Em tempos de automação total, interconexão e inteligência artificial é preciso considerar oportunidades e cuidados.

O universo corporativo global está bastante agitado, e “animado”, prevendo-se uma grande temporada de fusões e aquisições, e também de IPOs, ao longo deste ano, a despeito de algumas crises setorizadas, e das guerras em curso – o que nos remete a uma fase de muitas oportunidades, que, por sua vez, demandam cuidados.

Se nos últimos anos não vimos tantas operações corporativas/reorganizações e de aberturas de capital no Brasil (por diversas razões, como questões políticas e geopolíticas, e em decorrência de um período com inflação e taxa de juros em alta, com pressão sobre o câmbio), neste ano temos um cenário bastante distinto.

Com o aparente controle da inflação (ainda que alguns preços estejam altos, como nos serviços) e a tendência de redução das taxas de juros, é de se esperar que grande parte dos investidores retome seus movimentos nos mercados de fusões e aquisições, e de capitais.

Observa-se, também, que via de regra os ativos brasileiros estão baratos, o que tende a chamar muita atenção de investimentos estrangeiros, especialmente quando comprometidos com a infraestrutura e com o longo prazo.

Nesse cenário, se o mercado está capitalizado, e com tendências a investimentos, notadamente nas atividades produtivas, é natural que vejamos uma busca por boas oportunidades e projetos – o que pode nos levar a uma fase bastante otimista nesse aspecto, e a uma forte sinalização de que as melhores oportunidades sejam rapidamente aproveitadas.

A fase de otimismo e de aproveitamento de oportunidades tende a ser cercada, também, de diversos riscos novos e adicionais, para os quais precisamos estar atentos, para que consigamos identificá-los, precificá-los e geri-los, e tomar os devidos cuidados.

Mundo das operações digitais

O aspecto denominado “mundo das operações digitais” é o que nos norteia neste breve artigo, propondo que os mercados considerem as oportunidades, mas sempre com cuidado.

O planeta está cada vez mais automatizado e interconectado, o que em muitos segmentos e mercados indica que seja possível ganhar ainda mais escala, e reduzir prazos e custos, inclusive nos projetos de fusões e de aquisições, bem como nas aberturas de capital.

Essa realidade mais “digital” que tem mudado hábitos e costumes, afetando a vida de todos nós, tem permitido que muitos negócios passem por enormes transformações, tirando alguns segmentos do cenário global (ou reduzindo bastante a sua participação) e trazendo tantos outros novos.

Vivemos tempos de transformações muito profundas em nossas vidas, e os empreendedores estão atentos, assim como os investidores, que sempre buscam oportunidades e reduções de custos.

Muitos negócios aparentemente promissores e “imperdíveis” estão surgindo em toda a parte.

Chamamos, assim, a atenção para os devidos cuidados com os projetos de fusões e aquisições que denominamos “contemporâneos”, pois a atual maneira de realizá-los, e de conduzi-los tem mudado bastante, com aspectos positivos de um lado e preocupantes de outro.

De sistemas de avaliação a automação de propostas, e de “road showseletrônicos” a rápidas reuniões on-line, e ainda assinaturas digitais, grande parte dos antigos gargalos – especialmente de tempos/prazos para as operações, e custos com deslocamentos de pessoas – estão sendo reavaliados; e em muitos casos grandes economias são conseguidas.

Na mesma linha, temos observado que já há um tempo, e com bastante rapidez, se consegue construir contratos e documentos, e ainda realizar due diligences através de sistemas/softwares, inclusive com o uso de robôs e de inteligência artificial, bem além dos já tradicionais data rooms digitais.

Os projetos são cada vez mais rápidos, e automatizados, e como tudo na vida essa questão tem ao menos “dois lados”.

Essa grande otimização de recursos, com grande utilização de tecnologia, de fato é positiva em alguns aspectos, e reduz uma série de custos, mas tem chamado a atenção o fato de que nem todas as organizações estejam se dando conta de que com toda essa automação alguns riscos novos têm surgido, pois a aparente rapidez, em alguns casos, tem levado à pressa.

Em muitos casos, os investidores já nem chegam a visitar as organizações-alvo, de forma que nem mesmo as conhecem em termos físicos/presenciais. E, por vezes, já nem enviam equipes para verificação in loco de aspectos que são importantes para due diligence (e que não se consegue identificar apenas eletrônica ou documentalmente).

Mesmo os advogados envolvidos nas operações, nem sempre conseguem visitar as partes envolvidas e as operações em “mundo real”.

Até mesmo pontos críticos nas áreas de compliance, e ainda questões ambientais, e de riscos sociais, em diversos casos têm sido direcionados a robôs e à inteligência artificial.

Por isso, é fundamental avaliar as novidades com muito cuidado e atenção, de forma a identificar o que de fato pode ser terceirizado à tecnologia com efetiva segurança.

Como toda novidade que gera bastante empolgação inicial, em breve alcancemos o importante e necessário equilíbrio, entre o que pode ser delegado às máquinas e à tecnologia, e o que ainda demanda cuidados especiais e atenção humana.

É necessário, ainda, chamar a atenção para o fato de que os sistemas de due diligence, bem como de elaboração de documentos, ainda que com a ajuda da festejada inteligência artificial são criados com base em padrões, e a partir de premissas, que por melhores que sejam, não conseguem equacionar eficazmente todas as questões e as situações.

Especialmente pontos e temas críticos, e sensíveis, assim como estruturas e cláusulas contratuais, precisam ser avaliados com cuidado, por profissionais efetivamente treinados e experientes, que consigam identificar pontos de atenção que as máquinas não conseguem.

E, na mesma linha, tomadas de decisão em operações complexas precisam ser tomadas por pessoas, ainda que com o apoio da tecnologia.

Se por muito tempo dependemos de força humana para todas as etapas das operações, que em função disso tinham um ritmo e uma velocidade bem diferente do que atualmente vivenciamos, quando os prazos e os custos (inclusive de deslocamento) eram considerados gargalos, é recomendável que a euforia pela rapidez, e pelos sistemas “baratos” não sejam motivo de atropelos – e de falta de atenção com os devidos cuidados.

A possível falta de identificação de riscos, e de sua necessária gestão, pode custar muitíssimo, tanto em perdas de negócios, quanto de prejuízos, multas, acidentes, escândalos e até graves crises de imagem.

A temporada de negócios deve ser “quente”, com muitas operações, das mais simples às mais complexas e sensíveis, e todos temos que nos adaptar a identificar os efetivos ganhos que a tecnologia apresenta, sem que nos esqueçamos do valor e da importância da experiência humana.

Busquemos, como sempre, o equilíbrio. Autor Leonardo Barém Leite é sócio do escritório Almeida Advogados, especialista em Direito Societário, Fusões e Aquisições; Presidente da Comissão de Direito Societário, Governança Corporativa e ESG da OAB-SP/Pinheiros.

Com informações  da Assessoria Exclusiva 13/03/2024