Em entrevista ao InfoMoney, Aswath Damodaran diz que pouco importa a próxima decisão de juros dos EUA.

Enquanto pares globais demonstram preocupação quanto ao prolongamento do ciclo de juros elevados nos Estados Unidos, o Fomc (o Copom americano) se prepara para uma nova reunião semana que vem, diante de investidores preocupados com dados de inflação mais fortes do que o esperado.

Mas, para Aswath Damodaran, professor da Universidade de Nova York e conhecido como o “papa” do valuation, pouco importa o que o Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA) vai fazer.

Os mercados vão subir ou descer e o Federal Reserve é um espectador, um seguidor – e não um líder. Penso que precisamos nos preocupar menos com o Fed e mais com os fundamentos”, afirmou em entrevista ao InfoMoney. De passagem pelo Brasil para participar do Congresso Anual do CFA Society Brazil, Damodaran respondeu a algumas perguntas. Confira abaixo:

InfoMoney – O senhor, normalmente, diz que valuation é simples. Nós escolhemos complicar as coisas. Por quê?

Damodaran – Porque somos seres humanos. As coisas que nos incomodam em valuation não são algo que você possa consertar no processo, são problemas da vida real. Vou te dar um exemplo: a incerteza não é exatamente algo que os seres humanos gostam. Então, quando enfrentamos a incerteza, seguimos um de dois caminhos: ou entramos em negação e dizemos que não há incerteza, ou a terceirizamos e pedimos a outra pessoa que tome decisões por nós.

E durante um processo de valuation, muitas vezes, enfrentamos incertezas. Então ou paramos o processo e falamos que não é possível fazer isso porque há muita incerteza, como uma pandemia, ou o país está em risco, ou a empresa avaliada é jovem demais; e escolhemos não olhar para essa incerteza. Mas, lembre-se: não olhar para a incerteza não a faz desaparecer. Ela continua lá, você que não está olhando para isso.

A outra possibilidade é, ao se deparar com muita incerteza, você diz ‘vou pedir ao Goldman Sachs que me diga quanto vale alguma coisa’, como se eles tivessem alguma visão especial sobre as incertezas que você não tem. Então, em geral, quando olhamos para problemas de valuation, eles vêm de características psicológicas com as quais nós, como seres humanos, não conseguimos lidar. E, então, isso se revela como más escolhas em termos de valuation.

InfoMoney – Este é um ano muito particular: o Fed tem mantido as taxas de juros estáveis ​​e há uma eleição por vir. De que forma isso está afetando o valuation das empresas na bolsa em geral?

Damodaran – Eu vou te surpreender: não creio que o Fed faça parte da história. Sejamos realistas, no ano passado, o Fed aumentou os juros três vezes e foi um ótimo ano para as ações. No ano anterior, o Fed aumentou os juros quatro vezes e foi um ano ruim para as ações. No começo deste ano, corria o boato de que reduziriam os juros – e eles não fizeram isso – e mesmo assim, foi um ótimo ano para o mercado….

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InfoMoney – Valuation: é uma ciência ou é uma arte?

Damodaran – É um ofício. Não é nenhum dos dois. Não é uma ciência porque, na ciência, você obtém as informações corretas. Eu nunca avaliei uma empresa, mesmo que tenha passado horas nos buscando os dados e acho que acertei. Eu sei que minha avaliação sempre estará errada.

Por quê? Porque o futuro é incerto. Portanto, a avaliação não é uma ciência, e adicionar mais regras e criar mais modelos não proporcionará um valuation mais preciso, já as incertezas permanecem.

Também não é uma arte porque arte basicamente significa que posso fazer o que quiser. Essa é a essência de uma arte. Se parecer bonito, então está tudo bem. Com valuation, você não pode fazer o que quiser, porque as empresas estão sujeitas às leis da economia.

Um ofício basicamente significa que você reconhece que existem leis da economia, que você vive em um mundo onde outras pessoas estão tentando fazer o que você está fazendo, e você tenta contar uma história sobre uma empresa que seja possível converter em números. Valuation é um ofício porque na primeira vez que você fizer isso, você não será muito bom, porque você nunca fez isso antes. Mas quanto mais fizer, melhor ficará. Mas avaliar o mesmo tipo de empresa repetidamente, é como aprender a cozinhar massa. Você cozinha mais e fica muito bom em fazer massa. Mas então se eu perguntar se você pode fazer arroz frito ou suflê, você vai dizer que nunca fez isso. Portanto, se você quiser ser bom em valuation, não só precisa avaliar muitas empresas, mas também experimentar diferentes tipos de empresas, porque cada vez que avaliar uma empresa, você aprenderá algo sobre o ofício – e ficará melhor nele… Leia mais em infomoney 27/04/2024