O mercado de Fusões e Aquisições (M&A) está mais resiliente do que os números espelham. Num mercado claramente comprador, dinamizado pelas grandes companhias com balanços robustos e elevados níveis de liquidez, e caracterizado por transações de média dimensão, a preparação é a palavra de ordem.

Muita coisa se alterou desde o início do ano: a inflação está a desacelerar, as taxas de juro podem estar próximas do limite máximo, alguns bancos faliram, o limite da dívida dos USA foi alterado, e toda a gente fala sobre o que parece ser a “the next Big Thing” na tecnologia: inteligência artificial generativa. Por diversas razões – desde a digitalização à descarbonização, passando grande aposta na criação de valor – entendemos que surgirão novas oportunidades e que estão criadas as condições certas para um mercado de M&A mais ativo nos próximos meses.

O ano de 2023 iniciou com perspetivas cautelosas. O sentimento global encontrava-se pautado pelo receio de uma recessão global em paralelo com taxas de juro crescentes, em resultado das políticas seguidas pelos bancos centrais para controlo de níveis de inflação recorde. O recém-lançado estudo Global M&A Industry Trends: 2023 Mid-Year Update, pela PwC, constata que na primeira metade do ano de 2023 foi verificada uma quebra de 8% face à segunda metade de 2022 em número de transações concluídas. Contudo, o mercado, em número de transações, encontra-se ainda acima dos níveis pré-pandemia.

Global M&A Industry Trends: 2023 Mid-Year Update, pela PwC,

A segunda metade do ano poderá registar ainda maior dinamismo, caso se verifique que os vendedores dediquem tempo e recursos na preparação atempada do processo de venda e ajustem as suas expectativas em termos de valorização, as quais estão pressionadas pelas condições de financiamento. Para grande parte dos compradores, o financiamento continua a representar um constrangimento, pois não só o acesso está mais dificultado como o custo aumentou significativamente. Este fator, crítico nas operações mais alavancadas, coloca ainda mais ênfase no driver criação de valor.

A criação de valor sempre configurou um fator determinante de decisão para a realização de uma transação, contudo, existe hoje uma necessidade mais premente de realizar uma análise aprofundada na identificação das alavancas de valor. Se no passado o foco estava no reposicionamento estratégico através da otimização de portfólio, digitalização ou alterações de modelo de negócio, atualmente, fatores como a eficiência energética, iniciativas ESG ou financiamento sustentável desempenham um papel fundamental na equação.

As condições macroeconómicas e os constrangimentos no financiamento criaram um ambiente transacional onde os processos demoram mais tempo, apresentam um desfecho mais incerto, em que subsistem dúvidas no racional da transação e adensam a necessidade de um maior escrutínio por via do due diligence.

O contexto dos private equity

Ao passo que o ambiento macroeconómico e os constrangimentos no financiamento resultantes de taxas de juro crescentes e acesso mais limitado ao crédito têm condicionado a execução de transações alavancadas, os private equity depositaram maior foco na revisão dos seus portfólios, prosseguindo, por exemplo, estratégias de crescimento inorgânico nas suas participadas. Naturalmente, as grandes operações de aquisição altamente alavancadas perderam tração, contudo, os private equity não deixaram de perseguir investimentos plataforma estratégicos para implementar de seguida estratégias de criação de valor com vista a alcançar os retornos esperados.

O crescente custo de capital está a causar maior pressão nos retornos de investimento dos private equity, obrigando os mesmos a delinear estratégias de investimento mais sofisticadas com maior ênfase nas diferentes alavancas de valor de cada transação – com maior foco nas melhorias operacionais – a par da maior importância atribuída às políticas de investimento sustentáveis, em particular iniciativas ESG.

Perspectivas para a segunda metade do ano no mercado nacional

Atendendo aos sinais que vamos assistindo no mercado, estamos otimistas que a segunda metade do ano vai ser marcada por oportunidades mais interessantes e transformacionais. Embora esteja claro que as atuais condições macroeconómicas continuarão a influenciar o mercado de M&A, um ambiente de taxas de juro que se espera mais estável facilitará o processo de valorização das transações.

O setor da tecnologia, em particular a prestação de serviços de IT, a indústria transformadora, a saúde e a energia continuarão a dominar o mercado de M&A nacional, onde o apetite dos investidores internacionais por ativos estratégicos permanece forte. Por outro lado, continua a verificar-se uma elevada disponibilidade de fundos por parte dos operadores de private equity nacionais, os quais imprimem dinamismo no mercado e contribuem para a criação de plataformas com mais escala e estruturas de gestão profissionalizadas.

Para os compradores, o acesso ao capital é crítico a par de mais extensos e detalhados processos de due diligence financeiro e não financeiro. Para os vendedores, reforçamos, a preparação é a chave para o sucesso..autor António Rodrigues Sócio da consultora PwC… leia mais em Expresso 31/08/2023