologia

Segundo Cristiano Guimarães, chefe do banco de investimento do Itaú BBA, também já há peso da alta das taxas de juros nas atuais precificações – o impacto é relevante na conta de fluxo de caixa descontado no horizonte de longo prazo dessas companhias. “Mudou da visão de venda para visão de compra”, diz Guimarães, referindo-se ao fato de que os fundos estão olhando para os M&As do portfólio, ao invés de olharem para potenciais listagens em bolsa.

“O que víamos muito era empresa muito grande comprando startup pequenininha. Agora, vemos os M&As de startups entre si, o que já é muito comum nos Estados Unidos e vai ficar mais frequente por aqui”, corrobora Igor Piquet, que comanda o Scale-Up Ventures da Endeavor Brasil.

Ainda que já apareça nas conversas, os down rounds não começaram na prática no mercado brasileiro. “Teve muito oba-oba nos últimos dois anos, com valuations muito esticados, e que agora estão se ajustando. Ainda não está rolando, mas os down rounds vão acontecer, é um risco para as companhias”, avalia o executivo da GA.

Guimarães pondera que a correção de preço nas captações faz parte dos ciclos de mercado e que, apesar de ser temida por empreendedores, não é muito diferente do que acontece nas companhias listadas – afinal, um follow-on tem sempre desconto sobre o preço de tela.

Os executivos conversaram com o Pipeline após participarem de um painel sobre o assunto no TechFounders, evento promovido pelo Itaú BBA em São Paulo, na sexta-feira. Por vídeo, participou também do debate Martin Escobari, copresidente da GA e head da gestora na América Latina. “É um momento complicado para growth investment no Brasil e no mundo todo. O Brasil sempre chega atrasado na festa, mas ela acaba para todo mundo ao mesmo tempo. Não acho que seja catastrófico, mas um momento pouco mais difícil de levantar dinheiro”, avaliou Escobari.

A GA acompanha 100 mil empresas e adiciona anualmente cerca de 10 mil a esta lista, entre investidas e potenciais. Apesar da mudança de cenário, o apetite do fundo, que tem no portfólio companhias como Quinto Andar, Kavak e Hotmart, não parece ter diminuído. “O mundo está confuso e, nesse mundo confuso, eu gosto do risco Brasil, risco México, risco Índia. São economias que têm qualidades específicas. No Brasil, por exemplo, o câmbio ajuda pela primeira vez em 15 anos”, disse Escobari, que levanta fundos em dólares para investir em moeda local… leia mais em Pipeline 10/04/2022