Após um período de seca no mercado de venture capital (VC) neste ano, 2024 deve marcar uma nova tendência, com aportes em startups em estágios mais iniciais, no que passou a ser considerado o “novo normal” no segmento. Diante da perspectiva de mudança nos indicadores macroeconômicos de Estados Unidos e Brasil — em especial a redução da taxa de juros e acomodação da inflação — deve se desenhar um cenário de mais investimentos em startups no País, mas nada que chegue aos níveis vistos em 2021, quando os números bateram recordes históricos.

Naquele ano, os investimentos de VC somaram R$ 52,2 bilhões no Brasil em 548 rodadas. Houve uma inversão no ano seguinte, com redução do volume e maior número de rounds: R$ 16,9 bilhões e 665, respectivamente, segundo dados da Associação Brasileira de Private Equity e Venture Capital (ABVCAP) em parceria com a TTR Data. Este ano, até o terceiro trimestre, o volume de investimento havia sido de R$ 5 bilhões.

Especialistas afirmam que 2023 serviu como um termômetro para uma nova dinâmica no mercado, com aportes menores e focados em captações seed stage e early stage (etapas de validação de produto e crescimento da empresa), em rounds de investimentos relativamente menores em relação aos anos anteriores, visando recorrência e apostando no longo prazo. Um relatório da plataforma de inovação Distrito publicado em novembro aponta que 74,2% dos investimentos em venture capital na América Latina foram feitos em rounds centrados em seed-stage.

Retomada do venture capital em 2024 deve ter foco em projetos de longo prazo

“Sem deixar de lado que nos últimos meses houve a volta de rodadas expressivas no late-stage, o foco constante nas rodadas iniciantes demonstra e dá sinais de que a aposta está no longo prazo”, diz Eduardo Fuentes, head de research do Distrito na publicação. “Espera-se que 2024 também tenha grandes rodadas nas empresas com ajustes condizentes ao novo normal do mercado.”

O que vem se percebendo, por outro lado, é um aumento nos investimentos em startups late-stage por parte dos fundos de venture capital de empresas, o corporate venture capital (CVC). Leo Monte, Presidente da Associação Brasileira de Corporate Venture Capital (ABCVC), vê que a evolução da maturidade de CVCs dentro das empresas tem levado a uma tendência natural de se buscar startups em estágios mais avançados, com modelos e produtos já validados capazes de surtir efeito em curto prazo.

Apesar de recente, o mercado de CVC cresce no Brasil. Segundo a Global Corporate Venture (GCV), 74% dos fundos desse tipo no País ainda têm menos de três anos de criação, mas apenas nos três primeiros trimestres de 2023 a quantidade de transações que envolvem ao menos um CVC superou o total do ano de 2020, 63 contra 53.

Cada vez mais, a leitura entre analistas é de que a bolha de investimentos em venture capital pela qual o Brasil — e o mundo — passou nos anos de pandemia foi uma “anormalidade”. “O que vimos ali foi uma junção de vários fatores que resultaram justamente naquela curva super acentuada de investimentos. Na minha leitura, não vamos chegar nos mesmos patamares “, diz La Monte.

Àquela altura, em face do medo de uma recessão, governos adotaram políticas fiscais e monetárias mais agressivas, aumentando gastos e reduzindo taxas de juros. Esse movimento, somado a um ambiente de maior demanda por digitalização devido ao isolamento social, fez com que investidores fossem em busca de melhores rentabilidades no mercado de risco e inovação.

“Houve uma inundação de capital na indústria de tecnologia que não ficou apenas nos Estados Unidos, mas em mercados como a América Latina”, aponta Brian Hutchings, sócio do escritório focado em nova economia, Gunderson Dettmer. A firma, com escritórios na Califórnia e em Nova York, dois dos maiores mercados de venture capital nos Estados Unidos, obteve resultados operacionais recorde em 2021 e assistiu a mudança começar a acontecer em 2022, com o aumento da inflação e das taxas de juros nos Estados Unidos. “A escalada rápida dos juros aqui, assim como no Brasil, moveu o dinheiro dos investimentos arriscados em tecnologia para alocações com retorno mais seguro. Isso nos trouxe ao momento em que estamos hoje.”

Agora, o ciclo de corte de juros tanto pelo Federal Reserve (o Banco Central nos Estados Unidos) como pelo Banco Central brasileiro apontam para uma mudança positiva para o mercado, na visão de Hutchings, que pode levar a números mais próximos aos anteriores ao boom de 2021.

Principais setores

No Brasil, startups do setor de serviços financeiros têm sido o principal destaque em captações nos últimos anos e o cenário para elas deve se manter. Neste ano, até o mês de novembro, as empresas desse setor captaram US$ 962 milhões (R$ 4,64 bilhões) do total de US$ 2,88 bilhões (R$ 13,89 bilhões) da América Latina — em que o Brasil domina em número de negócios e volume financeiro movimentado — segundo o Distrito.

Além da própria capacidade dos bancos de investir por meio de corporate venture capital — as companhias de serviços financeiros representaram 39% das que possuem um .. leia mais em InfoMoney 27/12/2023