Há seis anos, a Embraer se tornou a primeira empresa brasileira a criar um fundo de corporate venture capital (CVC) para investir em startups do seu setor, em um esforço para estimular a inovação e, lá na frente, incorporar de vez as iniciativas bem-sucedidas.

À frente da empreitada estiveram João Antônio Lopes Filho, CEO do Banco Fator e fundador da PortCapital, gestora responsável por estruturar e gerir o fundo da Embraer, e Sandro Valeri, à época diretor de inovação da fabricante de aeronaves, responsável pela criação da EmbraerX, aceleradora da companhia, e pela concepção do carro voador eVTOL.

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Agora, os dois estão juntos novamente. Mas, dessa vez, como sócios, para tocar uma nova gestora, a Ahead Ventures, que acaba de ser lançada e quer repetir, em outras grandes companhias brasileiras, a experiência que ambos tiveram com a Embraer.

“As empresas estão passando por uma transformação digital e procurando aprender com as startups. Isso passou a ser uma necessidade e o corporate venture capital tem sido um caminho para isso”, afirma Lopes Filho com exclusividade ao NeoFeed.

Valeri concorda: “A necessidade das empresas se somou à maior disponibilidade de empreendedores no mercado brasileiro. Foi a união da oferta com a demanda.”

O negócio, que nasce como uma sociedade entre PortCapital, Banco Fator e com suporte da consultoria de negócios EloGroup, com Valeri à frente da gestora após sua saída da Embraer – já tem um primeiro cliente, uma grande companhia de capital aberto, do setor imobiliário.

O fundo terá R$ 200 milhões à disposição para investir. As primeiras startups ainda não foram definidas. O que se sabe é que deve investir entre oito e 12 ativos e que 80% dos recursos serão destinados a plataformas digitais de imóveis. Uma menor parte será investida em tecnologias de construção.

No momento, a Ahead tem se debruçado sobre cerca de 40 companhias, após uma primeira peneira feita pela EloGroup, que analisou cerca de mil startups.

A exemplo do que foi feito no fundo da Embraer, 15% do dinheiro será aplicado em startups em estágio inicial, com faturamento de zero a R$ 4 milhões por ano. Os outros 85% serão destinados a empresas mais maduras, com receita entre R$ 4 milhões e R$ 200 milhões. Em um fundo com 10 ativos, por exemplo, seriam três em estágio inicial e sete entre as mais avançadas.

Todo o “cartucho” do fundo não será usado na largada. O fundo terá quatro anos para aplicar os recursos e outros quatro anos para realizar os desinvestimentos. “Podemos ir colocando mais dinheiro em uma empresa ou outra, duas ou três vezes, naquelas que tiverem maior sucesso”, diz Lopes Filho.

Uma das regras da Ahead Ventures é que uma empresa não terá mais do que 20% da carteira. Portanto, o teto para aplicação em uma companhia será de R$ 40 milhões. E, nas empresas investidas, as participações deverão ser minoritárias, de 10% a 20%.

“Além de mitigar o risco, a participação minoritária tem o objetivo de não prejudicar o empreendedor, que tem de se manter independente e entusiasmado com o projeto”, diz Lopes Filho.

O ideal, eles dizem, é que as empresas cresçam de tal forma que em algum momento sejam adquiridas pela companhia que criou o fundo. Ou, então, que a participação do fundo seja comprada por um fundo internacional ou um fundo local maior.

“É como se nós fôssemos um time da segunda divisão que forma um Neymar e depois vende para o Barcelona”, compara o CEO do Banco Fator.

O mercado de corporate venture capital tem sido cada vez mais uma alternativa para as grandes empresas no Brasil. Segundo levantamento da Distrito, foram US$ 622 milhões aplicados por fundos desse tipo no primeiro semestre deste ano, mais de três vezes o montante registrado em igual período do ano passado, que alcançou a marca de US$ 198 milhões.

Ainda é um número baixo, se comparado ao mercado de venture capital como um todo. No primeiro semestre deste ano, foram US$ 5,2 bilhões em aportes em startups brasileiras, também segundo a Distrito. O CVC, portanto, teria uma representatividade de 11%.

“É um mercado que deve continuar em aceleração, porque as empresas brasileiras perceberam que quem tem um CVC anda mais rápido”, afirma Gustavo Araújo, CEO da Distrito. “O CVC, para as empresas, é mais uma engrenagem de transformação estratégica do que um instrumento de retorno financeiro.”

De acordo com ele, os setores que mais estão se engajando em iniciativas do tipo no Brasil são os financeiro, de saúde, de varejo e imobiliário – como é o caso da primeira companhia com a qual a Ahead Ventures está trabalhando.

A Via, de varejo, e o Grupo Fleury, de saúde, são duas que contam com fundos de R$ 200 milhões, cada uma, este último em parceria com o Grupo Sabin.

Lá fora, o mercado é ainda mais antigo. Em 2020, nos Estados Unidos, os fundos de CVC representaram 26% das rodadas de aportes, segundo a Global Corporate Venturing. Nomes como Intel, Microsoft e Google estiveram entre as pioneiras no mercado americano.

A Ahead Ventures também não será a primeira gestora especializada no Brasil. Além da própria PortCapital, que atuou no fundo da Embraer, há outros nomes focados no segmento, como Valetec Capital, MSW Capital e Kinea Ventures, do Itaú Unibanco.

Empresas também criam seus próprios braços para investir em startups, como os casos de EDP, com a EDP Ventures, ou o BV, que, além de seu próprio fundo de CVC, aloca recursos em 11 fundos de venture capital.

A Embraer, onde Valeri e Lopes atuaram juntos pela primeira vez, investiu, por exemplo, R$ 2,8 milhões na Motora, startup do Espírito Santo que desenvolveu a tecnologia do Iara, o primeiro carro autônomo do Brasil.

“A Embraer chegou para eles e perguntou: você não quer desenhar o sistema de taxeamento autônomo dos meus aviões e desenvolver o sistema de voo autônomo do carro voador, do Eve, do EVTOL? E foi o que aconteceu”, conta Lopes Filho……Saiba mais em neofeed.09/11/2021