Quem é o gigante espanhol do private equity que chegou para abocanhar empresas de médio porte no Brasil e na América Latina.

 Ao sentar-se para almoçar no restaurante Rubaiyat de Madri em maio passado, o executivo espanhol Javier Loizaga esperava degustar uma boa carne. Ao levantar-se da mesa, ele estava convencido de que tinha encontrado um bom restaurante e também uma empresa promissora. “O Rubaiyat é um caso raro de companhia que opera em um mercado sofisticado e cujo modelo de negócios é replicável”, diz. Pouco mais de um ano depois, Loizaga comprava 70% do negócio, por R$ 115 milhões. Anunciado no fim de julho, o investimento é a face mais visível do fundo de private equity espanhol Mercapital no Brasil. No que depender do executivo, por enquanto. “Estamos negociando a compra da participação da Camargo Corrêa na tecelagem Tavex, e temos outras três tratativas avançadas”, diz ele.

 “O Brasil é hoje o principal destino do Mercapital fora da Espanha.” Pouco conhecido por aqui, o fundo é o maior administrador privado espanhol de private equity, com um patrimônio total de € 1,7 bilhão, ou R$ 4,3 bilhões. Seu foco são as empresas de médio porte, com faturamentos entre R$ 150 milhões e R$ 750 milhões, com boas perspectivas de crescimento. Nada muito diferente de vários administradores de capital de risco, mas, no caso do Mercapital, há um trunfo geográfico. “Olhamos para empresas espanholas capazes de crescer internacionalmente, e a América Latina é a região preferencial para isso”, diz o executivo. A explicação é simples. Há muitas companhias médias espanholas que podem oferecer bons produtos.

 Seu problema é o país onde vivem. Com índices de desemprego em assustadores 26,4% e vergada por uma crise que pode forçá-la a abandonar a moeda única europeia, a Espanha é hoje um ambiente inóspito para os negócios. Pior, as expectativas são muito ruins. Uma pesquisa do instituto de pesquisa privado Centro de Investigaciones Sociológicos mostra que 89% dos espanhóis está preocupado com seu emprego e 40% deles espera que a situação vá piorar nos próximos meses. Daí a necessidade de buscar negócios além-fronteiras. “Os empresários espanhóis estão mirando no exemplo alemão”, diz Loizada. Segundo ele, a Alemanha tem circunavegado a crise porque muitas empresas, mesmo pequenas, conseguem exportar para a Europa, os Estados Unidos e a Ásia.

 Fundado em 1985, o fundo anunciou, em julho passado, uma fusão com o também espanhol n+1. A companhia resultante investe em 26 empresas na Espanha, em Portugal, no México, no Brasil e na Colômbia. Os nomes são pouco conhecidos fora dos mercados locais. Por aqui, além do Rubaiyat, a Mercapital controla a carioca Usimeca, fabricante de caminhões para transporte de concreto e também de caminhões de lixo. O investimento na Usimeca é uma boa demonstração da estratégia da Mercapital. A aplicação foi feita por meio da espanhola Ros Roca, que atua na Europa e na América Latina no manejo de resíduos sólidos. “Usamos a rede de contatos da Ros Roca para prospectar negócios para a Usimeca”, diz Loizaga. A ideia é reproduzir esse modelo.

 Quem conhece o mercado diz que a estratégia faz sentido. “A primeira onda de investimentos de private equity foi destinada às grandes companhias de capital fechado, mais seguras”, diz o gestor de private equity paulista e investidor-anjo Fernando Okumura. Segundo ele, há alguns anos o Brasil ainda era considerado um país arriscado pelos investidores de longo prazo devido às incertezas da economia. Assim, quem investia procurava compensar o risco do país apostando na solidez da empresa. Atualmente, com regras mais estáveis e acesso farto ao capital internacional, o país está mais seguro, o que permite aos gestores investir em empresas menos garantidas, mas com maior potencial de valorização.

 Esse é o caso das churrascarias, não só o Rubaiyat, como também o Fogo de Chão. Em maio, a GP Investimentos lucrou US$ 95 milhões ao vender uma fatia da rede de churrascarias para o fundo americano Thomas H. Lee Partners por US$ 400 milhões. “Hoje a imagem do churrasco deixou de ser argentina e tornou-se brasileira”, diz Belarmino Iglesias Filho, descendente do fundador do Rubaiyat, o espanhol Belarmino Iglesias. Com o aporte de recursos, diz ele, sua meta é ampliar a rede dos atuais cinco para 15 restaurantes até 2017, expandindo o faturamento de R$ 100 milhões para R$ 250 milhões. Tudo isso com a ajuda do Mercapital. “Esperávamos inaugurar uma casa no México apenas em 2013, mas com os contatos deles, nós antecipamos isso em quase um ano”, diz Iglesias.

 Loizaga não foi o primeiro gestor a aproximar-se do Rubaiyat para pedir mais do que um churrasco bem preparado. Pelo menos quatro gestores de fundos de private equity foram conversar com a família. Todos tropeçaram ao tratar apenas com números o negócio de sua vida. “Um deles perguntou a meu pai como o Rubaiyat ficaria sem ele”, diz Iglesias Filho. “A reunião acabou ali.” Já Loizaga garantiu a permanência da família. “O private equity tem de ir além dos números”, diz ele. “Do outro lado do balcão está um empresário que dedicou a vida a construir um negócio, por isso é preciso tato para conversar.” Essa será a receita para engordar, bocado a bocado, o cardápio da Mercapital por aqui.
Por Cláudio GRADILONE
Fonte: Isto é Dinheiro – 13/08/2012