O motor está ligado. O tanque, abastecido com os dólares recebidos com a abertura de capital na Nasdaq, a bolsa de valores eletrônica dos Estados Unidos, em março passado. E o piloto mantém o pé direito no acelerador.

“Temos mais dois deals avançados”, afirma ao AgFeed Ruy Cunha, CEO da Lavoro Agro, maior rede de distribuição de insumos agrícolas no Brasil. “Estamos trabalhando para fazer os anúncios ainda antes do fim do nosso exercício fiscal, ainda neste semestre”.

A pista já não se apresenta tão favorável como nos anos anteriores. A estrada do agronegócio, em 2023, está mais tortuosa e acidentada. Juros em alta, preços de commodities em queda, menos confiança entre os agricultores indicam um período de mercados mais tensos e retraídos.

“Estávamos todos mal-acostumados”, aponta Cunha. “Tivemos anos maravilhosos, mas este está longe de ser ruim. Continuamos bastante ativos”.

Ainda assim, manter a máquina de aquisições da Lavoro funcionando é uma das premissas do trabalho do executivo. Foram 24 desde início de operação da empresa, controlada pelo Fundo Pátria Investimentos, em 2017.

Ao longo desse período, a empresa desenvolveu expertise na incorporação de novas marcas e, nos últimos anos, vem mantendo uma média de quatro a cinco novos cheques assinados para selar compras de outras empresas.

Em 2023, já há duas novas marcas em fase final no processo de fechamento de negócios. As aquisições da revenda Referência e da fabricante de bioinsumos Cromo Química já são, segundo Cunha, reflexo da entrada no caixa da Lavoro dos US$ 134 milhões levantados na Nasdaq.

Lavoro não vai parar máquina de M&A

São, também, indicadores de como a Lavoro pretende atuar a partir desse marco na história da empresa, a primeira brasileira do setor de distribuição de insumos a buscar recursos de investidores na bolsa americana.

Ao mesmo tempo em que mantém os olhos na pista do crescimento e das aquisições, Cunha agora precisa administrar as expectativas de um mercado exigente e questionador. Ao optar pela Nasdaq, ele sabia que tinha pela frente um processo “um pouco mais doloroso” do que a abertura de capital no Brasil.
“O processo é bastante longo e detalhado, com escrutínio grande por parte de todo um entorno formado por analistas e potenciais investidores”, afirma.

“O agro passa por uma transformação no acesso ao mercado de capitais e queríamos nos posicionar como uma empresa internacional, da América do Sul, e acreditamos que, para isso, deveríamos olhar para os Estados Unidos”.

Os dois primeiros meses após a listagem dos papéis da Lavoro na Nasdaq não foram exatamente empolgantes. As ações foram ofertadas a um valor de US$ 10, mas hoje sua cotação está um pouco acima da metade desse valor.

Cunha fixa os olhos mais à frente. Segundo ele, ainda não houve tempo para que analistas e investidores americanos pudessem conhecer mais a fundo a Lavoro. Além disso, diz, o volume de ações negociadas até agora no mercado (que representa apenas 2% do capital da empresa) é muito pequeno, o que compromete a liquidez dos papeis.

A Lavoro trabalha para que mudar esse quadro. Ainda no começo de maio Cunha assinou a última versão do F1, formulário que as empresas estrangeiras submetem à Security Exchange Comission (SEC), reguladora do mercado de ações nos Estados Unidos.

Esse documento é fundamental para concluir o processo de homologação das ações e permitir a liberação de um número maior de ações para comercialização nos pregões da Nasdaq.

Com a efetivação desse processo, Cunha acredita que o volume de papeis pode ser multiplicado por cinco ou seis vezes, “o que dá mais espaço para que trading e valuation façam sentido”.

Traduzindo do “financês”, com mais ações disponíveis e, portanto, mais liquidez, Cunha acredita que analistas e potenciais compradores deverão ter mais interesse em buscar informações e avaliar o real valor da companhia.

“Para entender a empresa, é preciso dedicar algum tempo, montar modelos. E para fazer isso, o analista precisa antes ser convencido de que vale a pena”, diz.

No mercado de ações, os fundamentos da empresa contam, mas a imagem também tem seu papel na formação do preço das ações. Por isso, Cunha aguarda com certa expectativa a divulgação de relatórios produzidos por empresas especializadas na análise de empresas.

O primeiro, marcando o início da cobertura da Lavoro pela Canaccord Genuity, saiu no final de abril. Os analistas da empresa indicaram como preço-alvo das ações o valor de U$ 13, com recomendação de compra. Em vários pontos do relatório, sustentaram a argumentação na eficiência dos processos de aquisição e incorporação de empresas desenvolvidos pela companhia brasileira.

Outros dois relatórios são esperados para as próximas semanas. “Isso tudo e mais os resultados do último trimestre devem colocar a abertura de capital em um ritmo mais normal”, afirma Cunha.

Assim, manter a máquina ligada tem um componente também de imagem junto ao mercado, além de sustentar a estratégia que tem permitido o acelerado crescimento da empresa, que faturou, com mais de 210 lojas e 60 mil clientes cadastrados, R$ 7,7 bilhões no exercício fiscal encerrado em junho de 2022.

O mercado de capitais, na visão de Cunha, deve sustentar o crescimento via aquisições, que vinha sendo financiado, em grande parte, por movimentos de capitalização da empresa pelos acionistas (leia-se Fundo Pátria).

Com o movimento para a bolsa, fomos buscar outras fontes de recursos, trazendo dinheiro para financiar nossa agenda de M&A”, diz, referindo-se à sigla em inglês para mergers and acquisitions (fusões e aquisições).

Segundo Cunha, há cerca de 80 empresas em posição de alvo para futuras investidas, sobretudo as posicionadas em regiões produtoras do Nordeste brasileiro, além de países como Colômbia, Peru, Equador, Chile e Paraguai, ampliando a presença internacional da marca.

Biológicos e serviços

Revendas de insumos devem continuar tendo preferência, mas com presença cada vez maior de fabricantes de insumos especiais, sobretudo biológicos, segmento que começa a ganhar força nos resultados da Lavoro.

Isso acontece porque a empresa busca, além de encorpar a receita, trazer para o negócio segmentos que permitam obter mais rentabilidade e potencial de crescimento. Segundo Cunha, a companhia tem conseguido taxas expressivas (na faixa de 20% ao ano) de expansão orgânica, bancada pelo próprio caixa da empresa.

Para que elas se mantenham, a Lavoro busca ganhar mais eficiência na gestão, mas também adicionar fontes de criação de valor. É aqui que se encaixa a Crop Care, holding criada pelo grupo para abraçar as empresas de produção de insumos. Já estão no portfólio, afora reforçado pela Cromo Química, marcas como Agrobiológica e Union Agro.

“Temos grande oportunidade de verticalização, especialmente em biológicos, que tem enorme potencial de crescimento, com impacto ambiental e nas nossas margens”, diz o executivo.

A Crop Care representa hoje 5% das receitas da Lavoro, mas 13% do lucro bruto. “Esse ano vai ser mais, a rentabilidade será maior”, afirma Cunha.

Na busca por resultados maiores nas revendas da rede está também a venda de serviços, sobretudo financeiros. No ano passado, a empresa atingiu o primeiro bilhão de reais em operações de barter – sistema em que o produtor compra insumos dando como pagamento parte de sua produção na safra futura.

Em 2023, com crédito mais caro e escasso, a Lavoro acredita poder crescer significativamente nessa área. Para isso, desenvolveu um modelo de barter que permite ao produtor, além de “travar” o preço das commodities nas operações, se beneficiar de um prêmio caso a cotação suba ao longo do contrato.

“O produtor não quer fazer negócios porque acredita que pode ter valorização no futuro”, diz Cunha. “É preciso fazer campanhas para movimentar o mercado e reduzir o nível de risco”.

A Lavoro testará ainda este ano a entrada no mercado de venda de seguros, em parceria com a Brasilseg, do Banco do Brasil. E pretende acelerar no mercado de agricultura digital. Uma das novidades até o fim do ano dever ser a oferta de um serviço de análise de solos a partir de testes genômicos. Desenvolvida pela empresa americana Pattern Ag, a tecnologia será trazida ao Brasil em parceria com o TPB, fundo que apoiou a emissão da Lavoro na Nasdaq e investe também na startup… leia mais em AgFeed 23/05/2023