O Tribunal do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) aprovou nesta quarta-feira a compra da Garoto pela Nestlé, colocando fim a um processo que marcou história no direito da concorrência no Brasil e se estende há mais de 21 anos no órgão antitruste, com uma série de desdobramentos na Justiça brasileira.

No acordo aprovado pelos conselheiros do órgão nesta quarta-feira, as empresas se comprometem a encerrar a ação judicial que questiona a deliberação anterior da autarquia. Além disso, outros compromissos foram firmados com o órgão, entre eles a obrigação de não adquirir ativos de concorrentes, por cinco anos, que representem conjuntamente participação de mercado, medida pelo faturamento no ano anterior à cada operação, igual ou superior a 5% do mercado de chocolates.

Por sete anos, as empresas também terão de comunicar ao Cade operações que não necessariamente precisariam ser comunicadas pelos critérios da lei. Pelo mesmo período, também não poderão participar de qualquer ação visando elevar tributos de importação, dificultar o livre comércio internacional de chocolates ou criar barreiras ilícitas que prejudiquem a entrada de novas empresas no mercado.

As empresas também se comprometem a manter investimentos na fábrica da Garoto em Vila Velha (ES). Uma empresa independente vai acompanhar o cumprimento das cláusulas do acordo. Multas foram estabelecidas no caso de descumprimento dos compromissos firmados.

Cade aprova compra da Garoto pela Nestlé e põe fim a processo que se arrasta há mais de 21 anos

Gustavo Bastos, vice-presidente jurídico da Nestlé, disse que há entusiasmo da empresa em encerrar o caso 21 anos depois. “Estou convencido que a solução encaminhada pela Nestlé foi desenhada com muito cuidado e rigor, com fatos e dados técnicos”, defendeu o executivo.

“A solução negociada, e sempre quando possível, é salutar, à medida que diminui custos e riscos inerentes à tramitação judicial, promovendo espaço para estabilizar a insegurança jurídica, antecipando o resultado”, afirmou a procuradora-chefe do Cade, Juliana Domingues, que foi responsável pela condução das negociações com a empresa no âmbito judicial e no próprio Cade. “O Acordo vai minimizar os custos para a máquina pública”, disse. Agora, o acordo será submetido para homologação do Poder Judiciário.

A discussão teve início em 2002, quando a Nestlé comprou a Garoto. Ao fazer isso, a multinacional aumentou sua fatia no mercado de chocolates de 30,8% para 55,2%. A Nestlé alegava que a compra lhe dava 47% do mercado, segundo a Nielsen.

Dois anos depois, a compra foi rejeitada pelo Cade (naquela época, a lei permitia que as operações fossem concretizadas antes da aprovação pelo órgão, o que não é mais possível desde 2011). A Nestlé não aceitou e levou o caso à Justiça e deu início a uma disputa que se estende até os dias de hoje.

Em 2018, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) anulou a decisão da autarquia de 2004. E determinou nova análise pelo órgão regulador. A Nestlé ainda liderava o mercado, mas com 34,1%, de acordo com a Euromonitor International.

Em 2017, a Nestlé chegou a negociar com o Cade, acordando a venda de dez marcas. Mas a venda acabou não se concretizando. A multinacional alegou, na época, que a crise econômica a impedia de fechar o negócio. O caso foi retomado pelo órgão antitruste em 2021, por determinação do TRF1.

A Superintendência-Geral do Cade, no fim de fevereiro deste ano, fez uma nova análise dos principais mercados envolvidos na operação, entre eles o mercado nacional de balas e confeitos sem chocolate, o mercado nacional de achocolatados, o mercado nacional de cobertura de chocolate e o mercado nacional de chocolates em todas as formas. A área técnica do órgão não identificou preocupações concorrenciais que demandassem a reprovação ….. leia mais em Valor econômico 07/06/2023