Chegou a hora das empresas darem um passo para trás para estruturar toda a jornada digital.

É o que pensa Marco Stefanini, CEO global e fundador da Stefanini, que esteve recentemente no Instituto Caldeira, badalado hub sediado em Porto Alegre, para falar sobre as tendências tecnológicas para 2023.

O conselho é pouco usual, num mercado no qual os fornecedores normalmente recomendam olhar para frente (e comprar coisas novas).

Stefanini

Para Stefanini, as empresas maduras começaram a investir de verdade em digitalização há cerca de cinco anos.

Principalmente depois do início da pandemia, em 2020, elas foram direto no “front”, no canal digital, onde se aparece e se capta clientes.

“E fizeram o certo. No improviso, funcionou no início. Mas agora é o momento de olhar para trás. Para você ter uma experiência real de omnichannel, é preciso todo um sistema por trás para realmente ter aquela experiência”, explica Stefanini.

Um dos exemplos do empresário foi o varejo, que entrou no e-commerce rapidamente, na pressão por continuar vendendo com as lojas fechadas.

O resultado foi que muitas empresas utilizam a loja como última milha, mas o sistema enxerga um estoque para a loja física e outro para a virtual.

“Quando você tem três, quatro lojas, não tem problema. Quando são mil, é outra história. Então você começa a amadurecer para consolidar toda a jornada e não apenas o front”, detalha o CEO.

Já nos bancos tradicionais, o foco foi muito em onboarding digital nos últimos anos, um movimento embalado pela concorrência com as novas fintechs e o próprio desejo de se tornar mais lucrativo

Agora, segundo avalia Stefanini, essas instituições estariam começando a ver que o seu core bancário não consegue trabalhar em tempo real.

“Ele fecha uma janela de sete horas durante a noite e ninguém consegue fazer uma transação real time. Fecha dois dias no final do ano ou no final de cada mês e não tem agilidade para ir muito mais. Então você começa a olhar para trás”, explica Stefanini.

Sobre o próprio mercado de tecnologia, do qual a Stefanini é um dos expoentes no Brasil, Stefanini reconhece que o cenário econômico atual é “desafiador”, por consequência de uma “bolha financeira” entre o final de 2020 e 2021 com impacto direto nas empresas da área.

Hoje, o número de transações de M&A diminuiu quase pela metade em relação ao ano passado, mas voltou ao patamar de antes da pandemia. Ou seja, você tem um pico enorme, depois volta ao normal. Na tecnologia, qualquer coisa nova tem um ‘boom’ e depois vem a acomodação. É o momento de amadurecer esse mercado”, destaca o empresário.

Para Stefanini, o dinheiro abundante nas empresas acabou gerando, em vários casos, um certo mix entre o que realmente estava sendo investido para escalar o negócio e um certo desperdício, uma certa ineficiência de operações que ficava mascarada.

“Às vezes, com dinheiro muito fácil, você acaba criando uma cultura não necessariamente melhor, para fazer gestão e ter resultados. Havia os excessos e, como todo excesso, você vai corrigindo ao longo do tempo sem comprometer o negócio principal. Mesmo que você esteja investindo para escalar, uma hora tem que voltar. E agora é a hora da verdade”, garante o CEO.

Stefanini diz ver esse cenário econômico como uma oportunidade positiva, pois são os momentos mais difíceis que desafiam os modelos de negócio.

“Com ventos a favor, as empresas não ficam tão abertas a mudanças. Quando elas sofrem impactos econômicos, são obrigadas. Então, para o cara que vai desafiar o status quo, é uma oportunidade. Porque, em geral, as grandes são mais acomodadas”, ressalta Stefanini.

Para ele, o cuidado que os empreendedores precisam ter neste momento é manter o foco no cliente e no produto.

“Alguns empreendedores começaram a gastar mais tempo com investidor do que com produto. Esse é um alerta que eu faço para todos, não só pra quem está começando”, conta.

Sobre a onda de demissões em massa no setor de tecnologia, Stefanini diz que as companhias estão fazendo a sua lição de casa porque, talvez no embalo de muito crescimento, acabaram não dando atenção a aspectos como esse, mas o momento mudou.

“Primeiro, não são todas, está cheio de empresa contratando. A própria Stefanini tinha 2,5 mil vagas disponíveis no final do ano. Segundo, é uma questão muito de se tornar mais eficiente. Não significa que elas vão quebrar, na maioria esmagadora”, salienta.

Na opinião do executivo, isso não significa que o mercado de tecnologia vá mudar, somente que vai amadurecer. Apesar de haver um movimento de retrocesso da globalização, a tecnologia deve continuar “de vento em popa”.

Outro ponto que Stefanini destacou em Porto Alegre foi que, quando tinham dinheiro abundante, algumas empresas criaram um mito de primeiro resolver tudo “dentro de casa”. Agora, com o foco na eficiência, provavelmente alguns vão mudar.

O modelo que o empresário defende é manter um equilíbrio, fazendo dentro de casa aquilo que é o diferencial do negócio e terceirizando o restante, trabalhando em um conceito de ecossistema.

“O canal digital é um diferencial seu. Muitas vezes, você quer que tenha um código próprio. O core bancário é um diferencial? Não. Desenvolver um core bancário demora cinco anos e dezenas de milhões de reais, ou centenas. Dois ou três bancos estão fazendo. Vale a pena? Eu não acho”, acredita Stefanini.

Segundo o executivo, escolhendo parceiros que já estão provados ou que estão se provando é possível exponencializar mais rápido e com maior performance.

“Lembrando que o diferencial do movimento da transformação digital é o modelo de negócio. A tecnologia é o grande viabilizador, é fundamental, mas não é o core. Isso não mudou, continua do mesmo jeito”, destaca.

O Grupo Stefanini fechou o ano passado com um faturamento de R$ 5 bilhões, o que representa uma alta de 25% frente aos resultados de 2021.

No Brasil, o crescimento foi um pouco abaixo da média global, na casa dos 20%, o que ainda assim representa o melhor resultado da companhia nos últimos 10 anos no país…Leia mais em baguete 09/02/2023