Os estrangeiros interromperam em dezembro o movimento de realização de lucros que vinham promovendo e voltaram a comprar ações. Depois de dois meses de retirada expressiva, o investidor não residente colocou, em termos líquidos, R$ 3,6 bilhões na bolsa brasileira, resultado de R$ 85,3 bilhões em aplicações e R$ 81,6 bilhões em vendas. Com a recuperação em dezembro, os ingressos de recursos externos somaram R$ 13,3 bilhões no ano.

A atuação do estrangeiro contribuiu para a alta do Ibovespa tanto no ano de 2017, intervalo em que o índice subiu cerca de 27%, quanto em dezembro, quando o ganho foi de 6,2%. E deve continuar dando suporte à bolsa na busca por novos recordes neste ano.

É o que começa a se desenhar neste início de 2018, em que o índice renovou as máximas históricas nos dois primeiros pregões, na esteira de um ambiente mais favorável a ativos de risco no exterior e de um maior otimismo com a economia local. No fechamento de ontem, a bolsa teve uma pequena alta, de 0,13%, mas suficiente para levá-la a um novo recorde, de 77.995 pontos. No intradia, a máxima histórica também foi renovada, ao alcançar 78.414 pontos.

Para especialistas ouvidos pelo Valor, a volta do estrangeiro acompanha o “boom” das ofertas iniciais de ações (IPOs, na sigla em inglês) em dezembro, entre eles a da gigante BR Distribuidora, mas também reflete um reposicionamento para iniciar 2018, um ano que ainda reserva importante valorização para a bolsa devido à queda dos juros e da inflação e ao crescimento dos resultados das empresas. Em 15 de dezembro, quando as ações da BR tiveram sua estreia na bolsa, os estrangeiros colocaram R$ 974 milhões em um único dia.

Segundo os analistas, embora as eleições adicionem volatilidade importante no segundo semestre e o andamento da reforma da Previdência seja relevante para a tomada de investimento, o Brasil ainda oferece oportunidades boas em relação a outros emergentes e conta com fundamentos que não podem ser descartados, mesmo com a turbulência no campo político.

Analistas já haviam notado que as recentes saídas de recursos acompanharam, em primeiro lugar, a tentativa do investidor de embolsar lucros depois de um ano de forte alta. Em 2017, o mês com entrada de recursos mais significativa foi janeiro, quando o otimismo com a recuperação das empresas levou o estrangeiro a colocar R$ 6,2 bilhões em bolsa.

Ao longo do ano, porém, alguns eventos ofuscaram o que parecia ser um movimento de recuperação dado. O primeiro foi o episódio, em maio, do vazamento da delação dos controladores da JBS, que jogou dúvidas sobre a continuidade do governo de Michel Temer.

Em outubro e novembro, que registraram saídas expressivas, de R$ 1,8 bilhão e R$ 3,2 bilhões, respectivamente, o período foi marcado por incertezas a respeito do rumo da reforma da Previdência, que motivaram realização de lucros pelos estrangeiros.

Além disso, a reforma tributária de Donald Trump nos Estados Unidos inspirou cuidado maior quanto aos emergentes, já que o pacote de mudanças é considerado inflacionário e poderia causar um aumento maior de juros no país – causando eventual enxugamento da liquidez nos mercados globais.

“Tivemos um solavanco em outubro e novembro com os receios acerca da reforma da Previdência, mas o mundo está crescendo e isso deve continuar em 2018, incluindo o Brasil. Então a tendência de entrada de recursos estrangeiros deve continuar”, afirma Marcelo Faria, gestor de fundos de renda variável da Porto Seguro Investimentos.

Segundo ele, a economia brasileira está “razoavelmente ancorada” a despeito das preocupações com o lado fiscal. Por isso, um eventual rebaixamento do rating do Brasil teria um efeito negativo no curtíssimo prazo, mas, do ponto do vista do estrangeiro, o reflexo é limitado. “O investidor que quer comprar Brasil já está se realocando, não está esperando ficar barato para comprar. O Brasil não está caro”, diz.

Na leitura de Faria, uma eventual não aprovação da reforma da Previdência é algo que “já está nos preços” e, por isso, passando alguma mudança em uma primeira votação neste ano, isso poderia estimular ainda mais a entrada de recursos em bolsa. “Enquanto tiver crescimento aqui, as chances de vermos os estrangeiros interessados em nós é crescente”, acrescenta.

Para Frederico Sampaio, diretor de renda variável da gestora Franklin Templeton, vale enfatizar o fato de que a retomada da participação estrangeira em dezembro contou com a interferência dos IPOs. Mas, pondera, ainda assim a expectativa é que o fluxo siga positivo – seja porque as aberturas de capital devem continuar no primeiro semestre do ano, seja porque o Brasil ainda é um lugar de oportunidades de investimento.

“Temos uma incerteza enorme quanto à eleição, mas a percepção dos estrangeiros é que, independentemente de quem seja eleito, será obrigatório conduzir reformas para o país não sair dos trilhos”, afirma Sampaio.

Ele comenta que, após uma escalada do Ibovespa até outubro, que acompanhou fortes ingressos de recursos do exterior, a ausência de novos catalisadores advindos da frente política acabou estimulando a realização de lucros. Agora, diversas casas voltam a montar posições para continuar surfando as expectativas positivas para o ambiente de negócios neste ano.

Além do ruído eleitoral, o mercado local também deverá contar com entradas de recursos de fora à medida que o cenário externo também não represente ameaças. Para os analistas, tanto a reforma tributária americana quanto as altas de juros americanos em 2018 já estão nos preços, mas podem inspirar saídas de recursos caso o ambiente para emergentes se reverta ao longo do ano. Por enquanto, a janela de entrada de recursos está aberta.

“Mesmo em caso de um rebaixamento [do Brasil], a situação fiscal brasileira já é preocupante e não será uma decisão desse tipo que mudará ou piorará a leitura. Mas a agenda de reformas precisa continuar para manter o fôlego dos investimentos, então o tempero dessa percepção virá com as eleições”, diz o diretor Franklin Templeton Fonte:Valor Econômico Leia mais em portal.newsnet 04/01/2017