Há alguns meses, startups unicórnios – aquelas que têm valor de mercado igual ou superior a US$ 1 bilhão – vêm sendo alvo de polêmicas por registrar demissões em massa. Daki, Ebanx e Hotmart estão entre os diversos nomes que fizeram movimentações desse tipo e reestruturação de pessoal, algo não exclusivo ao País, mas que está acontecendo em todo o mundo. Em tempos de incerteza econômica, dadas as diversas crises que a sociedade global vem encarando, a credibilidade de tais negócios está sendo colocada em xeque.

Atores significativos do avanço da inovação, os unicórnios encaram mudança de paradigma por parte de investidores. Agora, sustentabilidade de negócios e outros modelos são evidenciados, com descentralização de foco nas startups unicórnio. “Há uma tendência das startups e dos investidores que começam a olhar não para empresas com produtos e serviços isolados, mas sim para empresas que, em seu DNA, já fazem parte de um ecossistema de negócios”, afirma Roberto Kantar, professor de MBAs da Fundação Getúlio Vargas (FGV). A visão compartilhada e colaborativa vem ao encontro da criação de modelo de receita em que haja a conexão de empresas direta ou indiretamente ligadas ao negócio. Ao Meio & Mensagem, o professor compartilhou sua percepção acerca do cenário atual e a visão de investidores para o mercado no longo prazo.

Startups unicórnios do Brasil: qual é o cenário?

Meio & Mensagem – Qual é a situação em que as startups unicórnios se encontram no Brasil?

Roberto Kanter – O dinheiro de alto risco está muito escasso no mundo, com o aumento da taxa de juros e outras oscilações. Como uma empresa se torna unicórnio? Um investidor havia pago R$ 150 milhões por 10% da empresa e ele resolveu comprar ela toda pelos outros 90%. Quando fez isso, o valor de venda da empresa foi algo em torno de R$ 500 mil reais. O valor da empresa caiu? Não. Nesse mundo das startups, paga-se mais pela atração e menos pelo valor real dela. […] Um investidor compra pensando na geração de riqueza, não está interessado na operação de agora, está com um olhar no futuro. Quando a pessoa compra a empresa como um todo, ela está interessada em outras contas, o que chamamos de valor real, e não de valor futuro. O valor real é muito menor. Uma boa parte das empresas unicórnio, na prática, não vale aquele unicórnio. Uma vez entendido isso, um mundo de hoje é um mundo com uma redução de dinheiro e as empresas estão usando o burned chash muito constantemente: para conquistar clientes e mercado de uma maneira muito rápida. Com o dinheiro mais escasso, as empresas estão sendo obrigadas a olhar para o seu custo de operação. O custo fixo são as pessoas e a gestão depende do custo fixo. Quanto menor o custo fixo de um negócio, maior as chances dessa empresa vir a dar certo no futuro. Esse é o ponto crucial que vivemos hoje. Como vivemos em um momento em que as empresas estão, cada vez mais, com o dinheiro limitado, elas passam a olhar a operação. Quando fazem isso, percebem que a receita que tem hoje não é compatível com o custo e precisam adequar a receita com a operação.

M&M – Esse cenário impacta de alguma forma o avanço da inovação tecnológica no Brasil?

Kanter – Não, de forma alguma. A maior parte dos layoffs acontece no administrativo, não está acontecendo nas áreas de desenvolvimento, que são o core das startups.

M&M – O que os investidores buscam atualmente?

Kanter – Cada investidor tem a sua agenda. O movimento que está sendo visto é uma antecipação de entrada de investidores em fases em que normalmente eles não entravam. Como o capital e o dinheiro do investidor está mais restrito, ele só entra na frase da aceleração, ou pré-aceleração. Quem tem o conhecimento na empresa, faz o investimento ficar muito em risco. Então, eles estão hoje entrando em aceleração, ideação, incubação. Estão antecipando a entrada junto às empresas. Com isso, pagam menor valor, tem um share mais ou menos equivalente — às vezes até mais. Só que as empresas estão, a partir de agora, tendo que estruturar o próprio modelo de negócio do venture capital, que antes era só colocar dinheiro para conseguir as coisas em menos tempo. Agora, estão sendo obrigados a ter uma vida mais intensa, com mentores, consultorias… Particularmente, acho muito saudável… leia mais em Meio&Mensagem 27/10/2022