O que esperar das operações de M&A no Brasil no próximo período
Quem está acostumado com o universo das fusões e aquisições aprende que o mercado não para e não acaba – movimenta-se e desloca-se, mas também reconhece que diversos fatores colaboram para que vivamos períodos com mais, melhores e mais valiosas operações, e, igualmente, para fases de calmaria. Temos assim, safras e entressafras, e operações de diferentes formatos, complexidade e magnitude.
Sabemos que o cenário atual não aponta para fases de extrema movimentação, e de grande quantidade de projetos e de operações no curto prazo, mas propomos uma análise mais ampla, que considere mais aspectos, e que recorde ao leitor que épocas de dificuldades trazem, também, bons negócios para quem sabe e pode aproveitar oportunidades, e garimpar ativos especiais.
Vivemos local e internacionalmente momentos bastante desafiadores, geradores de grande instabilidade e até de alguma fuga de capitais para “portos mais seguros”, que impactam o nosso câmbio, as bolsas de valores e, naturalmente, as operações societárias (assim como as aberturas de capital). Temos que considerar, porém, que sempre há um outro lado – e que por sua vez tende a apresentar uma outra visão de riscos e de oportunidades.
Destacamos, assim, alguns dos fatores principais que costumam afetar esse contexto, e que muito colaboram para influenciar o momento dos movimentos de compra e venda, e de parcerias estratégicas envolvendo empresas, tanto no mundo como um todo, quanto mais especificamente no Brasil.
Existem, dentre os principais e mais impactantes fatores jurídicos/regulatórios, políticos, econômicos (como taxa de juros, inflação, câmbio, situação fiscal etc.), conjunturais globais e estratégicas, de forma que rapidamente abordaremos alguns pontos que entendemos como “chave” para o que deve ocorrer no Brasil ao longo dos próximos meses.
Se de um lado temos que considerar aspectos globais que muito impactam decisões de investimento (especialmente internacionais), como por exemplo as persistentes questões envolvendo as situações de guerra na Ucrânia e na Faixa de Gaza (e seus aspectos, inclusive relacionados aos momentos e movimentos da Rússia e da China), temos que recordar, também, os movimentos eleitorais, e de possíveis mudanças de governo em países como Inglaterra, França e Estados Unidos, dentre outros, com impacto global; além de situações com vizinhos como Argentina e Venezuela.
E, além das eleições e questões geopolíticas globais, há ainda pontos fundamentalmente econômicos, como as inflações e taxas de juros, por exemplo nos Estados Unidos e no Brasil, a situação fiscal dos dois países e a força de suas economias neste momento.
Na sequência, destacamos que precisam ser consideradas questões regulatórias importantes, como as que se relacionam com mudanças climáticas, como já vemos no hemisfério Norte, notadamente na Europa e nos Estados Unidos, que movimentam novidades legislativas e administrativas, assim como a grande polarização partidária que está tomando conta do globo (e que, infelizmente, de certa forma, afeta decisões ligadas à sustentabilidade e à preocupação ambiental) – que parecem ter “chegado para ficar”.
Essas e outras questões exercem grande influência sobre as economias, as organizações, os investidores, os mercados de capitais, e, no tocante ao tema central deste artigo, as operações de M&A, gerando bastante instabilidade e insegurança, represando bastante algumas decisões de investimento, e levando muitos agentes a preferirem, nesta fase, alocar seus recursos em opções mais seguras.
No caso brasileiro, além de vivermos uma fase de restrição de caixa em muitas organizações, todos sabemos que temos algumas questões adicionais, que tendem a afastar ainda mais alguns investidores, como a proximidade das eleições municipais (que em alguma medida estão antecipando a corrida eleitoral de 2026). A difícil situação de nossa taxa de juros ainda muito alta, mas que dificilmente será bem equacionada enquanto tivermos crescimento baixo, inflação controlada, mas preocupante, e descontrole fiscal – sem contar “tensões entre os poderes”, “ataques ao Banco Central”, e as pressões desses e de outros itens sobre a taxa de juros e o grau de confiança no atual governo e mesmo no País (e em sua capacidade de honrar compromissos).
Ampliando essa rápida reflexão, listamos, também, outras questões extremamente importantes, e seus reflexos na economia e nas decisões de investimento, como as enormes questões climáticas trazidas com as secas na Amazônia e no Pantanal, a catástrofe das enchentes no Rio Grande do Sul, impactos nas safras e em seu escoamento, transição energética, outros desafios ambientais etc. Em função dessas situações, serão muitas as organizações que terão de rever suas operações de M&A e adaptar-se aos novos tempos.
Como resultado, temos uma situação que deve ser pouco confortável para o Brasil nos próximos meses (tanto ao longo do segundo semestre de 2024 quanto, muito provavelmente, ao longo de 2025), o que nos levaria a esperar uma fase bastante calma no tema das fusões e aquisições envolvendo empresas com operações por aqui, mas vemos pontos importantes que podem salvar o mercado; e que estão sendo considerados em operações estratégicas.
Justamente em momentos conturbados em geral aparecem, porém, outros aspectos igualmente importantes para as decisões dos investidores, quais sejam, o preço relativamente baixo de ativos no Brasil, nosso grande mercado consumidor, a posição estratégica do País em alguns segmentos e planos de negócios, nossos recursos naturais, a força da nossa matriz geradora de alimentos, além de oportunidades localizadas como empresas em grandes dificuldades, e, até, em recuperação judicial.
Observamos que além da questão de preços de ativos, diversas organizações trabalham com planejamento e decisões com prazo mais longo, que, por sua vez, as leva a considerar seus investimentos e movimentos em bases mais estruturais e estratégicas, envolvendo uma forte presença no Brasil e na região. Em outros casos, justamente esse conjunto de grandes alterações geopolíticas, regulatórias e legislativas, além de barreiras sanitárias e não sanitárias, bem como embargos e sanções político-econômicas.
Há, também, oportunidades que surgem de situações específicas, como mudança de focos de algumas organizações, mudança de gestão que pode levar a desinvestimento rápido, falta de sucessores, gargalos de suprimentos ou de logística, migração para outros mercados, segmentos etc.
Em outras palavras, apesar de antecipar que tenhamos no próximo período menos operações do que em geral vemos em momentos de economia mais pujante no Brasil, é de se esperar que ocorram várias operações estratégicas, pois muitas empresas devem aproveitar essa fase para identificar oportunidades especiais, além de reorganizar investimentos e estruturas, com vistas a adaptar suas operações e portfólios às novas realidade e demandas (inclusive ligadas à sustentabilidade).
Talvez o mercado de capitais local ainda precise de alguns meses para voltar a se fortalecer, mas as operações de fusões e aquisições, especialmente nas modalidades de “distressed M&A”, e de investimentos estratégicos tendem a ocorrer em ainda maior frequência e magnitude, de forma que devemos trabalhar bastante nesses próximos meses, e idealmente, os mercados se “reorganizem” para que 2025 seja um ano mais quente, com grande protagonismo de empresas brasileiras, inclusive com operações globais. Autor: Leonardo Barém Leite é sócio sênior do escritório Almeida Advogados; presidente da Comissão de Direito Societário, Governança Corporativa e ESG da OAB-SP/Pinheiros.
Com informações da Exclusiva Assessoria de Imprensa 08/08/2024