Com o foco mais voltado para startups (seja por decisão própria ou força das circunstâncias), o Web Summit que se encerrou na última quinta-feira (16) em Lisboa abriu um amplo espaço na pauta para debater como irá ficar o mercado de venture capital no próximo ano.

A palestra de Albert Wenger, da empresa de private equity e venture capital Union Square Ventures (que investiu em nomes como Stripe e Tumblr, entre outros), deu o tom às discussões, logo no segundo dia do evento. “Vai levar muito tempo para nos livrarmos da ressaca dos superinvestimentos de 2021”, disse, diante da plateia lotada do Altice Arena, em Lisboa. “Muitas valuations jamais serão recuperadas.”

Na visão do investidor, ainda estamos vivendo uma época de aportes “fictícios” em startups que deveriam ter tido seus valores de mercado rebaixados há muito tempo. “Os fundos não querem diminuir o status das empresas, porque assim podem manter a ilusão de que seus aportes terão retorno certo. Mas estão apenas adiando o inevitável e prolongando a ressaca de maneira desnecessária”, disse em sua palestra

Para onde vai o Venture Capital em 2024

Alguns investimentos, porém, serão bem-sucedidos, diz o CEO. “Especialmente aqueles que focarem em IA e nas climate techs, ou em uma combinação das duas coisas. Já se sabe que a inteligência artificial terá um papel fundamental para combater as mudanças climáticas, e quem apostar nisso estará um passo à frente dos competidores.”

Por conta da pressão da inflação e dos juros altos, é só a partir do segundo semestre de 2024 que as coisas devem realmente começar a melhorar, segundo Kyle Stanford, analista-líder de VC do PitchBook – plataforma de dados que apresentou um novo estudo em parceria com o Web Summit. A maioria dos 111 investidores ouvidos disseram que as saídas continuam difíceis, tornando mais lenta a angariação de fundos. “Quase metade dos investidores entrevistados espera que seja mais difícil levantar capital de LPs nos próximos 12 meses, o que está alinhado com o que vemos nos dados”, disse Stanford.

No relatório, 62,2% dos entrevistados indicaram que IA e machine learning têm o potencial mais disruptivo dentre as tecnologias emergentes: 75,8% relataram que fizeram pelo menos um investimento em empresas de IA/ML nos últimos 18 meses. Em números absolutos, os investimentos de capital de risco caíram de US$ 439,9 bilhões (R$ 2,1 trilhões), nos três primeiros trimestres de 2022, para US$ 247,2 bilhões (aproximadamente R$ 1,2 trilhão), no mesmo período deste ano.

No Brasil

“A crise global e as incertezas econômicas já tiveram seu pico”, disse Ingrid Barth, presidente da Associação Brasileira de Startups, em entrevista a Época NEGÓCIOS, durante o Web Summit. “Por isso, é possível imaginar que, com o passar do tempo, haverá uma recuperação gradual do mercado de venture capital. Mas será uma evolução dinâmica, que dependerá de diversos fatores.”

Na opinião da executiva, setores como tecnologia, saúde e sustentabilidade devem se destacar no cenário de venture capital em 2024. “A demanda por soluções inovadoras em áreas como saúde pública, mudanças climáticas e transformação digital deverá impulsionar o investimento em startups que estejam desenvolvendo tecnologias disruptivas nesses setores.”

A IA, diz a CEO, ainda não deverá ser o foco dos investidores no país em 2024. “No que diz respeito à corrida da IA, o Brasil ainda está em um estágio intermediário, ampliando seus esforços nesse campo”, afirma Ingrid, que lista entre as dificuldades a falta de uma infraestrutura tecnológica avançada e a escassez de talentos especializados. “Superar essas fraquezas exigirá medidas abrangentes, como incentivos fiscais para empresas que investem em tecnologias avançadas, programas de capacitação em IA e a criação de centros de excelência em pesquisa e inovação”, afirma.

Mesmo diante de todos esses desafios, o Brasil já é o campeão de startups de IA na América Latina, revelou o Distrito em outro estudo lançado durante o evento. O Brasil conta com 73,65% das empresas na área, segundo a plataforma; na sequência, estão Colômbia e México, com 6,64% cada um, Chile, com 5,60%, e Argentina, com 3,73%, revelou Eduardo Fuentes, diretor de Pesquisa do Distrito, que esteve em Lisboa para o Web Summit.

O mapeamento da Distrito não incluiu apenas empresas que utilizam IA dentro do core do negócio, mas também aquelas que oferecem serviços de inteligência artificial para que outras empresas possam aplicar dentro dos seus modelos de negócios. Para o pesquisador, a predominância brasileira é resultado de um ecossistema mais maduro de venture capital e CVC. “Isso facilita o desenvolvimento de novas tecnologias”, afirma. “Mas a concentração foi um pouco superior ao que a gente imaginava.”

No terceiro trimestre de 2023, o último computado pela plataforma, o total de investimentos no Brasil alcançou US$ 596,7 milhões, um número 16% menor se comparado com o mesmo período de 2022 (US$ 711,06 milhões). “Economicamente, temos visto uma redução no mercado da América Latina como um todo”, diz Fuentes. “Então 2023 será definitivamente pior que 2022. Mas isso pode mudar se as condições geopolíticas ajudarem”, aponta… leia mais em Época Negócios 21/11/2023