Após um período de seca de ofertas iniciais de ações (IPOs, na sigla em inglês), que já dura mais de um ano, bancos de investimentos começam a fazer projeções e avaliam que o mercado de capitais voltará a ficar mais aquecido a partir de novembro. Uma vez definidas as eleições, independentemente de quem vencer o pleito, as empresas começam a retomar os planos de levantar dinheiro na bolsa brasileira, de acordo com executivos ouvidos pelo Valor.

Embora ainda haja muitas incertezas no mercado, considerando a trajetória de aperto monetário no cenário externo, com juros em alta para combater a inflação, risco de recessão, além do conflito entre Ucrânia e Rússia, os bancos de investimentos veem espaço no país para até 35 operações, entre IPOs e oferta subsequente de ações (“follow-ons”), a partir do ano que vem.

Empresas da economia real, sobretudo as ligadas a infraestrutura e commodities, estão entre as apostas do setor financeiro para que voltem a se financiar via bolsa. Já as companhias mais ligadas à tecnologia deverão demorar mais um tempo para retomar o fluxo de antes da crise das “techs” no mercado.

Nessa cesta, as companhias de saneamento BRK Ambiental e Aegea são duas apostas do mercado financeiro que podem seguir esse caminho, apurou o Valor. A BRK, que tem crescido por meio de aquisições e tentou abrir o capital no início deste ano, poderá retomar seus planos de IPO no ano que vem. O grupo CBO, de embarcações, que tem as gestoras Vinci e Pátria como acionistas, deve seguir o mesmo rumo. O mercado vê a saída dos fundos como um caminho natural.

Bancos veem retomada de IPOs
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Vitor Saraiva, responsável pela área de renda variável do banco de investimento da XP, está entre os executivos mais otimistas em relação à retomada de ofertas a partir de 2023. “Vejo um cenário construtivo no mercado interno, com os dados macro indicando queda da inflação e um PIB que pode chegar a 2% este ano. O Brasil, entre os países emergentes, poderá atrair uma parte do fluxo de capital estrangeiro. Do lado das empresas, a safra de balanços do segundo trimestre indicou melhora de resultados para mais de 70% das companhias”, diz.

Saraiva diz acreditar que uma parte das companhias que fizeram registro na bolsa, mas desistiram da oferta, tem potencial para retomar os planos de IPO. “São 109 empresas que desistiram entre 2020 e 2021”, afirma. Para o executivo, há potencial entre dez e 20 operações, dos quais um terço de IPOs, que poderão ser realizadas já no primeiro semestre do ano que vem.

Daniel Bassan, CEO do UBS BB, afirma que a instituição mapeou pelo menos 30 companhias elegíveis para ir a mercado nos próximos meses, das quais entre dez e 15 com potencial para 2023. Pelo menos quatro são para abertura de capital.

Em uma estimativa preliminar, Roderick Greenlees, diretor do banco de investimentos do Itaú BBA, acredita que o potencial pode até ser maior em 2023: entre 25 e 35 operações de IPOs e “follow-ons”, movimentando entre R$ 60 bilhões e R$ 80 bilhões.

Para Greenlees, as ofertas futuras deverão ter cheques maiores – acima de R$ 1 bilhão, ao contrário do que aconteceu nos últimos dois anos, quando foram registradas captações menores na bolsa. Boa parte das novatas da bolsa segue com forte desvalorização de suas ações.

Já o Citi e o Morgan Stanley preferem não fazer projeções. Marcello Lo Re, chefe de mercado de capitais de renda variável do Morgan, lembra que as operações de IPO e “follow-ons” foram fracas de maneira geral em todo o mundo, incluindo os EUA. “A trajetória de alta dos juros tem inibido os investidores, que estão avessos a risco”, diz.

A retomada das ofertas no mercado americano vai dar o tom para a recuperação do mercado em outros países, segundo o executivo do Morgan Stanley. “É preciso saber também qual o apetite das companhias que buscam transações no mercado.”

Para Eduardo Miras, gestor do banco de investimento do Citi, a retomada do mercado de capitais em 2023 depende de uma série de variáveis, entre elas, movimento mais claro de queda da inflação e o fim do aperto monetário no Brasil e no exterior. Os compromissos do futuro governo com o ajuste fiscal também poderão estimular operações no mercado.

Na Faria Lima, é quase um consenso que 2022 feche sem um IPO, diante das incertezas por conta das eleições. O ano será marcado por “follow-ons” – o mais emblemático foi o da Eletrobras, que movimentou R$ 33,7 bilhões em junho e está entre as maiores operações globais do mercado de capitais deste ano.

A estimativa é que as operações de oferta subsequente de ações movimentem entre R$ 60 bilhões e R$ 65 bilhões neste ano, caso novas ofertas saiam até dezembro.

“Com o terceiro trimestre parado por conta das eleições, as empresas terão um curto período de tempo entre publicação dos resultados de junho a setembro e os documentos que têm de ser enviados à Comissão de Valores Mobiliários [CVM]”, reforça Greenlees.

No ano passado, entre IPOs e follow-ons, houve 76 operações, movimentando quase R$ 130 bilhões. Em 2020, foram 51 ofertas, com R$ 117 bilhões levantados.leia mais em Valor Econômico 05/09/2022