Quando a IP Capital Partners, uma das gestoras de ações mais respeitadas do país e reconhecida pelos investimentos em tecnologia, dedicou um relatório de 33 páginas à web 3.0, os sócios da casa pretendiam fomentar o debate local sobre os riscos que plataformas como Facebook — um dos principais investimentos da gestora — podem correr com as mudanças na arquitetura da internet.

Hoje conseguimos investir em algumas das empresas com os efeitos de rede mais bem estabelecidos do mercado a valuations atrativos (…). O que pode dar errado, então? Se a história nos serve de exemplo, o maior risco para negócios altamente dominantes não deve ser nem macroeconômico nem regulatório, mas tecnológico”.

Se na web 2.0 as plataformas (redes sociais, mas também os marketplaces) se estabeleceram como intermediárias — o que beneficiou os consumidores com os efeitos de rede mas aos poucos deixou de remunerar os desenvolvedores que contribuíram para a formação do ecossistema —, na lógica descentralizada da web 3.0 o monopólio pode estar em risco.

Na prática, programadores e outros criadores de conteúdo podem ser diretamente beneficiados pela arquitetura da web 3.0 — baseado em blockchains —, ficando com tokens que deem direito à valorização da própria rede. No universo cripto, é o que se chama economia da propriedade (ownership economy).

No Brasil, as discussões sobre investidores em web 3.0 ainda estão em fase muito iniciais, mas o debate começa a ganhar corpo, como evidencia o relatório da IP. No mundo do venture capital, os investimentos em startups de cripto já vinham ocorrendo, mas a Valor Capital — a gestora criada pelo ex-embaixador Clifford Sobel — quer levar o ecossistema brasileiro de cripto a outro patamar.

Depois de concluir a captação de US$ 500 milhões — em dois fundos de US$ 250 milhões cada —, a Valor Capital quer deslanchar um programa para investir em negócios de cripto em estágio inicial. Batizada de Crypto Seed Program, a iniciativa prevê aplicar até US$ 1 milhão por startup (cheques pequenos para os padrões da firma).

Na web 3.0 a gestora de Clifford Sobel

“A ideia é fomentar o ecossistema. Há jovens brasileiros sensacionais em muitos dos melhores projetos”, diz Michael Nicklas, sócio da Valor Capital. Na prática, o programa flexibiliza o protocolo da firma para definir um investimentos. “Conseguimos aprovar rápido, com apenas um sócio revisando em questão de dias”, complementa Eduardo Vasconcellos, responsável na gestora pelos investimentos fintechs e cripto.

Ao levantar os US$ 500 milhões, a Valor Capital também chancelou com os investidores a proposta de capital semente para as startups de cripto. A lógica é que, com um programa definido, os cotistas não estranharam que um fundo da casa tenha 60 ativos, ao invés de 30 — um número habitual —, explica Nicklas. “Não vai parecer que estamos desviando do mandato”.

Não há um número específico de startups que critpo que poderão ser apoiadas pelo programa da Valor Capital, mas a ideia é que elas possam ganhar fôlego com o capital semente, desenvolvendo os negócios para se habilitarem a receberem um investimento de uma rodada tradicional da gestora.

O programa definiu cinco eixos de negócios poderão receber investimentos: infraestrutura, finanças descentralizadas, NFTs, Web 3.0 e DAOs — organizações autônoma descentralizada digital, um conceito de negócio com o controle pulverizado e negociado em redes como a da Ethereum.

Numa DAO, é como se a companhia não precisasse da bolsa tradicional para negociar pedaços (tokens) de seu capital e regular a governança. Na prática, a Valor Capital poderá investir diretamente em tokens desses negócios. O limite é 20% dos fundos — acima disso, a gestora precisaria de uma licença diferente para operar com ativos líquidos.

Nas startups de cripto em early stage, a lógica de investimento por tokens é parecido com o mecanismo de uma SAFE (Simple Agreement for Future Equity), modelo de captação que não define valuation na rodada inicial, mas dá aos os investidores o direito de entrar na rodada série A com um desconto. Nas startups que emitem tokens, o mercado já está chamando o modelo de SAFT (Simple Agreement for Future Token), diz ….. leia mais em Pipeline 04/04/2022