Quando a Hapvida (HAPV3) estreou na bolsa de valores em 2018, a ação rapidamente se tornou uma das queridinhas de gestores e analistas. O motivo estava no modelo de negócios: a Hapvida é uma operadora de saúde verticalizada com negócios em toda a cadeia de produção, desde o plano de saúde até uma rede própria de atendimento aos beneficiários. Oferecendo os serviços “dentro de casa”, a empresa se torna mais lucrativa e, aos olhos dos investidores, mais atrativa.

A Hapvida mostrou crescimento forte impulsionado por aquisições que aumentaram o negócio. Até janeiro de 2021, data da máxima histórica da ação, o papel registrava avanço de quase 220% em comparação ao IPO. Dois meses depois desse pico, foi anunciada a fusão da empresa com a Intermédica, movimento que coroava o processo de expansão, criando uma gigante do mercado de saúde.

A complementariedade era clara. Enquanto a Hapvida era forte no Nordeste, a Intermédica atuava no Sudeste. A combinação das duas trazia a possibilidade da criação de um plano de saúde nacional – ápice de negócios no mercado de operadoras de saúde.

Os cálculos iniciais apontavam que o novo negócio valeria em torno de R$ 100 bilhões, número que encheu os olhos dos investidores. Pouco mais de um ano depois, a empresa combinada vale R$ 37 bilhões.

Hapvida (HAPV3) e Intermédica

Desafio nas sinergias

Em uma fusão tão grande quanto a de Hapvida e Intermédica, uma das maiores expectativas do mercado é a chamada “sinergia de custos. A união das empresas permite cortes em áreas duplicadas, como área de relação com investidores ou mesmo da própria administração. Mas não foi o que aconteceu nesse caso — ao menos não da forma que o mercado esperava.

“O primeiro benefício de uma fusão deste porte é o corte de pessoal, mas a companhia manteve muito da estrutura das duas empresas. Isso acarreta em despesas com salário, time, retenção. Impacta a sinergia de custos, tanto que os resultados desde a fusão foram muito prejudicados”, diz um gestor que prefere não se identificar.

A companhia apresentou os números da Intermédica apenas para os meses de fevereiro e março, a partir da integração das empresas. A falta de dados para janeiro prejudicou a base de comparação, aumentando a desconfiança com os potenciais ganhos da combinação de negócios.

Cenário macro difícil

Com a sinergia de custos prejudicada, a responsabilidade de alavancar a fusão fica com os potenciais ganhos de receita. E ela, por sua vez, tem sido derrubada pelo cenário macroeconômico que tem afetado não só a Hapvida, mas todo o setor de saúde.

Os primeiros sinais do contratempo para o setor, antes mesmo do anúncio da união, apareceram em 2020, um ano de despesas médicas (sinistralidade) muito baixo na indústria. Com o isolamento, os clientes preferiram postergar procedimentos eletivos, como cirurgias não urgentes e exames, o que diminuiu os custos das operadoras. No ano seguinte, no entanto, a demanda represada se uniu à alta de internações causadas pela Covid e fez disparar a sinistralidade dos planos de saúde.

As despesas médicas do setor privado subiram 24% em 2021 quando comparadas ao ano anterior, segundo cálculos da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). Os custos foram ainda 19% acima dos níveis pré-pandêmicos de 2019.

E para este ano, o obstáculo ainda permanece. A sinistralidade da Hapvida atingiu 72,9% no primeiro trimestre de 2022, um aumento de 11,8 pontos na comparação anual.

A pandemia também foi responsável pela quebra na cadeia de suprimentos médicos, que encareceu os preços e afetou a indústria. O saldo geral da crise é um movimento de alta inflacionária em todo o mundo, que encarece os produtos, eleva os juros e tira o poder de compra da população.

“O negócio da Hapvida depende da contratação do serviço por parte das famílias, então está completamente associado ao momento macroeconômico. A situação se complica ainda mais considerando que a maioria dos beneficiários da empresa são de baixa renda, população mais afetada pela deterioração da economia”, afirma a dupla de analistas do setor de saúde da Guide Investimentos, Luis Assis e Guilherme Viana.

Crescimento orgânico é chave

Outro desafio da Hapvida é a aquisição e manutenção de clientes. Nos primeiros três meses do ano, a companhia perdeu 64 mil vidas, o equivalente a 0,7% da base.

“Tanto Hapvida quanto Intermédica cresceram ao longo dos anos impulsionadas por aquisições. Agora, no entanto, sem outro grande player para adquirir, esse movimento acabou. E torna a empresa muito mais dependente do crescimento orgânico”, argumentam Lucas Ribeiro, head de renda variável da Kinitro, e Marcelo Ornelas, gestor de ações da mesma gestora.

A dupla acredita que a nova empresa ainda está em processo de acerto das operações das últimas compras. “Hapvida tem crescido abaixo da indústria organicamente porque ainda está se organizando. É um processo que não permite visualizar crescimento no curto e médio prazo. Além disso, crescer de forma orgânica é bem mais difícil”, defendem.

O que esperar de Hapvida (HAPV3) daqui para frente?

Se depois da tempestade vem a bonança, o mercado espera que o momento desafiador para a Hapvida termine com a recuperação dos papéis e do modelo de negócios da Hapvida no longo prazo. “Investimos no IPO e mantivemos posição em Hapvida até a fusão…. leia mais em Exame 30/06/2022