Nas últimas semanas, a expressão em inglês “credit crunchtem sido usada por agentes do mercado brasileiro para se referir a uma situação mais difícil para o crédito a empresas.

O ambiente de juros altos, com a consequente desaceleração da atividade econômica, e a multiplicação de casos de empresas em dificuldades financeiras tornam bancos e investidores do mercado de renda fixa mais arredios, levando à percepção de que há um “credit crunch”. Mas o que isso significa? E há, de fato, sinais desse fenômeno no Brasil?

O que é ‘credit crunch’

O termo “credit crunch” é usado para designar crises de crédito. Porém, em geral, refere-se a momentos em que as torneiras do crédito se fecham rapidamente, com impacto generalizado para famílias e empresas que tentam tomar recursos para se financiar.

Quando esse fenômeno ocorre, seja pelo surgimento de um risco inesperado, seja por uma restrição de liquidez, os credores param de emprestar. Ou seja, empresas e famílias que pretendem tomar crédito não o conseguem. Rolagens e renovações de empréstimos também ficam mais difíceis. Há um efeito sistêmico no mercado, com possível quebra de companhias em situação financeira mais delicada.

O que é ‘credit crunch’?

Há um ‘credit crunch’ no Brasil?

Há visões diferentes a esse respeito no mercado brasileiro. Nesta semana, a Verde Asset afirmou, em carta mensal a cotistas, ver sinais de um “incipiente ‘credit crunch’ atingindo a economia brasileira”. Outros gestores veem o mesmo cenário e começam a apontar esse fator como uma razão para o Banco Central (BC) antecipar os cortes na taxa Selic.

Os bancos, por outro lado, têm falado que há problemas pontuais no crédito corporativo. Ainda assim, a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) criou um grupo de trabalho para monitorar esse risco e vem discutindo medidas com o governo para o caso de a situação se agravar. Entre elas, estaria a reabertura de uma linha de liquidez para as instituições financeiras adotada pelo Banco Central (BC) no auge da pandemia.

Há, de fato, uma desaceleração do crédito no país. Os bancos estão segurando as concessões de algumas linhas de maior risco enquanto tentam ter um pouco mais de clareza sobre o cenário – o que passa necessariamente pela solução do governo para a questão fiscal. Outras modalidades passam por um freio de arrumação. É o caso do risco sacado, usado principalmente por empresas varejistas para financiar os pagamentos a fornecedores. . Foi nesse tipo de operação que a Americanas revelou “inconsistências contábeis” de R$ 20 bilhões, levando as instituições financeiras a se retrair.

As operações no mercado de crédito privado também recuaram, refletindo o impacto que os casos da Americanas e da Light teve nos fundos de investimento. Em fevereiro, as emissões de debêntures somaram apenas R$ 6,6 bilhões, bem abaixo dos R$ 18,7 bilhões captados em janeiro. O número é um quarto do volume levantado por meio desses papéis em fevereiro do ano passado.

Porém, as torneiras do crédito não estão totalmente fechadas, ainda que o dinheiro esteja fluindo mais lentamente. Dados do BC relativos a janeiro mostram que as concessões de empréstimos e financiamentos bancários cresceram 5,5% em janeiro, quando comparadas a dezembro, em termos dessazonalizados. O aumento foi de 7,3% no segmento de pessoa física e de apenas 1,2% no caso de pessoa jurídica.

Ao mesmo tempo, a capacidade das empresas de pagar suas dívidas está diminuindo, já que muitas se financiaram nos tempos de juros baixos e agora têm de arcar com uma taxa Selic de 13,75% ao ano. O crédito corporativo normalmente é pós-fixado, com taxas atreladas ao CDI ou, em alguns casos, ao IPCA.

Segundo reportagem publicada recentemente pelo Valor, a quantidade de empresas de capital aberto que não geram caixa suficiente para cobrir as despesas financeiras passou de 11,6%, em 2019, para 15,1% nos 12 meses encerrados em setembro de 2022. Os dados são de estudo produzido pelo Centro de Estudos de Mercado de Capitais (Cemec-Fipe).

Há, portanto, uma inegável piora no ambiente de crédito no Brasil, mas ainda não está claro se essa deterioração resultará de fato num “credit crunch”… leia mais em Valor Econômico 10/03/2023