A transação entre Equifax e Boa Vista, concluída na semana passada, abriu espaço para uma estrutura para aquisições cross border envolvendo companhias listadas que pode se tornar cada vez mais comum. No formato, o acionista de uma empresa brasileira pode se tornar diretamente investidor da compradora listada em bolsa estrangeira – o que demandava uma série de procedimentos e custos para chegar a uma mudança de posição. Já há outra operação em curso neste mesmo modelo, envolvendo a Sinqia.

Na Boa Vista, foi a primeira vez que uma companhia americana propôs entregar as ações dela diretamente para os acionistas minoritários de uma companhia local”, diz Diogo Aragão, head de M&A do Bank of America, o banco responsável pela estruturação a pedido da Equifax.

Na transação do birô de crédito, a americana – que já era uma das acionistas e tinha direito de preferência num M&A – ofereceu três opções aos demais investidores da Boa Vista. Receber em dinheiro pela venda das ações, receber parte em caixa e parte em ações da compradora, ou permanecer como acionista da empresa privada, agora como controlada, o que também é incomum.

A estrutura societária que ganha espaço em M&A cross border

A ofertante queria a votação por maioria simples, para não colocar a decisão nas mãos de um único acionista com posição relevante numa votação de quórum qualificado – já era pública a resistência do fundo TMG, que detinha 22% da Boa Vista.

Aragão destaca que a transação foi viabilizada por uma atualização no regulamento do Novo Mercado pela B3, feita há pouco mais de cinco anos, permitindo a saída de uma empresa do segmento de governança sem a realização de OPA em casos de reorganização societária aprovada pela maioria. “Votam os não controladores e, em caso de empresa pulverizada, todo mundo vota e sem OPA”, diz, o que dá flexibilidade à estrutura proposta. A CVM também atualizou, no período, as normas para BDRs.

A Associação Comercial da São Paulo, relevante para concretização do negócio, manteve-se como acionista da companhia fechada, opção que também atraiu alguns investidores pessoa física. Voto vencido, a TMG vendeu todas as suas ações, assim como a maioria dos investidores. A opção de ficar com BDR da Equifax, ao fim, não teve demanda – o papel teve desvalorização na bolsa americana e a opção se mostrou pouco atrativo pelo preço em tela.

Migrar de base acionária era feito de forma um pouco mais custosa. Exemplo conhecido vem do mercado de saúde. Quando a United Health comprou a Amil, em 2012, Edson Bueno se tornou acionista da companhia americana. Mas, para executar isso, o procedimento foi receber em caixa por ações da Amil, pagar o imposto de ganho de capital, e comprar a ação americana. “Hoje, isso poderia ser feito com a entrega de BDR, sem um investidor ter que abrir conta em corretora americana, por exemplo”, diz Aragão.

E, naquele caso, a “migração” envolveu somente o controlador da adquirida. “Hoje, qualquer estrangeiro que queira comprar uma empresa no Brasil pode avaliar essa opção se não quiser usar só caixa.”

Num transação assessorada pelo BTG Pactual e pela Seneca Evercore, a brasileira desenvolvedora de softwares Sinqia será incorporada pela Evertec Inc, uma companhia com sede em Porto Rico e listada na Nyse. A estrutura, que envolve uma fase de preferenciais resgatáveis, é finalizada com a entrega de BDRs da Evertec. O conselho da Sinqia aprovou a transação no início desta semana.

No processo entre Equifax e Boa Vista, foram algumas consultas à B3 e CVM, um longo processo de diligência, mudança de parte da base de acionistas ao longo do processo e discussão de formatos. “Não é nosso maior M&A do ano, mas de longe o mais complexo”, diz Aragão. Citi e UBS-BB também trabalharam na transação, assessorando a companhia e o board… leia mais em Pipeline 17/08/2023