Não são todas as aquisições e vendas de empresas que culminam em êxito. O insucesso dessas operações muitas vezes é consequência da falta de preparação adequada nas negociações ou a subestimação de aspectos cruciais que devem ser observados. Sabe-se que as reorganizações societárias, decorrente da venda de empresas, no atual estágio da economia mundial, apresentam-se como uma estratégia para auxiliar as corporações a se manterem competitivas no mercado.

A fim de proporcionar conhecimento acerca do assunto, que envolve os processos de incorporação, fusão, cisão e transformação, o trabalho evidencia os aspectos legais e societários, demonstrando os reflexos trazidos por estas operações.

Inclusive, Ian Muniz traça um cenário para justificar que essa reorganização societária não necessariamente parte da premissa da venda da empresa como um todo:

“Muitas empresas, ao longo de sua existência, terminam por desenvolver oportunidades de negócios distintas de sua atividade principal. Pode ocorrer mesmo que, com o passar do tempo, uma determinada empresa desenvolva um negócio alternativo que acabe se tornando a sua melhor atividade, enquanto seu foco anterior se reduza a uma atividade secundária (…). Ocorre que, muitas vezes, a empresa descobre que administrar negócios distintos se torna contraproducente. Acaba por descobrir que não administra da melhor foram o negócio ‘A’ (seus concorrentes o fazem de forma mais competente e lucrativa), e que os recursos financeiros e administrativos nele empregados acabam afetando adversamente seu ‘negócio B’, que é aquele que a empresa sabe administrar de forma competente, lucrativa e mais eficientemente. Evidentemente, a conscientização de tal situação fará com que haja um forte incentivo para que o primeiro seja vendido para terceiros (provavelmente um concorrente), de forma tal que os ingressos financeiros decorrentes de tal operação sejam aplicados naquela atividade em que a empresa é mais eficiente [1].”

Mitigação de riscos

Visando a mitigar possíveis perdas patrimoniais e desgastes, é fundamental conduzir os negócios de forma cautelosa, prezando sempre por uma elaboração personalizada e completa dos documentos, beneficiando tanto o comprador quanto o vendedor.

Mediante a tomada de decisão em vender uma empresa, é crucial que o empreendedor esteja preparado. E isso vai muito além de simplesmente encontrar um comprador. Uma parte fundamental do processo de venda é garantir que todos os aspectos societários da empresa estejam em ordem. Tais detalhes podem não só afetar o valor da empresa, mas também influenciar a atratividade dela para os compradores em potencial.

Deve-se observar elementos (como a posição financeira da empresa, margens, os produtos ou serviços oferecidos, a base de clientes) para buscar sinergias e traçar um perfil da empresa para atrair os negociantes mais interessados.

Busca-se observar os riscos intrínsecos da ação e os possíveis meios de realizar a operação, bem como estipular ajustes contratuais precedentes (ofertas não vinculantes e vinculantes precedidas no acordo de confidencialidade, por exemplo).

Análises indispensáveis

Ao colocar a empresa à venda, é essencial revisar a estrutura atual. Isso inclui examinar algumas características, como, por exemplo, quem compõe o quadro societário e qual a distribuição do capital social entre os sócios. Além disso, é fundamental que haja a análise e revisão dos documentos societários atuais, os quais ditam as regras e condições para que operações de compra e venda sejam efetivamente válidas, excluindo possível questionamento futuro.

Além disso, as negociações de venda devem ser conduzidas mediante uma avaliação precisa da empresa, a qual é essencial para determinar o valor de mercado e estabelecer expectativas realistas para a venda e projeções futuras.

O valuation deve ser feito por especialistas em avaliação de empresas, viabilizando uma análise abrangente da realidade econômica do negócio, além de aspectos relacionados ao passivo e ativo do caixa.

Devem ser considerados aspectos inerentes ao desenvolvimento da respectiva atividade empresarial exercida, principalmente no mercado atual em que muitas vezes os bens e patrimônio propriamente dito não são o ativo mais valioso da empresa e sim a ideia inerente ao negócio em si.

A análise do valuation é importante para compor o valor da empresa, devendo o responsável utilizar de uma metodologia adequada para alcançar o valor mais justo para as partes envolvidas. Existem vários métodos, o que pode acarretar em resultados diferentes, apesar do valuation (estimativa do valor da empresa) ser encarado de forma objetiva [2]. Por isso, a decisão de qual método ser utilizado exige um conhecimento técnico e estratégico, pois o cálculo (método inadequado) poderá colocar fim a uma atividade empresarial de sucesso.

Tributações incidentes

Cumulado a isso, é imprescindível considerar as implicações fiscais da operação, procedendo com um planejamento tributário detalhista e cuidadoso, auxiliando a minimizar a carga tributária e maximizar as vantagens para os envolvidos.

Referido planejamento tributário deve ser realizado com base na análise de responsabilidades legais e fiscais, verificando o cumprimento das normatizações pertinentes e a existência de passivos pendentes a serem solucionados antes da venda. Aliás, referida análise pode culminar na constatação de vantagem em optar por outro tipo de regime tributário, caso seja mais conveniente para a atual realidade da empresa.

Inevitavelmente, para proceder com referidas condutas, os sócios e a empresa devem ser assessorados por profissionais altamente qualificados, viabilizando a execução de uma operação segura e assertiva para todos os envolvidos.

Inicialmente, na etapa de negociação entre vendedor(es) e comprador(es), é fundamental que as partes tenham ampla consciência de todos os seus direitos e deveres, reduzindo a possibilidade de eventual proposta legalmente inviável ou que apresente desvantagens a algum envolvido. Referido discernimento somente poderá ser obtido a partir de uma análise minuciosa de todos os documentos relativos à empresa e à sua operação.

Formalização do contrato preliminar

A partir da conclusão da negociação com a definição das suas principais condições, é necessário que os envolvidos formalizem a transação mediante um contrato preliminar, o qual vai ditar as regras para a execução da operação e, por se tratar de documento particular entre as partes, no que tange as disposições a serem incluídas no contrato, o céu é o limite, inclusive, o rigor de detalhes nas disposições contratuais possibilita maior segurança jurídica na operação.

No contrato preliminar, devem ser estipulados os valores e os prazos para pagamentos, os índices de correção monetária, os prazos para regularizações perante os órgãos públicos competentes, as causas para cancelamento do negócio, as punições na ocorrência de descumprimentos contratuais e as demais condições inegociáveis inerentes à respectiva venda de modo geral. Em suma, todo e qualquer combinado entre as partes pode e deve estar disposto no referido contrato.

A celebração desse contrato é indispensável, uma vez que, a partir deste ponto, as partes interessadas vão entrar em contato com informações sensíveis da empresa a ser negociada. Alguns exemplos de informações sensíveis são as carteiras de clientes e fornecedores, dados gerenciais e contábeis que expõem a situação financeira da empresa, vantagens e desvantagens operacionais, dentre outros elementos que não são abertos ao público.

É relevante constatar que o negócio somente pode ser compreendido e interpretado a partir da conduta das partes, devendo ser analisadas as tendências a partir da economia comportamental. Para Paula Forgioni, a maioria dos seres humanos é excessivamente otimista e acredita que o pior não vai acontecer, ou que são muito maiores as probabilidades de algo desagradável atingir os outros e não a si [3]. Por isso, essa é uma fase que demanda muito zelo.

Alteração do contrato social

Mediante a formalização das condições negociadas, a operação será concretizada mediante a alteração do contrato social da empresa, ocasião a qual os novos sócios passarão a compor o quadro societário e os vendedores serão retirados do mesmo.

Além disso, este é o momento oportuno para que os compradores revisem os termos do contrato social e os adequem de acordo com a nova composição de sócios, viabilizando a conservação da relação societária e empresarial.

Acordo de sócios

Cumulado a isso, deve-se observar, também, se a sociedade possui acordo de sócios, procedendo com a pertinente revisão e adequação do referido documento. Até porque esses documentos podem conter cláusulas que regulam a venda da participação societária, a entrada de novos sócios ou acionistas ou até mesmo a necessidade de aprovação unânime para determinadas decisões.

É comum, em operação de compra e venda de empresas, que hajam pactos acessórios com cláusulas restritivas de direitos, principalmente para o vendedor. Como exemplo, na percuciência de Paula Forgioni:

“Nas compras e vendas que envolvem sociedades comerciais e seu patrimônio, tornou-se bastante usual a aposição de cláusula que estabeleça a obrigação de não reestabelecimento ou de não concorrência, chamada, também, de non compete. Por meio dela, aquele que aliena fica proibido de oferecer concorrência ao comprador, por determinado período de tempo e/ou em certo mercado. Restringe-se, por vontade das partes, a concorrência entre o vendedor e o comprador, reduzindo-se o risco de retorno não satisfatório do investimento. A justificativa é viabilizar a transferência para o novo proprietário da efetiva capacidade de gerar lucros da organização [4].”

Conclusão

Em linhas gerais, ao preparar uma empresa para venda, os aspectos societários desempenham um papel crucial. Garantir que a estrutura societária esteja em ordem, resolver quaisquer pendências e elaborar uma documentação completa e fidedigna com a negociação são procedimentos essenciais para garantir uma transação bem sucedida e com segurança jurídica.

Ao observar referidos aspectos com antecedência e diligência, o empresário garante uma transição segura e estável, bem como uma operação devidamente constituída sob condutas válidas, propiciando tranquilidade financeira, jurídica e emocional..Autores: Maria Eduarda Oliveira Romeiro – advogada no escritório Pádua Faria Advogados  e  Wilton João Caldeira da Silva – advogado no escritório Pádua Faria Advogados.. . leia mais em Conjur 12/03/2024