O tema Fusões e Aquisições está em alta. O mercado, bastante aquecido, apresenta muitas transações financeiras, avançando, especialmente, por: estratégias de crescimento inorgânico, falta de sucessores, tendências mercadológicas do segmento, dentre outras. No entanto, tais operações devem ser bem planejadas e executadas a fim de gerarem valor a todos os envolvidos, evitando disputas futuras. Para tanto, conhecer os assuntos mais recorrentes em negociações dessa natureza é fundamental.

Antes de citar exemplos de cases, é válido destacar algumas peculiaridades da área. Em primeiro lugar, o acesso a informações de disputas e julgamentos precedentes é limitado, já que a maioria das transações de Fusões e Aquisições é contratualmente sujeita a procedimentos arbitrais sigilosos para resolução de conflitos, isso quando não resolvidas pela via negocial.

Assim, o conhecimento de precedentes deriva da experiência e, em alguma parte, de poucos antecedentes judiciais, que podem ser análogos ou de foros acadêmicos. No entanto, a previsibilidade quanto ao resultado é menor.

Em segundo lugar, muitos dos conceitos trabalhados em contratos de Fusões e Aquisições são importados. A estrutura e as principais cláusulas negociadas e acordadas no Brasil se assemelham com a prática estrangeira, especialmente a dos Estados Unidos e da Europa. Da perspectiva acadêmica, em geral, é comum aplicar alguns precedentes internacionais junto a regras semelhantes do Direito brasileiro, mas com ressalvas, devendo-se considerar os princípios aplicáveis conforme o foro e a legislação vigente de cada território — alguns países têm cultura mais protetiva e intervencionista, outros são mais obedientes à liberdade contratual e à autonomia da vontade das partes.

Por fim, e talvez mais importante, deve-se ter sempre em mente que muitas disputas podem surgir depois de anos da assinatura dos contratos. Tal fator potencializa os conflitos referentes à interpretação das cláusulas pactuadas. Muitas vezes, as partes não têm mais relacionamento com os mesmos advogados, diretores e outros representantes que participaram das negociações da transação. Com isso, a memória do contexto e da intenção manifestada podem se perder no tempo — uma das razões para o surgimento de contratos bastante extensos.

Quando se analisa alguns dos temas específicos recorrentes em disputas, é fácil identificar a relevância dessas peculiaridades. As cláusulas MAC/MAE (referentes a efeitos adversos relevantes) e as obrigações de melhores esforços, por exemplo, envolvem conceitos importados, sujeitos a diferentes interpretações e pouca jurisprudência nacional.

Outro tema bastante recorrente é o earn out, um mecanismo de complemento de preço atrelado à verificação de resultados futuros da empresa. Negocialmente, essa espécie de ajuste é bastante interessante, pois possibilita ao vendedor receber um preço mais elevado ao mesmo tempo que reduz a exposição do comprador ao risco de não se realizarem as projeções financeiras que serviram de base durante as negociações. Ocorre que, além de possíveis conflitos relacionados à interpretação das regras para a verificação do resultado projetado e do cálculo do preço correspondente, as metas e projeções são estabelecidas com base em diversas premissas, as quais podem ser impactadas por fatores futuros, tanto externos quanto internos.

Em muitas situações, o resultado atrelado ao earn out pode, inclusive, ser afetado por mudanças de estratégia na condução dos negócios. Dificilmente um contrato conseguirá prever todas as variáveis possíveis ao passo que, dificilmente, um comprador (especialmente em caso de aquisição de controle ou da totalidade da empresa) aceitará limitações à sua liberdade de determinar a orientação estratégica dos negócios, pois estas não afetam apenas o earn out como — principalmente — o resultado a ser capturado pelo próprio comprador.

A responsabilidade referente às declarações e garantias prestadas no contrato também merece destaque. Além das costumeiras auditorias (due diligences), as partes, em geral, declaram e garantem as condições em que a empresa se encontra no momento da transação. Tais declarações servem como manifestação de premissas que foram consideradas na decisão pela concretização da transação e definição de preço. Situações que surjam posteriormente e conflitem com as declarações prestadas ou tenham sido omitidas (mesmo que não intencionalmente), podem sujeitar a parte vendedora ao dever de indenizar.

Esses e outros temas relevantes reforçam a importância do cuidado na redação dos instrumentos contratuais em Fusões e Aquisições. A complexidade dessas transações torna impossível a tarefa de antever as situações, mas a clareza e o detalhamento das suas condições são determinantes para a mitigação dos riscos…Por Maurício Maciel, advogado corporativo na Marins Bertoldi Advocacia.. saiba mais em análise 07/04/2022