Quem acompanha o mercado de investimento sabe que em tempos de incerteza econômica, com alta de juros e baixa liquidez — como o que estamos presenciando agora — apostar em transações de M&A (mergers and acquisitions ou fusões e aquisições) se torna mais arriscado. Isso não significa que não há espaço para oportunidades. Se avaliarmos o cenário de maneira criteriosa, é possível encontrar bons negócios a preços mais atrativos.

Olhando para o lado da venda, mais conhecido como “sell-side”, tenho observado empresas renomadas, com muita história pra contar, passando por dificuldades. Para essas, a entrada de investidores e a fusão com concorrentes ou grupos estratégicos se tornam alternativas interessantes para dar sequência ao negócio e superar a crise. Como diria a sabedoria popular: “a união faz a força”. Quanto aos compradores, aqueles que preservaram o caixa estão aproveitando o momento para buscar oportunidades atrativas, pensando no longo prazo.

Neste contexto, as empresas de setores que se encontram em uma curva de ascensão independentemente da recessão ou do crescimento econômico, serão as mais beneficiadas. Um exemplo disso é o Agro, que tem atraído o radar de grandes fundos por conta do aumento da demanda global e do câmbio competitivo.

O setor de saúde também sairá ganhando, afinal continuamos consumindo saúde mesmo em anos de baixo crescimento econômico. O que chama atenção na história recente foi o IPO da Rede D’or, de R$ 11,39 bilhões. O montante foi o maior dos últimos anos e o terceiro maior da história, ficando atrás apenas da abertura de capital do Santander em 2009 (R$ 14,1 bilhões) e do BB Seguridade em 2013 (R$ 11,47 bilhões). Após o IPO, foram mais de 17 M&As da Rede D’or, e a expectativa é que novos players apareçam como consolidadores nos diferentes segmentos da saúde.

Visando o longo prazo, empresas pautadas em tecnologia, podem agregar capacidades únicas para os compradores. Aquelas ainda que possuem uma forte agenda ESG, como é o caso das energias renováveis, estão em alta e acompanham o movimento global e crescente da sociedade em prol da sustentabilidade, da diversidade e do comprometimento com tais práticas.

Por outro lado, a retração econômica, capital caro, menor renda da população, redução do poder de consumo e a alavancagem devem impor desafios maiores para setores como Logística, Varejo, Educação Básica e Telecom. A estratégia de M&A aqui se enquadra para essas empresas em movimentos de fusão e incorporação com outros players já estabelecidos.

Não estou dizendo que o M&A é o comandante que levará todos os barcos à terra segura; cada operação possui um racional estratégico particular, bem como um plano de execução, valuation (avaliação de valor), processo de due diligence (auditoria) e negociação de seus contratos. Além disso, fatores macroeconômicos como custo de oportunidade podem influenciar.

Se em tempos de calmaria o papel do assessor (ou advisor) já era importante, neste momento, ele se torna ainda mais essencial para que o deal seja bem sucedido. Ou até para orientar a empresa a não seguir por este caminho.

Gosto muito de parafrasear o prefácio do livro do Mark Filippel, “Mergers and Acquisitions Playbook: Lessons from the Middle-Market Trenches”, para exemplificar a dinâmica entre assessor, sell-side e buy-side.

Imagine dois times de futebol que vão se enfrentar na final de um campeonato. Um deles possui uma coleção de vitórias, jogadores titulares nas seleções de seus países que jogam e treinam diariamente. Os 26 atletas estão no auge da sua forma física e possuem uma comissão técnica altamente qualificada. Estão acostumados a jogar com estádios lotados e sob pressão da torcida.

Do outro lado do campo, uma equipe amadora que apesar de ter alguns jogadores, metade está sem jogar nesta temporada. Apenas três dos atletas atuam em seleções nacionais. São treinados pelo próprio sócio do time. Antes do apito inicial, estão com a atenção direcionada aos telões do estádio, ou ao show da Rihanna como no intervalo do Super Bowl, uma vez que não estão acostumados a participar de campeonatos.

Quem vence a partida? É bem provável que a vitória seja do primeiro time — possivelmente de goleada — já que o time amador terá que aprender a jogar com a bola rolando.

Ao longo dos meus oito anos trabalhando nesta área, já vi o mesmo acontecer em operações de M&A. Muitos empresários que estão em processo de venda de sua empresa acabam se colocando em uma posição semelhante ao técnico do segundo time: calculam o valuation da empresa, buscam investidores, conduzem diligências e negociam contratos, aprendendo com “a bola rolando” ou com poucos campeonatos jogados.

Do outro lado da mesa de negociação, como o primeiro time, compradores experientes e grupos financeiros acompanhados de assessores que já conduziram centenas de transações. Nesta partida, o meu papel como assessor financeiro é equilibrar o processo e maximizar o retorno do M&A.

Ainda que a renda fixa seja mais atraente no momento, vale lembrar que o capital disponível para investir não encolheu. Pelo contrário, os fundos estão com mais dinheiro no bolso, porém, estão mais seletivos em quem e no que investir. Segundo previsão feita pelo Crunchbase, a expectativa é que as transações de M&A voltem a crescer neste ano que se inicia. Como costumo dizer, “não falta dinheiro para bons negócios”… Autor: Alexandre Cracovsky, CFA Vice-presidente na ADVISIA Investimentos, professor de Finanças na Link School of Business e FK Partners. Leia mais em bmcnews 17/02/2023