Seis anos após a sua abertura de capital, o grupo Carrefour teve o seu primeiro prejuízo líquido no intervalo de janeiro a março, e a segunda perda para um trimestre, após efeitos negativos em despesas financeiras para a aquisição do Big. A rede teve que se financiar para pagar a compra da varejista, e esse aumento de dívida, somado com a escalada dos juros, afetou o balanço.

Ainda sentiu despesas com a integração da varejista adquirida (algo que já era aguardado pelo mercado), mas também um impacto no Banco Carrefour relacionado a despesas de aquisição de clientes nas lojas compradas do Big.

No Grupo Carrefour, foram R$ 113 milhões em prejuízo líquido aos acionistas controladores de janeiro a março, versus R$ 370 milhões de lucro um ano antes. Se considerar todos os acionistas, o lucro de R$ 406 milhões virou perda de R$ 112 milhões no primeiro trimestre. O banco teve um recuo de 96% no lucro líquido, de R$ 75 milhões para R$ 3 milhões.

Atrasos acima de 90 dias passaram de 12,3% para 13,2% da carteira de crédito do banco.

Anteriormente, a cadeia já havia tido um prejuízo de abril a junho de 2019, no valor de R$ 427 milhões (pós IRFS 16).

Carrefour tem primeiro prejuízo de janeiro a março desde o IPO

As despesas operacionais, que pela integração dos negócios, naturalmente vem subindo desde o ano passado, cresceu 52%, e a margem ebitda, que mede o lucro após essas despesas, caiu de 6,6% para 4,3%, ao se incluir o Big. Ao se descontar o Big, o índice cai de 6,6% para 6,2%. Havia alguma expectativa de recuo entre analistas em cálculos feitos antes do anúncio.

Há o impacto de lojas novas sendo reabertas num cenário mais complexo, em termos de concorrência e margens, do que se via no setor um ou dois anos atrás”, diz um analista de banco local, após publicação do balanço.

Ontem, em entrevista, o comando reforçou a posição, já mencionada no balanço do fim de 2022, que tratam-se de efeitos temporários, dentro do projeto de crescimento do grupo, e a rede espera terminar todas as conversões de unidades do Big até o fim do segundo trimestre, para retomar aceleração margem com ganhos de escala. “Ao fim de junho, teremos todas as 124 lojas do Big convertidas, seis meses antes do planejado”, disse o CEO Stéphane Maquaire.

Equipes de análise e investidores tinham identificado sinais de alerta após a publicação dos dados de vendas, apresentados no dia 24 de abril, quando a varejista relatou concorrência mais forte e queda da inflação afetando vendas (reajustes de preços aceleram receita nominal). Por isso, o mercado passou a projetar lucros menores e margens mais comprimidas.

Como informado no dia 24, a receita líquida avançou 30,7% para, R$ 27,1 bilhões (incluindo Big). As vendas “mesmas lojas” que não consideram a empresa comprada, subiram 5,7% (sem postos de combustível e sem efeito calendário).

Sobre o primeiro prejuízo no início do ano, Eric Alencar, vice-presidente de finanças, disse que o número tem que ser visto como “um investimento da empresa em seu futuro”, já que há efeito de Big dentro das despesas operacionais. Ele não fez projeções sobre retomada das margens da companhia.

Um gestor ouvido na noite de ontem afirma que há certa tolerância do mercado a esse processo de integração e seus efeitos nos resultados. “Isso deve durar uns meses, mas após a segunda metade do ano, é de se esperar que Big vá pensando menos nesse índice”, disse.

Alencar ainda disse que ainda existe, nos números, uma “pequena influência” da operação do banco com a provisão por causa da inadimplência (atrasos maiores especialmente acima de 90 dias). “E ainda estamos financiando o Big com dívida adicional que pressiona o lucro, mas esperamos desalavancar após a metade do ano quando esses investimentos se desaceleraram”.

Nesse cenário de crédito caro ao consumidor e inadimplência maior em certas faixas (ela caiu basicamente para atrasos acima de 30 dias), a companhia continua com uma abordagem de crédito mais conservadora, nesse ambiente macro “altamente volátil”, diz em seu material de resultados.

Sobre os níveis de alavancagem, a dívida líquida do grupo (já descontado caixa) atingiu R$ 13,8 bilhões — ou R$ 20,3 bilhões incluindo arrendamento e desconto de recebíveis. Isso equivale a um aumento de R$ 7,5 bilhões e de R$ 10,8 bilhões, respectivamente. A relação entre dívida líquida e ebitda quase dobrou, alcançando 2,44 vezes no trimestre, com pressão do aumento do valor da dívida em si captada pela rede e dos juros… leia mais em Valor Econômico 02/05/2023