Aprimorar os critérios para avaliação do passivo de uma empresa nos casos de fusão e/ou aquisição, bem como nos casos de recuperação judicial, pode significar a diferença entre obter lucro ou sofrer um prejuízo no negócio

Ninguém pode negar que o Brasil possui atrativos ímpares para atrair investidores interessados nos mais variados ramos de negócio. Portanto, causa surpresa a existência de evidente descompasso entre o que mereceríamos receber e o que efetivamente é investido no País. O sistema tributário complexo, arcaico e redundante, a falta de investimentos em infraestrutura (rodovias, ferrovias, portos, etc.) e a corrupção política, são frequentemente citados como fatores capazes de afugentar os investidores. Entretanto, no atual momento, talvez a legislação trabalhista anacrônica e desatualizada e um judiciário ainda eivado do ranço extremamente protecionista ao trabalhador vigente na segunda metade do século passado, devam figurar como principais causas do problema.

É preciso ter em mente que antes de tudo, o investidor quer segurança quando realiza negócios. Para isso é indispensável que antes de investir, ele não só conheça perfeitamente a saúde econômica atual, mas também possa projetar a viabilidade financeira futura da empresa alvo, o que se faz não só identificando precisamente os seus ativos, mas também, determinando com grande minudência o seu passivo, pois caso a avaliação seja inconsistente e falha (inferior a realidade), poderia causar significativo desequilíbrio financeiro e contábil para o adquirente. Ocorre que a realidade vem demonstrando que no Brasil, a auditoria que precede a aquisição e/ou incorporação de empresas, conhecida como “Due Diligence”, não consegue retratar adequadamente o chamado “passivo trabalhista oculto”, uma vez que com base nos métodos de avaliação usualmente empregados, as contingências trabalhistas são levadas em conta, apenas quando devidamente conhecidas. Na realidade, modelos empíricos sobre o assunto indicam que o passivo oculto – portanto, não contabilizado – suplanta facilmente o passivo identificado nas auditorias comuns. Quem conhece a legislação trabalhista vigente e a nossa justiça do trabalho, não se espanta com essa conclusão.

O problema é potencializado pela cultura empresarial brasileira que ainda não despertou para a relevância do assunto, e deixa de adotar as tão necessárias ações prevencionistas. É importante ressaltar que o mercado adota alguns mecanismos para minimizar o risco. No caso brasileiro se popularizou como garantia, uma conta bancária na qual fica depositada uma parte do valor da transação, montante este usado para compensar eventuais passivos não contemplados por ocasião da “Due Diligence”, que venham a aflorar após a celebração do contrato. Entretanto dadas as características e dimensões do problema, tal mecanismo é inadequado e, inclusive motivo de atritos entre as partes, já que quem transfere o controle da empresa deseja que o valor retido seja o menor possível, e quem adquire não consegue se resguardar apenas com o valor padronizado pelo mercado, e, pior, não raras vezes o passivo se materializa apenas após o período de vigência da referida conta.

Para um grupo estrangeiro (especialmente asiático), a nossa sistemática legal trabalhista causa muita surpresa e, não poucas vezes, desagrado. Percebe-se que grandes investidores estão ficando preocupados com o assunto e estudam formas de computar esse risco (passivo trabalhista oculto) em sua avaliação (“due diligence”), até porque também traz na esteira, os inevitáveis e significativos custos jurídicos e administrativos. Nesse sentido, a consultoria detentora deste “know-how”, certamente terá o diferencial em relação a qualquer outra atuante na área.

Aliás, é importante ressaltar que o conhecimento técnico no assunto trará possibilidades de negócios não só com quem tem interesse em comprar uma empresa, mas também com quem tem interesse em vender, uma vez que este será compelido a “arrumar a casa” antes de transferir o controle do negócio, sob pena de perder muito dinheiro ou até mesmo não encontrar investidor para a empresa. Quem atua na recuperação de empresas também poderá tirar grande proveito, já que equacionar e administrar o passivo trabalhista de maneira correta, por um lado certamente vai eliminar importante fonte de sangria de recursos, o que é fundamental para permitir o tão esperado soerguimento, fugindo da falência e, por outro, trará a devida segurança para um investidor potencialmente interessado no negócio, aumentando significativamente as chances de recuperação da empresa. Por Flávio Ferreira | Leia mais em administradores 31/07/2014