Quem assistiu à série WeCrashed, White Hot ou The Dropout ou aguarda a estreia de Super Pumped no streaming, pode ter a impressão que endeusar empreendedores ou marcas é um comportamento com dias contados diante de caminhos ou desfechos polêmicos. Uma especialista em marcas no Vale do Silício garante que não.

“Muita coisa pode ter mudado ao longo dos anos no Vale, mas o que não muda é que os fundadores são colocados em pedestais e suas falhas são perdoadas muito facilmente. Nós fazemos isso e eles acreditam”, disse Daver ao Pipeline. “Casos como da Theranos, do Uber e do WeWork não mudam essa realidade porque a narrativa sobre pessoas continua sendo inspiradora e fundamental para vender uma marca. Nesse sentido, quando vejo Mad Men, noto que não mudou o jeito que vendemos coisas.”

Daver se tornou uma referência em marketing no universo de tecnologia e inovação americano. Já foi chefe da área na Sun Microsystems, na Google Ventures e Udacity. Atualmente é a chefe de marketing da gestora de venture capital Khosla, um cargo incomum nesse mercado, responsável por cuidar das marcas do portfólio de investidas e por algumas dezenas de gestões de crise.

O que ela já viu diversas vezes em companhias de tech é que se dá pouco crédito ao segundo executivo na linha de comando e que muitas vezes é quem toca o barco diante da intempestividade do fundador ou de sua função mais estratégica e menos operacional. Daver participou do evento Brazil at Silicon Valley, na Califórnia, no início da semana e conduziu uma conversa com Eric Schimdt, ex-CEO do Google e ex-diretor de tecnologia da Sun Microsystems, a quem toma de exemplo.

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Fundadores em pedestais

“Posso argumentar que o Eric tem muito a ver com o sucesso da Sun, mas ele nunca ganha crédito por isso. Ele ganha crédito pelo trabalho que fez no Google, mas no fim a visão e mérito são atribuídos aos fundadores Larry e Sergey”, compara. Schmidt liderou o desenvolvimento da plataforma Java, na Sun – comprada pela Oracle.

Como a história do empreendedor é basicamente o que uma empresa tem em seus primeiros anos “e porque, afinal, somos humanos e nos apaixonamos por pessoas”, Daver diz que essas narrativas continuarão a base de construção das marcas nesse universo. Mas, quanto mais super poderoso o empreendedor se sentir, menos atento às próprias falhas estará, emenda a especialista;

Se a narrativa da inspiração não muda, a diferença é o tipo de valor que gera essa inspiração e engajamento. As empresas passaram a ter que se posicionar, por exemplo, sobre a guerra na Ucrânia, o que faz pela igualdade racial ou que atitude tomou na pandemia. “No passado, os CEOs achavam que não tinham nada a ver com isso, não tinham que se meter com política e uma marca não media seu impacto nesse sentido. Abercrombie e Victoria’s Secret são exemplos claros disso, são marcas que não cabem na sociedade atual com a mesma abordagem com que cresceram”, avalia. “Olho para essas marcas e penso: nós fizemos isso?”

Com maior sensibilidade sobre diversos temas, algumas crises serão inevitáveis na jornada corporativa – especialmente diante do público jovem, mais engajado e cada vez menos fiel a marcas. Por isso, o que importa é como lidar com esses eventos. “Primeiro, a empresa precisa reconhecer o problema, então agir rápido internamente, se comunicando com os funcionários, e depois agir externamente. Eu diria que a maior dificuldade das empresas é com a primeira parte: CEOs resistem a reconhecer que têm um problema.”

Ela cita como exemplo positivo o episódio em que a cantora Taylor Swift questionou a ausência de remuneração da Apple para distribuir músicas de artistas, em 2015 — ao invés de bater boca em rede social, o chefe da Apple Music decidiu pagar os artistas e as gravadoras pelas músicas transmitidas durante os 90 dias de teste grátis do aplicativo. Tudo aconteceu em apenas três dias. Também cita o exemplo da …”.. leia mais em Pipeline 22/05/2022