O mercado de venture capital deve continuar muito difícil neste trimestre e, no próximo, as startups “talvez” comecem a ver uma melhora no cenário de investimentos do Brasil e da América Latina.

Isso é o que pensam Guilherme Penna, partner do Global Founders Capital (GFC) e investidor do fundo Silence, e Romero Rodrigues, conhecido por ter fundado o Buscapé e ser sócio da Redpoint eventures, da XP Inc. e da gestora Headline.

Os dois participaram de um painel sobre o tema no Startup Summit, evento que aconteceu em Florianópolis em agosto.

“Mas não esperem a mesma festa de 2020 e 2021. Não achem que vai ser a mesma coisa. Vai continuar difícil de captar dinheiro, mas menos burocrático, menos moroso. A gente tem muitos fundos que estão no banho maria e eu acho que isso tende a mudar”, acredita Penna.

Segundo o investidor, houve uma fase em que muitos fundos estrangeiros começaram a investir na região e, depois, eles sumiram do radar.

“Lá atrás, a gente tinha basicamente quatro fundos. Hoje em dia, são oitenta, setenta fundos brasileiros. Muito fundo gringo também, já com escritório com pessoas, acho que esses fundos não vão sair. Então ficou mais longo o processo, mas tem muito capital ainda para ser alocado na América Latina”, acredita Penna.

Captações devem ficar “menos difíceis”
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MOMENTO ATUAL

Rodrigues explica que muitos fundos alocaram capital em 2020 e 2021 e ainda precisam entender o que vai acontecer com aquela parte do portfólio. Por isso, muitas vezes não podem usar o resto dos recursos.

“Esse comportamento do investidor ‘sentar’ mais em cima do dinheiro vem muito disso. Primeiro, do medo de precisar do capital para salvar as empresas investidas com um valuation muito mais alto. Em segundo, o receio de alocar o fundo todo muito rápido e não conseguir captar um novo fundo, dado que as taxas de juros estão altas. Isso tem tornado o mercado menos líquido e investidores, mais seletivos”, explica Rodrigues.

Para Penna, a captação de investimentos está difícil para todos os empreendedores, considerando que ainda há muita incerteza na bolsa com as saídas e é natural que isso cascateie para o early stage.

As empresas com maior dificuldades, no entanto, são aquelas que adotaram estratégias de crescimento a qualquer custo. Nesses casos, os negócios ofereceram seus produtos de graça ou venderam ele abaixo do preço para dominar um mercado.

“Esse tipo de empresa tem sido muito penalizada pelos investidores, elas perderam muito e isso é até um pouco injusto. Olhando para dois anos atrás, os fundos estavam incentivando esse comportamento e tudo mudou muito rápido”, relembra Penna.

Por outro lado, atualmente os negócios priorizados pelos investidores são aqueles com times mais enxutos, modelos em que a distribuição seja mais barata e a monetização, mais rápida.

A procura maior é por modelos que sejam mais eficientes em capital, tenham recorrência e tragam maior tranquilidade no modelamento das receitas. Exemplos são as empresas de software, fintechs B2B e climatechs.

“Sobre inteligência artificial, todo mundo tem falado muita coisa. Pessoalmente, para a América Latina, eu ainda sou reticente, mas eu tenho visto muita coisa acontecendo nos Estados Unidos e na Europa. Então, obviamente, é um mercado super quente”, ressalta Penna.

COMO TER MAIS CHANCES?

Para facilitar a busca por investimentos, Penna recomenda que as startups resumam da forma mais simples possível aquilo que elas fazem para facilitar o entendimento.

“Eu, como investidor, acabo vendo entre oito e dez pitches ou PowerPoints por dia. Grande parte desses pitches tendem a ser técnicos ou difíceis para entender o que de fato a empresa faz. Os founders querem rebuscar para se diferenciar, mas o melhor é fazer o pitch como se eu fosse um cliente, evitar termos muito técnicos. Isso eu deixo para uma segunda ou terceira conversa”, orienta Penna.

Outra dica é evitar o uso de expressões da moda, como é o caso da IA no momento, se a empresa não estiver realmente desenvolvendo aquele tipo de produto.

“O que vocês estão fazendo realmente é AI? Você está lá com o modelo de dados, rodando algoritmo de AI ou você consulta o API do chat GPT? Usar AI como um processo, todo mundo vai usar. Vamos supor que o investidor entendeu que você é uma empresa de AI e, na hora que ele abre o capô, não tem nada de AI. Você perde o mais importante, que é a confiança, o canal aberto”, alerta Rodrigues.

Para o investidor, a velha receita de usar referências como “o Uber de não sei o que” pode parecer bobo, mas funciona.

“Todo investidor de VC tem déficit de atenção, inclusive eu. Então não ache que ele vai escutar sessenta minutos. Rapidamente você perdeu ele, ele já está pensando em mil coisas, com três trâmites para assinar, pensando como é que ele vai negociar outra cláusula”, acrescenta Rodrigues.

Na hora de analisar um investimento, o fundamental para Rodrigues é que a empresa tenha um time muito bom e um mercado grande para que, se ela der certo, possa pagar o fundo inteiro de volta. Além disso, pontos importantes são a retenção de clientes e de receita.

“Em todas as empresas, investimos com um produto no ar e todas mudaram de modelos de negócio depois. A Gympass era passe diário B2C. A Creditas enviava o lead, ela não resolvia, ela não era verticalizada. E a mesma coisa a Pismo, que fazia cartão de saúde e a gente investiu já com a visão de ir pro mercado financeiro”, exemplifica Rodrigues.

O empresário destaca, ainda, que a busca por um investidor não se trata de uma transação, mas de uma relação muitas vezes mais longa que um casamento, com convivência de muitas horas por dia por anos.

“Escolha o investidor que vai gerar mais valor para você, em vez do que está pagando o maior valuation. E faça diligência, vai perguntar para outros empreendedores que receberam dinheiro daquele investidor como foi o dia a dia, como foi depois. É uma transação muito importante. É melhor não levantar do que levantar errado”,….. leia mais em Baguete 04/09/2023