As startups são o assunto da vez quando se fala em empreendedorismo no Brasil. A prova disso é a grande exposição midiática que estas sociedades inovadoras têm, como por exemplo nos programas de TV “Shark Tank” (Sony), “O Investidor Anjo” (Rede TV!) e “Planeta Startup” (Band).

Um dos motivos que justificam esta popularidade das startups perante o público certamente são os valores expressivos pelos quais as suas participações societárias são negociadas. Recentemente, um empreendedor conseguiu um aporte de R$ 10 milhões por 50% (cinquenta por cento) do seu negócio, uma indústria de tintas, em um destes programas de TV.

Mas, como estes investidores sabem o real valor da empresa que estão investindo? Ou, em outro cenário, como sabem o valor que devem receber caso queiram se retirar destas empresas?

Antes de responder esta pergunta, é necessário analisar o próprio conceito de startup: é um grupo de pessoas à procura de um modelo de negócios “repetível e escalável”, trabalhando em condições de extrema incerteza.

Ou seja, quando realizado o processo de valoração (valuation) de uma startup, deve-se presumir, por decorrência do próprio conceito acima explorado, que há um grande potencial de escalonamento do negócio.

É impossível realizar um valuation de uma startup simplesmente analisando o seu status atual, sendo necessário levar em consideração a sua capacidade futura de gerar dinheiro.

E é neste momento que há um conflito entre o direito e a realidade.

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Isto porque, o artigo 1.031 do Código Civil afirma que, exceto se disposto em contrário no contrato social da sociedade, o valor da participação do sócio retirante será apurado com base na “situação patrimonial da sociedade, à data da resolução”.

Em outras palavras, o valor será definido com base no valor contábil (ativo menos passivo) da sociedade na data da efetiva retirada, em completa desarmonia com o argumento apresentado anteriormente. O potencial econômico da sociedade não é levado em consideração.

O nome deste método de valuation previsto em lei é o “método patrimonial”.

Naturalmente, o tópico chegou até o Superior Tribunal de Justiça: apesar do artigo 1.031, o método patrimonial é o mais indicado para processos de valuation de startups? Existem alternativas?

E o posicionamento da corte foi claro. No julgamento do Recurso Especial nº 1.335.619-SP, entendeu-se que, nestes casos, é possível utilizar o método do “Fluxo de Caixa Descontado – FCD”, que avalia uma parte do ativo intangível da sociedade, justamente a sua capacidade de geração de caixa.

Na opinião deste que vos escreve, decisão acertada. O método do fluxo de caixa descontado reflete o modelo de negócio “repetível e escalonável” das startups, apresentando um valor mais justo e próximo da realidade financeira da sociedade avaliada, vez que projeta um valor futuro da sociedade e o traz para a data presente.

O que se pode concluir desta breve exposição é que o processo de valuation de sociedades inovadoras ainda é um tema bastante controverso no Brasil, tendo em vista a sua complexidade e contemporaneidade. Será preciso tempo e paciência para que a jurisprudência se torne pacífica.

Sendo assim, apesar da decisão favorável do STJ, é sempre indicado incluir uma cláusula específica nesse sentido no contrato social da sociedade no momento de sua constituição, para trazer maior previsibilidade e robustez à relação entre os sócios.

Esta postura preventiva é especialmente importante quando estamos diante de um estágio inicial de desenvolvimento da sociedade, e de um cenário de profunda incerteza e instabilidade no qual estão inseridas as startups. Por Caio Nunciaroni – advogado especializado na área de Direito Empresarial, Digital e Startups,  Saiba mais em Resumo Cast 12/03/2022