A situação delicada da economia, em grande parte paralisada por causa das medidas para conter o coronavírus, exige responsabilidades das empresas. Em entrevista ao Valor, o presidente-executivo da BRF, Lorival Luz, disse que não é hora para pressionar os fornecedores e tampouco para aumentar os preços dos itens vendidos às varejistas.

“Neste momento, não é adequado fazer qualquer movimento de pressão ou de parar de comprar [dos fornecedores]. Da mesma forma, não é o momento de aumentar os preços de venda. Uma empresa com o nosso propósito tem uma cultura de solidariedade”, afirmou.

Com uma receita anual de quase R$ 35 bilhões, a dona das marcas Sadia e Perdigão atua em um segmento sensível econômica e socialmente, fornecendo alimentos. No Brasil, a BRF emprega mais de 90 mil funcionários de forma direta. O grupo também tem peso relevante na geração de renda no campo. A companhia conta com 11 mil integrados (avicultores e suinocultores), concentrados principalmente nos Estados da região Sul do país.

Em meio à pandemia, a BRF anunciou ontem compromissos nas comunidades onde atua, como a doação de R$ 50 milhões para ajudar no combate ao coronavírus. Ao funcionários, a empresa também revelou o pagamento do equivalente a R$ 50 por semana (em alimentos ou adicional no vale refeição) aos 60 mil funcionários que estão trabalhando nas unidades de produção ou nas ruas – caso das equipes de venda e de transporte.

A BRF também assegurou que manterá os empregos até maio. De acordo com Luz, o objetivo desse anúncio foi transmitir uma mensagem de tranquilidade aos funcionários. Por ora, maio é o prazo com o qual a empresa consegue ter previsibilidade. Mas ele frisou que não há qualquer intenção de fazer demissões após esse período. Luz tem esperança de que a fase mais crítica da doença seja superada até maio.

Operacionalmente, as agroindústrias processadoras de aves e suínos estão em situação muito melhor do que a média da economia. Na BRF, as fábricas funcionam normalmente. Como precaução, a empresa pediu ao Ministério da Agricultura para que algumas unidades possam atuar em mais turnos ou dias por semana. Além disso, o grupo acelerou “um pouco” o ritmo de produção para ampliar os estoques e garantir o abastecimento, acrescentou Luz.

Com essas medidas, a BRF entende que, se for necessário parar ou reduzir a produção em alguma planta por causa de casos da covid-19, terá ferramentas para manter as atividades e abastecer os clientes. Com o mesmo intuito, a empresa está contratando 2 mil pessoas que poderão substituir funcionários afastados – tanto os que tiverem sintomas do vírus quanto os que estão em casa por serem de grupos de risco.

Financeiramente, a BRF reforçou o caixa para lidar com o período de incertezas. Anteontem, a empresa a anunciou a contratação de linhas de crédito de R$ 1,4 bilhão, com vencimento em um ano. Ao Valor, Luz admitiu que o custo dos empréstimos ficou mais alto depois do coronavírus, mas não revelou a taxa exata da operação. Além disso, sustentou o executivo, as taxas de juros poderão ficar ainda maiores no futuro, o que justifica a prevenção.

Efetivamente, os impactos do coronavírus sobre as vendas da BRF são ínfimos, indicou Luz. No Brasil, o food service (alimentação fora do lar) representa 5% das vendas. Esse segmento foi o que mais sofreu, por causa do fechamento de restaurantes. Porém, a companhia não perdeu volume porque transferiu as vendas para os supermercados.

No exterior, onde a BRF obtém pouco mais de 45% do faturamento – por meio das fábricas fora do Brasil ou de exportações -, o ritmo de vendas segue normal. Ontem, os dados de exportações divulgados pela Secretaria de Comércio Exterior (Secex) reforçaram essa visão. Os embarques de carne de frango e carne suína aumentaram no mês de março. Na comparação com igual intervalo do ano passado, o volume de carne de frango in natura exportada aumentou 2,2%, enquanto os embarques de carne suína cresceram 33%. A BRF é a maior exportadora.

Luz também ressaltou que o ritmo de embarques para a China foi bem no primeiro trimestre. Apesar do coronavírus ter atingido o país asiático no começo do ano, não se pode perder de vista que os chineses continuam dependendo de importações para suprir a escassez de proteína provocada pela epidemia de peste suína africana. O plantel de porcos do país caiu mais de 40% em 2019. Outro elemento potencialmente positivo para as exportações é a proibição às vendas de animais silvestres no mercado chinês.

Perguntado sobre o impacto da forte baixa dos preços internacionais do petróleo sobre a demanda no Oriente Médio, o executivo demonstrou estar otimista. De acordo com ele, esse movimento pode reduzir os subsídio à produção de carnes dos países do Oriente Médio. A BRF lidera as vendas de frango na região do Golfo do Pérsico, mas vem sendo desafiada nos últimos anos pela política de substituição de importações adotada pela Arábia Saudita, importante mercado da empresa.  Fonte: Valor Econômico Autor: Luiz Henrique Mendes.. Leia mais em avisite 02/04/2020