O mercado de fusões e aquisições (M&A, na sigla em inglês) no Brasil apresentou sinais claros de recuperação em 2024, após a desaceleração vivida em 2023. Dados preliminares divulgados com exclusividade ao Valor pela boutique RGS Partners revelam que o número de transações cresceu 27% no comparativo anual, totalizando 160 negócios, enquanto o valor transacionado atingiu R$ 178 bilhões, um salto de 41%.

Na metodologia do levantamento, foram consideradas transações com valor divulgado igual ou superior a R$ 50 milhões, envolvendo vendedor sediado no Brasil, e que incluem aquisições, fusões, vendas de participação ou de ativos.

Apesar dos avanços, os números ainda permanecem abaixo do auge registrado no ciclo de 2020 a 2022, quando a média anual foi de 222 transações e R$ 245 bilhões. A análise dos dados mostra que a recuperação perdeu força no segundo semestre de 2024. Houve uma queda de 5% no número de transações em relação ao primeiro semestre, embora o volume transacionado tenha registrado um aumento de 7%.

André Levy, sócio e diretor de operações da RGS Partners explica que os dados confirmam a retomada da atividade comparada a 2023, porém com um primeiro semestre mais forte do que o segundo semestre do ano anterior.

Isso está muito relacionado à estabilidade macroeconômica e à maior previsibilidade dos juros observadas no primeiro semestre, o que facilitou a convergência entre compradores e vendedores em termos de ‘valuation’. No entanto, um ponto que chamou atenção foi a ausência de aceleração no segundo semestre em comparação ao primeiro. O volume de negócio permaneceu praticamente estável. Essa combinação com a recente instabilidade econômica deixa uma pulga atrás da orelha se 2025 conseguirá manter esse patamar ou se enfrentará uma nova queda”, diz Levy.

Em número de transações, setores como varejo e consumo, que cresceu de sete para 14 transações; indústrias, que subiu de 18 para 26, e materiais, que avançou de 12 para 19, apresentaram aumentos expressivos em comparação a 2023.

Já o segmento de tecnologia permaneceu com maior número de negócios, totalizando 39 transações, ou 24% do total. Na sequência, aparecem os setores industriais (26 transações, 16%) e energia/utilities (25 transações, 16%).

Já quando se trata de valores transacionados, energia e utilities foram os grandes motores do crescimento em 2024. O setor respondeu por mais de um terço do total, somando R$ 64 bilhões, seguido de perto por indústrias, que também tiveram papel relevante no volume geral.

Entre os exemplos, BP bioenergia que comprou a totalidade da bp bunge, de etanol, a BlackRock que comprou energias solares e adquiriu uma fatia da Brasol. A Auren arrematou a AES Brasil por cerca de R$ 7 bilhões. Já a Âmbar, braço de energia da J&F, adquiriu pequenas hidrelétricas da Cemig, usinas a biomassa da Engie, térmicas da Eletrobras da Copel e entrou no mercado de distribuição de energia. Além disso, o grupo dos irmãos Batista ingressou no setor de óleo e gás com a compra da Fluxus, com operações na Argentina, e da Pluspetrol Bolívia.

Outro destaque é a Vibra, que já detinha 50% da Comerc e em 2024 anunciou a aquisição da outra metade da companhia. Clarissa Sadock, vice-presidente de Energia Renovável na Vibra, explica que a empresa viu valor em antecipar a compra para reforçar a plataforma multienergia.

“O retorno financeiro foi vantajoso nesta aquisição, um momento de redução de risco com ativos construídos e contratados. São mais de 100 parques entre eólico, solar e geração distribuída”, diz Sadock. Em 2025 tem muita coisa para ser feita,mas o foco será no crescimento orgânico.

Márcio Santiago, head de energia e infraestrutura no Brasil da boutique de investimentos Araújo Fontes, demonstra otimismo em relação a 2025. Ele acredita que a demanda estrutural por infraestrutura no país ainda é significativamente baixa, o que deve continuar impulsionando a necessidade de novos investimentos.

Segundo o especialista, mesmo com o aumento da curva de juros, os leilões de rodovias e portos seguem em andamento, os projetos de geração de energia continuam com forte dinamismo, e os leilões de transmissão atraem grande interesse de investidores, especialmente em lotes com “capex” (investimento) bilionário. Além disso, o setor de água e saneamento mantém sua trajetória de crescimento, impulsionado pela universalização dos serviços exigida pelo marco regulatório e pelas privatizações recentes.

“Da mesma forma, as consolidações em petróleo e gás — sobretudo as “Junior oils” — não deixaram de acontecer, nem os armadores perderam apetite por comprar o controle de plataformas de concessões portuárias, vide Wilson Sons e Santos Brasil. Todos estes são setores com investimentos de muito longo prazo e seus investidores olham menos o curto prazo do que o longo prazo (25-30 anos).

Embora 2024 tenha mostrado sinais de melhora para o mercado de M&A no Brasil, a perspectiva para 2025 ainda é incerta. A head de research do Santander, Aline Cardoso, faz um alerta sobre as projeções para o próximo ano. Com uma previsão de crescimento do PIB de 1,8%, taxa Selic mantida em 14,5% e o dólar estabilizado em torno de R$ 6 até o final do ano, o banco projeta um cenário mais difícil para o mercado de ações. … saiba mais em Valor Econômico 12/01/2025