O ano de 2022 vai ficar marcado pela quebra de recordes seguidos de investimento em venture capital. Depois da euforia de 2020 e 2021, impulsionada por políticas de estímulo governamentais para combater a crise que se desenhava com a Covid-19, percebemos uma queda considerável no apetite dos investidores, impulsionada pela alta dos juros no Brasil e no exterior. Em comparação com 2021, ao longo deste ano teve 148 menos rodadas de investimento, o que representa US$ 4 milhões a menos no capital aportado nas startups.

O cenário é diferente, porém, quando olhamos para o mercado de M&As, ou fusões e aquisições, o volume foi recorde nos primeiros seis meses de 2022. Onde foram realizadas 807 transações de fusões e aquisições no país, contra 706 negócios fechados no mesmo período de 2021, em um ano em que houve recorde de 1.659 operações, conforme a pesquisa da PwC Brasil. No âmbito global, 2022 pode estar a caminho de atingir US$ 4,7 trilhões em valor de negócios até o fim do ano.

Apesar dessa mudança de apetite também causar um determinado impacto, o interesse na aquisição de empresas e novos negócios é muito mais resiliente se comparado ao investimento de risco, pois, o seu fundamento, se desenha na fronteira entre o mercado tradicional e os mercados de tecnologia e software.

O M&A permite a uma grande corporação da economia real, com capacidade de geração de capital, capturar o valor de tecnologia, inovação e geração de agilidade, aproveitando sua estrutura e alcance, quando traz outras startups para dentro da companhia.

Apesar de o setor financeiro ter sido responsável pelas transações mais volumosas desse período, como, por exemplo, o Itaú Unibanco adquirindo 11,3% da XP por R$ 7,9 bilhões, e a gestora americana GQG Partners comprando 5,23% das ações do Itaú, em uma operação de R$ 5,9 bilhões, o segmento realizou apenas 76 operações, ou 9,42% do total. Entre janeiro e junho foi o setor de tecnologia que realizou o maior número de operações (360), conquistando cerca de 45,72% da totalidade de M&As.

Em 2023 o apetite por compras de empresas de tecnologia deve crescer ainda mais, pois as dores que as corporações compradoras buscam resolver com aquisições estão geralmente atreladas ao seu core business e atuação na economia real.

Quando vemos, por exemplo, a B3 (B3SA3), empresa responsável pela bolsa de valores brasileira, anunciando a aquisição da Neurotech, companhia especializada na criação de sistemas e soluções de inteligência artificial, machine learning e big data, percebemos que apesar do risco assumido, o problema que ela está solucionando tem valor intrínseco, mesmo que o mercado suba ou caia nos meses seguintes. Adquirindo a empresa, ela busca a diversificação do negócio de dados e analytics, como complementação da oferta de soluções de dados nas verticais de crédito, riscos e seguros.

Para finalizar, olhando o ponto de vista do empreendedor da startup que busca realizar o M&A, antes de pensar na venda de seu negócio é necessário ter um nível de governança e organização que permita que outra startup, grande corporação e/ou empresa de capital aberto converse com você.

Alguns pilares como organização tributária, regime societário e outros detalhes podem atrapalhar certas negociações. Por isso, é preciso organizar a casa antes de pensar nesse tipo de estratégia. Só para citar alguns pontos-chave:

  • – Ter os aspectos gerenciais, operacionais, contábeis, fiscais, trabalhistas organizados;
  • – Mapear as contingências mais relevantes antes da negociação;
  • – Alinhamento prévio entre os founders sobre o que significa sucesso num possível evento de liquidez;
  • – Ter o IAP (Ideal Acquirer Profile), tanto do ponto de vista de fit de produto quanto de cultura;
  • – Definir o posicionamento da startup no mercado e não só o do produto;
  • – Mapear e analisar a cadeia de valor da startup, levantando hipóteses de sinergias para cada elo;
  • – Ser responsivo e prezar pela qualidade das interações com o IAP. No caso ativo, seguir um processo competitivo com prazos claros;
  • – Gerenciar o processo do evento de liquidez sem prejudicar o desempenho da startup…

Autor Pedro Carneiro é partner e diretor de Investimentos na ACE Startups saiba mais em Terra 14/12/2022