A Méliuz precisará contornar uma “poison pill” (pílula de veneno, na tradução) — mecanismo de proteção para minoritários que dificulta ofertas hostis — para fechar seu acordo com o BV, anunciado no dia 30 de dezembro. Em teleconferência com analistas, o chefe de relações com investidores da companhia, Márcio Penna, afirmou que uma assembleia deve ser convocada até a próxima semana e que os controladores pedirão aos acionistas um “waiver” — uma espécie de autorização para não cumprir aquele artigo.

“O artigo 46 do nosso estatuto tem uma ‘poison pill’ e nós vamos pedir um waiver específico para esse deal [negócio]”, afirmou. Segundo ele, deve ser difícil atingir o quórum mínimo de dois terços na primeira convocação e, por isso, o mais provável é que o tema seja votado em uma segunda assembleia, entre o fim de fevereiro e início de março. Os controladores vão se abster de votar sobre esse tópico do waiver.

O artigo 46 do estatuto da Méliuz diz que qualquer acionista que atinja 20% das ações deverá, no prazo máximo de 60 dias, realizar uma oferta pública de aquisição de ações (OPA). O BV vai comprar inicialmente uma fatia de 3,85% na Méliz, com possibilidade de adquirir uma participação adicional de 20,95% em até 24 meses. Apesar do waiver, Penna ressaltou que, se o BV de fato exercer essa opção de compra da fatia adicional, o banco se comprometeu a fazer uma OPA para todas as ações remanescentes da Méliuz, com as mesmas condições.

Méliuz tenta contornar ‘pílula do veneno’

Além dessa fatia inicial de 3,85%, o BV está comprando 50% mais uma das ações da Bankly — subsidiária da Méliuz —, com possibilidade de comprar os 49% restantes em até 90 dias. Para ficar com 100% da unidade, desembolsaria R$ 210 milhões. A Méliuz anunciou a compra da Bankly (que então se chamava Acesso) em maio de 2021, por R$ 324,5 milhões, com o pagamento feito em ações.

Na teleconferência, a administração da Méliuz foi questionada sobre quais são as diferenças entre o acordo comercial agora com o BV e o modelo anterior, que a companhia tinha com o Pan e acabou sendo desfeito. Gabriel Loures, diretor de growth da companhia, afirmou que no novo modelo toda a experiência do usuário será da Méliuz, com ele permanecendo dentro do aplicativo e a empresa recebendo uma remuneração por cartões emitidos, contas ativas e compras efetivadas (TPV). No acordo anterior com o Pan, a Méliuz gerava “leads”, encaminhando os clientes para o Pan. “Agora o usuário permanece dentro do nosso ecossistema, o que favorece o cross-sell, e vamos construir tudo em parceria com o BV.”

O CEO da Méliuz, Israel Salmen, afirmou que com o acordo com o BV a companhia passa de um modelo “asset heavy” para um formato “asset light”. Ele admitiu que a compra do Bankly se deu em outro contexto, de juros baixos e acesso fácil a capital, o que permitia à companhia correr mais riscos. Na nova realidade atual, no entanto, a Méliuz já vinha focando em eficiência operacional, com um ritmo de crescimento menor.

“O sentimento dentro da companhia nos últimos meses estava nos deixando chateados, porque a gente queria e tem capacidade de entregar muito mais, mas sentíamos que estávamos com o freio de mão puxado. Não podíamos fazer grandes investimentos para não queimar caixa em um momento de acesso restrito a capital. [Agora com o acordo] Dá uma sensação de alívio, porque a gente volta a ter capacidade de gerar muito mais valor, fazendo o que a gente sabe fazer melhor, que é a aquisição de cliente a baixo custo, com engajamento e retenção do usário.”

Pela fatia de 3,85% na Méliuz, o BV vai pagar R$ 1,50 por ação, corrigido pelo CDI entre a data de celebração do contrato e a data de consumação da operação. Ontem, no primeiro pregão após o anúncio da operação, o papel subiu 3,39%, a R$ 1,22. Hoje, por volta das 17h25, recuava 8,20%, a R$ 1,12… leia mais em Valor Investe 03/01/2023